Embate - Parte 2

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   Um novo tilintar de espadas marcou o início do embate entre os dois guardas. Assim como os dois irmãos, Fenrir fez uma breve disputa de força com Perséphone, forçando sua espada negra contra a lâmina que ela empunhava.
  De longe, ambos pareciam estar no mesmo nível de habilidade. As duas espadas, forjadas para uso com as duas mãos, se assemelhavam bastante uma da outra, com exceção da lâmina escura que Fenrir empunhava.
  Os olhos de Fenrir percorreram todo o corpo da guarda naqueles segundos, buscando um ponto fraco em sua postura, mas, curiosamente, ele não encontrou nenhum assim de princípio. Perséphone também se adiantou e, assim como seu oponente, cravou seu olhar no homem à sua frente, e esperou, pacientemente, por uma brecha.
  _ Á primeira vista, receio ter me enganado sobre você! – A voz de Fenrir saiu com uma leve arrogância, enquanto se afastava alguns passos, ainda analisando a garota. – Você é mais forte do que eu esperava.
  _ Agradeço a sua sabedoria. – Perséphone preferiu não falar muito, mantendo sua concentração no que estava por vir.
  _ Sinceramente, eu preferia não fazer isso, então, nesse momento, estou te dando uma chance para desistir!
  _ Agradeço novamente, mas, eu tenho uma missão e um objetivo.
  _ Deixe-me mudar minhas palavras. – Fenrir ergueu sua espada, mantendo-a à frente de seu corpo, um pouco inclinada na direção da garota – Se você quiser continuar essa luta, recomendo que use a sua benção.
  Perséphone havia se incomodado com aquela última frase. Não era como se confiasse profundamente em sua própria força, ou subestimasse o guarda à sua frente, mas, ela não usaria uma benção, independente da situação. Como uma maldição que cai sobre os menos afortunados, Perséphone nunca conseguiu uma benção, sendo obrigada a usar sua força natural em todas as suas ações. Ela não disse uma palavra para o guarda, e assumiu uma guarda similar a de Fenrir, mas, com a sua espada um pouco mais abaixada.
  _ Tem certeza disso, Perséphone?
  _ Eu pareço hesitante para você?
  _ Que os deuses lhe abençoem!
  Fenrir avançou em direção a garota, e ergueu a espada acima de sua cabeça. Perséphone não se moveu um centímetro, e, apenas esperou o ataque chegar.
  Estando corpo a corpo com a garota, Fenrir desceu a lâmina usando o movimento de seu corpo para acelerá-la, mas, esta encontrou a espada de Perséphone no meio do caminho, impedindo que avançasse mais em sua direção.
  Fenrir notou uma coisa estranha. Perséphone recuou um pouco a lâmina no instante do impacto, mas, o seu corpo permaneceu completamente imóvel, tendo apenas o movimento dos braços e olhos. Ele recuou sua espada, aproveitando da velocidade de suas mãos para abaixá-la quase tocando ao chão, e direcionou outro ataque contra a garota, vindo de baixo para cima. Mas, novamente, sua lâmina fora detida no meio do trajeto.
  Um pensamento sondou a mente de Fenrir, “Quando ela se moveu?”. Do ponto de vista dele, ela estava com espada erguida até o momento de seu ataque e, em um piscar de olhos, aquela lâmina prateada estava em seu caminho.
  _ Não é meu costume, mas, essa luta não vai ter graça enquanto você não lutar a sério. – Desta vez, foi a garota quem se afastou, ainda mantendo uma postura defensiva – Eu não possuo nenhuma benção, então meus movimentos são completamente normais.
  _ Você chama essa velocidade de normal? Nem mesmo as Luas de Júpiter se movem tão rápido que eu não possa ver.
  _ Imaginei que sua mente seria um pouco menor do que deveria. Eu realmente não possuo nenhuma habilidade divina, ou algo do tipo, então posso apenas te dizer que eu sou forte, rápida e esperta.
  _ E BONITA! – Dion estava à alguns metros da guarda, mas, se mantinha atento a luta entre os dois.
  _ ISSO NÃO É HORA PARA ME IRRITAR, DION!
  _ Vejo que seu amigo parece confiar em você!
  _ Infelizmente, eu também confio um pouco nele.
  _ VOCÊ CONFIA EM MIM, PERSY?
  _ CALA A BOCA, DION!
  _ Você confia nele ou não?
  _ Eu ouvi uns boatos de que você não se dá bem com a irmã dele, é verdade?
  _ Esse é um assunto pessoal!
  _ Por um segundo, pensei que você queria conversar sobre as nossas vidas!
