Antes de passar pelas abas, para dentro da fenda, precisei me engajar em duas atividades: A primeira, menos degradante, foi colocar para dentro um chá de cheiro enjoativo com minúsculos raminhos escuros roçando meus lábios enquanto eu tentava, a todo custo, ingerir apenas o líquido sem sabor.
- Qual o efeito disso?
- Aguentar o calor.
Najarah foi curta e grossa em sua resposta, apontando para a pequena tigela entre minhas mãos, me obrigando a tomar o restante.
Bom, faz certo sentido.
As firulas de vapor que escapavam por entre as abas denunciavam o calor escaldante que deveria estar no lado de dentro.
Não é algo que me assuste, na verdade, não depois do que vi com Grillo e sua luz vítrea. Pouca coisa me assusta agora.
A segunda atividade foi questionar minha sobriedade.
Eu não fico embriagada facilidade, e opiláceos só fazem efeito em doses cavalares, beirando o fatal.
Desconfio que só certos tipos de veneno consigam me apagar mas não tenho certeza, também não tenho a curiosidade de descobrir.
Fui picada por um escorpião amarelo quando era criança e só senti alguns calafrios. O que, por comparação, acredito que indique que não fui envenenada por esse chá, mas não ignora a possibilidade de ter sido batizada por ele.
Não me sinto entorpecida mas estou leve, como se tivesse acabado de acordar. E ainda assim, a sensação é de que vou sair voando por aí como um punhado de areia.
Sem tontura, sem desequilíbrio, sem alucinações.
Será que isso é medo?
Certa vez, no Templo, ouvi que os humanos tem medo do que não entendem. Não sei se é o caso agora. Talvez seja. Mas me recuso.
- Está com frio? - Najarah perguntou, abrindo uma das abas para eu passar.
- Parece que estou?
Ela deu de ombros.
- Está se abraçando com tanta força que parece que quer virar do avesso. E suas mãos estão tremendo.
Imediatamente cerrei os punhos escondidos embaixo do meu próprio abraço.
- É impressão sua.
Antes que falasse mais alguma coisa, abaixei a cabeça e atravessei a fenda só para me deparar com uma das maiores loucuras que já tinha visto até então.
Porque, de alguma forma, acabei dentro de um luxuoso quarto de banho, com vista a aberta das janelas de gradeados muxarabi para um interminável e florido jardim.
As paredes eram altas, feitas por cal e gesso tingido de carmesim como canela mas decoradas com hieróglifos e desenhos rupestres coloridos incandescentes.
Parecia contar uma história como se todo aquele quarto fosse um pergaminho.
Mais para cima, o telhado ganhava um formato oval quanto mais alto ficava. Uma brisa refrescante atravessava as janelas e balançava as tapeçarias que cobriam a passagem para a única porta naquele cômodo, tornando tudo mais real...e assustador.
Parecia que eu estava no alto de uma torre.
Mas não haviam torres no deserto.
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Entre Dunas
FantasyEudora Fazad cresceu em Fossa, uma cidade ressecada pelo deserto Vhial, que a circunda. A opressão que seu povo sofre não a impede de aprontar de vez em quando,principalmente, se a barriga exigir o alimento que ela só consegue por meio do roubo e de...