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Eu estava encharcada pela chuva muito antes de sequer me dar conta do quanto essa mesma afirmação parecia absurda.

Ergui o queixo e fechei os olhos, deixando as gotas mornas atingirem meu rosto em sua constância aleatória.

Chuva.

Estou presenciando chuva.
Poderia contar nos dedos de uma das mãos quantas vezes tinha visto chuva, mas nenhuma dessas vezes a água tinha essa intensidade.

Meu cabelo e roupas ensopados grudadaram no meu corpo como uma segunda pele. Meus sapatos estavam fundos na lama que se forçou na poça de água abaixo de meus pés.

A sensação era maravilhosa.
Me senti parte daquele deserto.

Fechei as mãos em concha e esperei um pequeno volume de água se acumular entre elas. Era límpida e levemente morna. Quando estava prestes a levar o conteúdo até a boca um clarão arrepiou os pelos do meu corpo e um estrondo reverberou por todos meus ossos.

Imediatamente tapei os ouvidos e me encolhi, apertando os olhos para me defender tanto do susto quanto de um próximo estrondo. Tarek ria animadamente ao meu lado, segurando a barriga dos espasmos da gargalhada.

Imbecil.

Ainda com os ouvidos cobertos pelas mãos direcionei o olhar para ele e pude notar como suas roupas escuras também estavam grudadas aos seus músculos, expondo as definições que só cogitei que ele tivesse em íntimos devaneios.

Ele também estava completamente molhado. O cabelo escorrido grudava no pescoço. Parecia maior, mais escuro agora que estava ensopado e, de alguma forma, combinando perfeitamente bem com seu semblante de quem tentava recuperar a compostura (mesmo que mantendo aquele sorrisinho de desafio que frequentemente me lançava). Tarek passou a se aproximar de mim enquanto jogava os cabelos para trás.

- O que foi isso?! - Minha pergunta abriu ainda mais o sorriso dele.

- Um relâmpago e um trovão. Você não conhece?

- Agora conheço! E não quero ver nunca mais.

Tarek agora tinha comprimido seus lábios em uma linha fina, provavelmente querendo me tranquilizar.

- Já passou, não tem perigo. - ele umedeceu os lábios com a língua, me oferecendo sua mão. - Me deixe mostrar como são bonitos.

- Você só pode estar brincando. - apertei mais meus ouvidos, olhando rapidamente para as nuvens que me cobriam. O cinza ficava mais claro a cada minuto que se passava, e o maior volume de água estava concentrado, principalmente, sobre o corpo d'água de onde sua invocadora chamava...por mais estranho que isso possa parecer.

- Confia em mim. - Minha mão estava unida a dele antes de Tarek terminar a frase.

Minha mente tem ressalvas, mas o restante do meu corpo acreditava em cada palavra que Tarek falasse, para minha completa dúvida.

Mas, ele, satisfeito com a resposta instantânea, apertou meus dedos nos seus e ficou atrás de mim a uma distância longa suficiente para não estarmos colados, e, ao mesmo tempo, curta o suficiente para eu sentir o calor que emanava dele mesmo com toda aquela água lhe cobrindo.

- Olha para a nuvem mais escura, - meus olhos facilmente encontraram a mulher no meio do lago - para o centro dela. - ele me corrigiu. E fiz o que pediu. - As nuvens escuras são carregadas com energia e, dependendo das circunstâncias do ar no momento, toda a energia é descarregada de uma só vez, gerando um brilho intenso que foi a claridade que você viu. Esse fenômeno é chamado de relâmpago.

Entre DunasWhere stories live. Discover now