  _ Porque você não para de falar, e vem me atacar agora?
  _ Espero que não se arrependa de suas escolhas.
  Instigada pela provocação do guarda, Perséphone assumiu sua postura inicial, e avançou de encontro com Fenrir. Seus movimentos não pareciam conter nenhuma força sobrehumana, e isso fez com que o guarda a subestimasse, demorando um pouco para erguer a sua guarda. Talvez ele tenha se arrependido instantaneamente, ou apenas percebeu o perigo eminente, e se inclinou um pouco para trás.
  Perséphone não se aproximou com uma velocidade incrível, mas, semelhante aos seus bloqueios, algo curioso aconteceu quando ela já estava perto o suficiente. Enquanto corria, ela levantou lateralmente a sua espada, levando-a até as suas costas. Toda aquela preparação ocorrera em um tempo normal para qualquer guarda, mas, como um piscar de olhos, seus braços mudaram de posição, erguendo sua espada ao lado do rosto de Fenrir.
  _ Bela esquiva, imploro para que mantenha o nível!
  Antes que houvesse um tempo para o raciocínio do guarda, a garota direcionou outro ataque em sua direção. Todo aquele preparo básico se repetiu, e, mais uma vez, a postura de Perséphone mudou de forma repentina.
  Da visão de Fenrir, ela ergueu sua espada como se fosse usar um ataque descendente, mas, seus instintos o mandaram fazer algo antes que fosse tarde. Felizmente, seus instintos estavam realmente certos. Com muita agilidade, ele ergueu sua espada, e a posicionou deitada para receber o golpe vindo de cima.
  Quando estava próxima de seu rosto, antes mesmo de alcançar seu ápice, a lâmina de Perséphone desapareceu mais uma vez, e Fenrir pode ouvir o tinir de ambas as espadas se chocando, e sentiu também o baque do ataque, que veio mais poderoso que o esperado. Mesmo que houvesse se adiantado, Fenrir não estava realmente preparado para o ataque, e a sua espada não conseguiu conter o avanço da lâmina, que cravou em seu ombro, mas sem atravessá-lo completamente.
  _ Que bom que você conseguiu se defender, não seria bom se você perdesse um braço, não é mesmo? – Perséphone não parecia querer provocar o guarda, mas, a suavidade de sua voz o irritou.
  O ombro esquerdo de Fenrir jorrou bastante sangue, o que piorou quando a espada foi retirada, deixando a sua pele e músculos com um rasgo enorme.
  _ Merda! Admito que você é mais forte do que eu esperava!
  _ Obrigado! Por enquanto, não posso dizer o mesmo de você!
  _ Cansei de suas provocações, até mesmo a Europa é menos chata que você!
  Fenrir estava ajoelhado, enquanto seu próprio sangue transformava o negro de seu uniforme, em um vermelho rubro, bastante escurecido. O tecido molhado grudou no corpo dele, diminuindo um pouco a mobilidade do braço, que já estava debilitado por conta do golpe sofrido.
  _ Droga! Faz tanto tempo que um guarda não me fere, que acabei me superestimando! – Com um pouco de dificuldade e alguns gemidos de dor, Fenrir se levantou, enquanto buscava por alguma coisa dentro do seu uniforme – Obrigado, Perséphone!
  De dentro de um bolso escondido dentro de seu uniforme, Fenrir retirou um pequeno frasco com um líquido avermelhado dentro que balançava com o movimento de sua mão. Ele o abriu retirando um tampinha de rosca, e derramou o líquido por sobre sua lâmina novamente. Sua espada começou a ganhar uma nova cor novamente, passando do negro para um vermelho sangue, que possuía o mesmo tom do líquido que escorria de seu ombro.
  _ Incrível! Eu queria muito ver essa benção de perto! – Os olhos da garota brilharam por um segundo, fascinados com a mudança que acontecia bem na sua frente.
  _ Benção de Sangue: Blutklinger! – O efeito da benção veio quase que instantaneamente, já que o sangue em seu ombro parou de jorrar. – Me desculpa se eu for um pouco violento agora!
  Fenrir ergueu sua espada novamente, colocando-se em posição ofensiva, e avançou em direção da garota. Sua velocidade claramente havia sido aumentada, já que ele chegou ao alcance dela rapidamente. O que aconteceu quando ele desferiu o seu ataque, surpreendeu até mesmo Dion, que já sabia das capacidades da parceira.
  Fenrir a atacou com uma estocada, mirando a ponta da lâmina na barriga da guarda. Ela, por sua vez, repetiu seus movimentos anteriores, se movendo para defender-se no último segundo, e bloqueando completamente o golpe. Ou pelo menos, era o que esperava.
