4 anos antes
Nem uma semana passara e eu estava de novo enfiado no hospital. Começava a detestar cada parede daquele sítio. Tornava-se sufocante e, por vezes, dava por mim sem ar.
As enfermeiras cumprimentavam-me, ainda que eu não fizesse parte dos doentes residentes. Parte de mim queria fugir daquele sítio, ignorar os exames que tinha para fazer e deixar-me morrer num canto qualquer.
Acabara de sair de uma consulta com o meu médico, o Dr. Mason Johnson, quando o Evan surgiu do corredor perpendicular àquele onde eu estava. Ele pareceu surpreso por me ver e cumprimentou-me. A minha mãe avisou que estaria na recepção a pagar os tratamentos e deixou-nos sozinhos.
‒ Então, mais exames? - perguntou, coçando a nuca.
‒ Pois, parece que sim. E tu, o que fazes por estes lados? Esta é a ala de cardiologia.
O Evan continuou a coçar a nuca, como se houvesse lá algo a importuná-lo seriamente. Por fim, baixou o braço e suspirou.
‒ Não tenho qualquer desculpa. Vim ver-te!
Arregalei os olhos e os suores começaram a aparecer-me nas têmporas. Limpei-os de imediato.
‒ Tu o quê?
‒ Pois, é verdade! A chata da Macey disse que estarias aqui, por isso...
‒ Espera - interrompi. - A Macey sabia que eu ia estar aqui?
‒ Ela é uma cabra cusca! Não podes recriminá-la.
‒ Não, claro. Vou deixar que ela me continue a tratar mal.
‒ Ela vai morrer e vai!
Voltei a arregalar os olhos. Eu sabia que o Evan era um rapaz honesto, talvez até mais direto. Já dera para perceber nas sessões do grupo de apoio. No entanto, não tinha noção que podia chegar a este ponto.
‒ E nós? - dei por mim a perguntar, e esbofeteei-me mentalmente.
‒ Hum. - Aproximou-se. - Há um nós aqui?
‒ Um nós que também vai morrer!
‒ Não sejamos pessimistas, Will! Isso é o que os médicos nos dizem - afirmou e sorriu abertamente.
A minha boca abriu-se num sorriso não tão grande, mas igualmente sincero, e eu recriminei-me quase logo de seguida. Não devia estar a criar laços com nenhum dos outros jovens. Isto só poderia acabar mal, para qualquer um de nós.
‒ Desculpa, Evan, eu... tenho que ir.
‒ Eu compreendo. - Levantou a cabeça e cruzou os olhos com os meus. O azul esmorecido cumprimentou-me e as minhas pernas sentiram-lhe os efeitos. - Mas vens amanhã ao grupo de apoio?
‒ Nem poderia ser de outra maneira. Os meus pais arrastar-me-iam de casa.
Ele riu e deu um passo em frente. Pensei em recuar, mas não queria. Não realmente. Estar perto do Evan era tudo o que eu desejava. Já há algum tempo, na verdade. Não imenso, porque para nós o tempo não se media da mesma forma. Uma semana era toda uma vida, porque quando os dias são contados, os minutos tornam-se valiosos.
Para mim, falar com o Evan parecia apenas um sonho há dois meses, quando entrara no grupo. Estava a três semanas de fazer 14 anos e não sabia se viveria até lá. Podia viver até aos 50. Mas também podia morrer em 5 minutos.
Encarei o rapaz loiro à minha frente. Fixei-lhe nos lábios, mas obriguei-me a voltar aos seus olhos. Descortinei a humidade que lhes fugia, pronta para derramar as suas dores. Contudo, não perguntei o que se passava, não quis que ele falasse de coisas tristes, por isso limitei-me a sorrir-lhe e despedi-me, caminhando ao encontro da minha mãe na entrada do hospital.
Mais uma vez, eu era o miúdo privilegiado sem certezas de uma morte prematura, que tinha demasiada sorte em poder voltar a casa.
O que é que irá sair daqui?
Helena
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Coração que não sabe ser Coração
Short StoryWill recebeu um novo coração. Não há sentimento melhor que este de saber que há uma chance de sobreviver. Contudo, quando Henry surge na sua vida, as memórias do passado esquecido vêm à tona. E se o novo coração de Will não aguentar?