Capítulo 6

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4 anos antes

Nem uma semana passara e eu estava de novo enfiado no hospital. Começava a detestar cada parede daquele sítio. Tornava-se sufocante e, por vezes, dava por mim sem ar.

As enfermeiras cumprimentavam-me, ainda que eu não fizesse parte dos doentes residentes. Parte de mim queria fugir daquele sítio, ignorar os exames que tinha para fazer e deixar-me morrer num canto qualquer.

Acabara de sair de uma consulta com o meu médico, o Dr. Mason Johnson, quando o Evan surgiu do corredor perpendicular àquele onde eu estava. Ele pareceu surpreso por me ver e cumprimentou-me. A minha mãe avisou que estaria na recepção a pagar os tratamentos e deixou-nos sozinhos.

‒ Então, mais exames? - perguntou, coçando a nuca.

‒ Pois, parece que sim. E tu, o que fazes por estes lados? Esta é a ala de cardiologia.

O Evan continuou a coçar a nuca, como se houvesse lá algo a importuná-lo seriamente. Por fim, baixou o braço e suspirou.

‒ Não tenho qualquer desculpa. Vim ver-te!

Arregalei os olhos e os suores começaram a aparecer-me nas têmporas. Limpei-os de imediato.

‒ Tu o quê?

‒ Pois, é verdade! A chata da Macey disse que estarias aqui, por isso...

‒ Espera - interrompi. - A Macey sabia que eu ia estar aqui?

‒ Ela é uma cabra cusca! Não podes recriminá-la.

‒ Não, claro. Vou deixar que ela me continue a tratar mal.

‒ Ela vai morrer e vai!

Voltei a arregalar os olhos. Eu sabia que o Evan era um rapaz honesto, talvez até mais direto. Já dera para perceber nas sessões do grupo de apoio. No entanto, não tinha noção que podia chegar a este ponto.

‒ E nós? - dei por mim a perguntar, e esbofeteei-me mentalmente.

‒ Hum. - Aproximou-se. - Há um nós aqui?

‒ Um nós que também vai morrer!

‒ Não sejamos pessimistas, Will! Isso é o que os médicos nos dizem - afirmou e sorriu abertamente.

A minha boca abriu-se num sorriso não tão grande, mas igualmente sincero, e eu recriminei-me quase logo de seguida. Não devia estar a criar laços com nenhum dos outros jovens. Isto só poderia acabar mal, para qualquer um de nós.

‒ Desculpa, Evan, eu... tenho que ir.

‒ Eu compreendo. - Levantou a cabeça e cruzou os olhos com os meus. O azul esmorecido cumprimentou-me e as minhas pernas sentiram-lhe os efeitos. - Mas vens amanhã ao grupo de apoio?

‒ Nem poderia ser de outra maneira. Os meus pais arrastar-me-iam de casa.

Ele riu e deu um passo em frente. Pensei em recuar, mas não queria. Não realmente. Estar perto do Evan era tudo o que eu desejava. Já há algum tempo, na verdade. Não imenso, porque para nós o tempo não se media da mesma forma. Uma semana era toda uma vida, porque quando os dias são contados, os minutos tornam-se valiosos.

Para mim, falar com o Evan parecia apenas um sonho há dois meses, quando entrara no grupo. Estava a três semanas de fazer 14 anos e não sabia se viveria até lá. Podia viver até aos 50. Mas também podia morrer em 5 minutos.

Encarei o rapaz loiro à minha frente. Fixei-lhe nos lábios, mas obriguei-me a voltar aos seus olhos. Descortinei a humidade que lhes fugia, pronta para derramar as suas dores. Contudo, não perguntei o que se passava, não quis que ele falasse de coisas tristes, por isso limitei-me a sorrir-lhe e despedi-me, caminhando ao encontro da minha mãe na entrada do hospital.

Mais uma vez, eu era o miúdo privilegiado sem certezas de uma morte prematura, que tinha demasiada sorte em poder voltar a casa.


O que é que irá sair daqui?

Helena

Coração que não sabe ser CoraçãoWhere stories live. Discover now