  Ela realmente conseguiu interceptar a estocada, mas, em contra partida, a sua força não foi o suficiente para a parar, apenas conseguindo desviar a lâmina alguns centímetros para o lado. Talvez algum deus tivesse a ajudado naquele momento, já que os poucos centímetros que a espada se moveu para o lado, fora o suficiente para evitar uma morte agonizante.
  A ponta da lâmina de Fenrir perfurou o lado esquerdo de seu abdômen, felizmente, sem acertar um órgão, mas, causando um ferimento enorme, igual ao que possuía em seu ombro.
  _ Bom, agora estamos quites!
  _ Em outra ocasião, eu adoraria te perguntar mais sobre essa benção. – Após o golpe, Fenrir parou de costas atrás de Perséphone, que teve de se apoiar na própria espada. – Mas, nesse momento, eu quero muito arrancar a sua cabeça.
  _ Apenas tente.
  Se virando rapidamente, ela ergueu a espada com uma das mãos, e tentou acertar o pescoço do guarda enquanto girava seu próprio corpo. Fenrir apenas se abaixou, e devolveu um chute com o bico de seu sapato, acertando em cheio o ferimento que fizera na garota.
  Perséphone deu alguns passos para trás tossindo um pouco, e, ao colocar sua mão sob o ferimento, sentiu o seu próprio sangue molhando sua mão, e encharcando a cintura de seu uniforme.
  _ Desgraçado!
  _ Não vai me dizer que esse chute doeu? Tenho certeza de que peguei leve!
  Perséphone não respondeu a provocação, e ignorando a dor em seu corpo, avançou mais uma vez para cima do homem. Seus olhos brilhavam com uma raiva assustadora, e seus punhos seguravam o cabo de sua espada com bastante força.
  Fenrir mal olhava para o rosto dela, algo em sua espada avermelhada lhe chamava a atenção.
  _ Só mais alguns segundos... – ele sussurrou para si mesmo.
  _ Você vai ficar aí parado?!
  Perséphone, cega pela raiva que brotava em si, imitou o golpe do guarda, tentando lhe acertar uma estocada, mas, usando de seu ataque “especial”. Ela não estava mais rápida, mas seus movimentos eram brutos, quase como se ela não estivesse se controlando de verdade.
  Ela se aproximou dele o suficiente, e enquanto seus braços ainda seguravam a espada um pouco atrás de seu corpo, ela parou, e então, mais rápido que um piscar de olhos, a sua espada desapareceu novamente, aparecendo no local exato onde o guarda deveria estar.
  _ Sabia que esse ataque é muito útil, mas, infelizmente, também é bastante previsível, principalmente, quando não se possui concentração suficiente.
  Fenrir ainda estava levemente abaixado, ainda encarando sua lâmina avermelhada, mas, alguns centímetros ao lado de onde estava. Ele se moveu de forma tão sutil, que Perséphone não o percebeu enquanto focava em atacá-lo.
  _ Mas, que droga você fez?!
  _ Você não disse que queria ver a minha benção? Eu estou apenas me mostrando um pouquinho.
  Enquanto se erguia completamente, Fenrir direcionou um soco no rosto da guarda, que ergueu sua lâmina para se defender. Ela o defendeu completamente, graças a sua velocidade explosiva, mas, deu alguns passos para trás com a força do golpe. Fenrir havia retirado seus olhos da lâmina para acertar o golpe, mas, ao tornar a observá-la, um sorriso surgiu em seu rosto.
  _ Finalmente! Agora eu posso acabar com isso mais rápido!
  Fenrir não disse mais nada, e nem sequer deu tempo para a guarda reagir. Com a espada ainda um pouco abaixada, ele deu três passos rápidos, se aproximando de Perséphone, e tentou cortar seu rosto com um golpe de uma mão, vindo de baixo.
  A guarda estava o encarando com atenção, e a surpresa em seus olhos foi mais que evidente naquele instante. O movimento do braço de Fenrir pareceu desaparecer junto da espada avermelhada e, em um piscar de olhos, a lâmina surgiu a frente de seu olho, em um movimento assustadoramente rápido.
  Perséphone não raciocinou direito sobre o que aconteceu, já que sua primeira reação foi soltar sua espada e levar ambas as mãos ao seu rosto. Mais precisamente ao lado direito dele, aonde sua bochecha fora cortada por Fenrir.
  _ O que você fez? – o rosto dela sangrava bastante, e suas mãos estavam pegajosas por conta do líquido rubro.
