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Acordei com a cortina translúcida roçando meu rosto e fazendo cócegas suaves na minha bochecha, quase como um comprimento de boas vindas de casa para mim. Sem sonhos dessa vez. Acho que dormi pouco tempo porque senti o cabelo levemente úmido na parte detrás da cabeça e ainda estava na mesma posição que fiquei próximo a parede.

Me sentia melhor, é o que importa.

Cocei os olhos e bocejei baixinho, olhando através da cortina para a cidade que despertava aos poucos. O céu estava claro o suficiente para atrapalhar meu sono então não tentei voltar a dormir mesmo com o conforto do cobertor ao redor dos ombros cantarolando para que eu cedesse, sei que não conseguiria já que meus olhos se recusam a fechar enquanto tiver qualquer filete de luz ao redor.

Essa minha sensibilidade para a luz é incômoda de tão assídua.

Me espreguicei com um pequeno gemido a tempo de ser lembrada, por um ronco alto, que não estava sozinha. Assim que olhei na direção dos visitantes percebi que ambos, Grillo e Povan, ainda dormiam profundamente.

O primeiro era espaçoso, o que tornava engraçadas as posições em que ficava. Ao que parece, Povan também gostava de espaço já que estava de um modo diferente do qual eu lembro da noite passada, e quase nu, com o lençol que deveria cobrir o corpo, embolado entre as pernas.

Aproveitei a claridade para finalmente conhecer meus companheiros mais de perto. Não deveriam passar dos 30, talvez um pouco menos, as cicatrizes denunciavam uma vida difícil que pode lhes ter roubado alguns anos ou talvez, ao deixar a barba crescer tanto, podem ter exatamente essa intenção de parecer mais velhos do que realmente são.

Eles têm algumas manchinhas pelo rosto, marcas de contato intenso com o sol, a pele de ambos era nitidamente bronzeada e os rostos e mãos tinham um tom mais quente que o restante do corpo. Ainda acho que vivem pelo deserto, tudo indicava que sim, mas que não eram de lá.

Os nativos têm a pele em diversos tons de escuro e oliva, inclusive muito próximos aos que eles têm, porém, é de uma naturalidade tão singular que encanta. Talvez meus convidados sejam imigrantes fugidos do regime extremista de algum dos países próximos ou daqueles do outro lado do deserto, ou talvez ainda estejam tentando imigrar e não seria surpresa alguma. Se eu tivesse a chance, iria também.

Grillo tinha o corpo um pouco mais definido que Povan, seja lá o que eles fazem para sobreviver, Grillo deve ser a força bruta disso. Ele carrega alguns pelos escuros pelo peito, o que era mais do que mantinha na cabeça raspada. Povan também raspava a cabeça; acho que combina mais com o corpo esguio dele. A barba vinha se fechando das orelhas até o queixo, mas ainda não tinham se encontrado, ah...lá está o motivo: uma cicatriz antiga. Não reparei nela noite passada.

- Hm... - Gemi, pressionando a mão contra a barriga quando meu estômago resolveu avisar muito agressivamente que estava vazio há tempo demais - dramático - sussurrei para minha própria dor, que mais parecia uma câimbra, enquanto forçava as pernas a ficarem de pé e caminhar até a cesta de comida.

O que tinha ali era suficiente para quatro dias comigo, mas não alimentava nem um único dos meus visitantes, então coloquei algumas sementes na boca e mastiguei bastante para enganar a fome.

Completei a refeição com uma tira de pele seca de coiote, como era salgada demais beberiquei um pouco da água restante para limpar o paladar então limpei a gordura residual dos lábios com as costas de uma das mãos logo pegando uma folhinha de ervagelo para mastigar.

Como minhas roupas masculinas tinham acabado, não tive alternativa a não ser usar as femininas, o que não era nada confortável considerando o calor intenso, não importava o quanto os tecidos fossem finos. Não que os meus fossem, pelo contrário.

Entre DunasWhere stories live. Discover now