Piper e o súbito ódio do amor

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Piper

Ela nunca foi do tipo que sentia inveja de casais.

Piper não falava isso na intenção de pintar-se como uma pessoa superior, era simplesmente um fato, não tinha aquela raiva enterrada dentro do peito. Não tinha vontade de segurar nas mãos grudentas de meninos ou ser segurada enquanto dava beijos frios e desgostosos. Sendo totalmente sincera, ela já namorou alguém porque achava ser a coisa certa a fazer - alerta do óbvio- não foi.

A garota encontrava tamanho deleite em juntar as pessoas que nunca pensou no que isso poderia gerar, Até que viu aqueles dois entrarem na sala, quase imaculados demais para pisar naquele chão construído de embalagens vazias e refrigerante derramado. Claro, não era a primeira vez que os via juntos mas era singular até então o sentimento causado.

Annabeth estava rindo - claro que estava, Percy era hilário. Eles entravam do corredor com a única luz amarela no local se dissipando enquanto a porta era fechada. A menina se vestia lindamente na cor preferida dele e Piper sabia que era por isso que aquele vestido tinha sido escolhido, dado que nada que a loira fazia era por acaso. Eles caminharam até ela, brilhantes e educados para cumprimentá-la.

Leo apertou a mão dos dois com força desproporcional a sua estatura enquanto Piper esperava para abraçar sua melhor amiga, percebendo o odor de uma colônia masculina no pescoço dela que definitivamente não se encontrava originalmente na penteadeira. Seu coração deu duas piruetas.

O casal saiu para cumprimentar o primo de Annabeth - um garoto loiro parecido com Kurt Cobain - que também estava acompanhado. De repente, parecia que só ela estava sozinha na verdade, que o mundo inteiro tinha alguém para enterrar seu rosto em. Menos Leo, é claro, mas ele não contava.

  Não fazia muito tempo que estava sentada naquele sofá, mas de repente tornou-se desconfortável, a música muito alta e os olhares daqueles ao seu redor penetrantes demais. Era como se todos pudessem ver a inveja por trás de sua pele e soubessem o motivo dela sentir-se assim, mesmo se nem a própria estava certa da razão. Apertou o copo vermelho brilhante em sua mão.

"tá enjoada Pipes?" - perguntou Leo, esperando não ter que levá-la para casa. O garoto comentava das garotas que passavam, seus nomes, seus trejeitos e escolas, mas elas poderiam todas ser uma massa indistinta de roupas sobre pele e Piper não notaria a diferença.

"vou fumar um pouco." - respondeu enquanto ia ao banheiro, desbravando seu caminho na multidão de pessoas e fumaça que se espalhava desigualmente na sua proximidade, mãos rústicas tocavam-lhe no que ela esperava fossem movimento acidentais mas não era inocente o suficiente para acreditar nisso.

    O cômodo era apertado e o ladrilho frio, o cheiro como o de um banheiro químico e o espelho ainda mais sujo. Ela chorou se olhando no espelho, rosto distorcido pelas lágrimas. Nunca chorara de maneira verdadeiramente atraente, a não ser quando atuou em um dos filmes do seu pai, cujo o qual aos oito anos foi informada sobre o quão feio era seu choro e foi obrigada a mudá-lo.

    Ela abriu a pequena caixinha de metal e pegou um dos pequenos tubinhos brancos e levou aos lábios, encostando-se na porcelana do vaso sanitário rente a parede.

     Por que?

     Por que seu peito se apertava quando via duas pessoas que ela considerava perfeitas uma para outra juntas? Por que não podia sustentar um relacionamento como aquele? Por que Jason foi um fracasso? Por que queria tirar uma delas dos braços da outra? Por que...Porque a que ela queria puxar para si não era Percy?

"por que...tinha que ser uma...uma aberração?" - ela sussurrou com a garganta instalada, as respostas das outras perguntas se tornando claras em meio a fumaça inebriante que consumia a cômodo.

    Era o tipo de coisa que ela sempre carregou consigo mas se tornava enterrada em seu corpo tão fundo que acabava por esquecer, assim como a sujeira dita pelos diretores dos filmes de seu pai, assim como os tabloides, assim como as piadas de teor racista que escutava.

    Ela queimou a ponta do cigarro na coxa e encolheu os joelhos até encostá-los na bochechas. Suja.

•••

     Batidas incessantes retornaram ela a festa depois de quase vinte minutos trancada, era - claro que era - Annabeth. Seus lábios meio manchados, seus cabelos meio amassados seu sorriso escancarado.

"então é você que tá ocupando esse lugar?" - ela esticou o nariz - "sabe que poderia ter fumado na janela."

"queria ficar sozinha...hum, bebi demais." - afirmou mentindo. A loira entrou e fechou a porta atrás delas quase como se soubesse o que passava na cabeça da amiga e quisesse tortura-la.

"acha que sou estúpida?" - respondeu a garota tomando seu lugar no acento fechado, o seu rosto adquirindo o brilho de uma estrela sob a fraca luz pálida e branca.

"não, achar isso que é estupidez." - cuspiu Piper, irritada. Annabeth puxou-a para dividir o pequeno espaço, pois era isso que garotas normais faziam.

"meu dia foi péssimo também se quer saber." - explicou, piscando seus olhos cinzentos enquanto tirava um dos cigarros da caixa, seu lábios carnudos consumindo o pequeno papel.

"little miss perfect não foi o orgulho dos pais?" - debochou, isso era uma das poucas coisas sobre a loira que não entendia, sua obsessão com orgulhar a mãe.

"não tem ideia." - franziu as sobrancelhas, distante. - "e você? pais, garotos, ou problemas mentais agravados."

"eu...eu sou terrível." - Disse Piper, que deixou as lágrimas traçarem linhas sobre as bochechas rosadas. Annabeth enroscou seus braços nos ombros da amiga, o que fez sentir-se ainda pior.

"todo mundo é terrível as vezes." - tentou, a loira era péssima em consolar as pessoas.

"mas você não é, essa é a maior parte do problema." - Retrucou Piper.

academia meio-sangueWhere stories live. Discover now