  _ Digamos que é um bônus de minha benção.
  _ Bônus? – Sua respiração também estava um pouco pesada, já que sua mente só processava com perfeição, a dor e a raiva que sentia.
  _ Sim, mas, infelizmente, eu não irei lhe contar sobre. A partir de agora, você não vai fazer mais nada mesmo.
  Fenrir segurou sua espada com ambas as mãos, e, ignorando a dor em seu ombro, retomou a sua posição inicial, com a lâmina levemente inclinada para Perséphone. Ele tinha a intenção de encerrar o combate com o próximo ataque, e o fato dela estar desarmada, só aumentava as suas chances. Convicto, ele avançou mais uma vez na direção dela, e preparou mais uma estocada sem se dar o trabalho de disfarçar o seu olhar fixo no coração dela.
  Ela obviamente percebeu a direção daquele ataque, mas, ainda atordoada pela dor em seu rosto e pela raiva que sentia, não foi capaz de desviar e nem sequer reagir. Fenrir estava livre para acertá-la. Perséphone reconheceu o que estava para acontecer e apenas fechou seus olhos esperando a dor que logo chegaria.
  A espada negra desapareceu no meio do trajeto, e, Fenrir avançou mais rápido em sua direção, e, no mesmo instante, um grito de dor e raiva fez com que até os asters olhassem para a luta.
  _ FENRRRIRRRR!
  _ Diaz??? – O olhar do guarda ficou confuso, e ele parecia tentar entender a situação.
  Ao invés de atravessar o peito de Perséphone, a lâmina avermelhada reapareceu perfurando a mão direita de Diaz, que, ao mesmo tempo, também segurava a espada.
  _ O que você está fazendo, Enkli? – Perséphone também ficou confusa ao abrir os olhos e ver aquela cena.
  _ Eu também não sei, mas, eu não posso permitir que nenhum de vocês morra.
  _ Por que você me impediu, Diaz? Eu poderia ter lhe matado, seu idiota?
  _ Ao invés de me xingar, não era melhor você puxar essa espada maldita? Isso dói!
  Fenrir fez como ele sugerira e retirou a espada da mão dele, que, após ele recitar uma frase quase inaudível, retornou a sua cor negra.
  _ Por que você fez isso? – A voz de Perséphone soou fraca, claramente abalada por causa de sua quase morte.
  _ Bem... Eu não queria que ninguém morresse por minha culpa!
  _ Mas, você poderia ter morrido!
  _ Uma voz me disse que eu não iria morrer aqui, então eu apenas corri.
  Ao ouvir aquela frase, Fenrir olhou a mão dele com mais atenção, e percebeu que envolta dela existia uma fina camada de névoa, quase imperceptível aos olhos.
  _ Diaz, que tal você se afastar agora? – a voz de Fenrir soou séria, e um pouco ameaçadora.
  _ Vocês vão continuar tentando se matar?
  _ Talvez.
  _ Então eu vou continuar aqui!
  _ Diaz, por favor...
  _ Fenrir, eu que te peço, pare agora!
  Os dois se encararam por um segundo, e pareceu que eles começariam uma nova luta, mas, felizmente, q voz de Vênus quebrou aquele clima.
  _ É um prazer te ver novamente, Diaz! Como você está?
  _ Bem, mas, não graças a você.
  _ Eu te peço perdão, mas, eu precisa te desmaiar para lhe entregar a ela. – Ele fez um sinal em direção a Júpiter, que apenas sorriu para Diaz.
  _ Não tinha um jeito melhor além de me golpear na cabeça?
  _ A gente possui uma droga muito boa para isso, mas, em alguns casos, os prisioneiros perdem completamente a memória.
  _ Bem... Acho que o golpe foi mais seguro.
  _ Com todos certeza.
  _ Mas, indo direto ao ponto. Já que vocês se levantaram, essa luta idiota acabou?
  _ Sim. A gente passou esse tempinho conversando, e, decidimos fazer uma trégua.
  _ Você poderia ter avisado isso antes! – Perséphone já estava andando  direção a Dion, ignorando completamente os dois asters.
  _ A gente estava esperando Diaz agir.
  _ E o que vocês decidiram? – Diaz parecia ansioso.
  _ Como todos aqui sabem, eu desejo te levar a julgamento...
  _ E eu quero evitar o julgamento... – Júpiter sorria enquanto falava.
  _ E o que vocês decidiram? – Ele repetiu a pergunta.
  Ambos os asters se entreolharam, e foi Júpiter quem respondeu.
  _ Depois de tudo o que aconteceu, infelizmente, a sua morte é a melhor opção.

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