HORA VINTE E OITO

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Aquele dia, era, sem dúvidas, um dos dias mais felizes da minha vida.

Após nos beijarmos até cansar no mirante, em meio a famílias e idosos, caminhamos lentamente até o Mirage Hotel de mãos dadas e aquela caminhada, que antes pudera ter sido um pouco cansativa e longa, pareceu um momento de relaxamento para mim. Ou melhor, um momento de pré-prazer.

- Você é petulante - reclamei, fuzilando-o com os olhos - por que me deixou tão constrangida hoje cedo?

- Mel, é complicado - ele respondeu, após alguns segundos - e eu preciso te pedir um voto de confiança também. Não pedirei mais nada além disso. Certo?

Aquele pedido me deu frio na barriga. Não me parecia um bom sinal, mas meu coração ansioso e intenso batia em frequências irregulares só de estar ao lado de Camilo, e por ora, aquilo me bastaria. Eu precisava me permitir viver o momento pelo menos uma única vez na vida.

Passávamos pela fase final da nossa breve caminhada e nesse momento, adentraríamos em uma pequena clareira um tanto quanto dominada por folhagens diversas, provavelmente a mencionada por Bruno anteriormente. Para garantir minha segurança, Milo me passou para trás, para tomar a frente do trajeto, em uma espécie de fila indiana até o final daquele breve trecho.

A situação seguinte ocorreu em um piscar de olhos.

Em um momento, Milo me passava para trás, enquanto dava dois ou três passos largos em minha frente.

Logo em seguida, o vi pisando em falso e caindo, apenas de um único lado do corpo, como se sua perna direita tivesse ficado presa em algo no fundo.

- Mel - ele falou, quase em um grito - você precisa buscar ajuda. Isso aqui... vai dar ruim - ele conseguiu dizer, arfando. Pude ver gotículas acumularem em seus olhos enquanto seu rosto ficava vermelho como nunca tinha visto.

Em um ato de desespero, sai correndo em saltos longos, torcendo para não cair em mais nenhum lugar e, em menos de cinco minutos (que pareceram horas), cheguei à recepção do Mirage, entrando como um furacão.

- Alguém!!! Bruno, socorro, pelo amor de Deus - eu gritava, sentindo as lágrimas rolarem pelo meu rosto.

- O que houve? - Bruno respondeu em um pulo, levantando-se rapidamente da cadeira posicionada atrás da mesa da recepção.

- O Camilo se machucou, eu preciso de uma ambulância ou algo do tipo - exclamei, levando as mãos no rosto - é algo urgente!

Bruno rapidamente pegou um walkie-talkie que estava na cintura e comunicou a quem ouvia a linha que precisava de auxílio médico. Rapidamente, passou para fora do hotel e pediu para que eu o guiasse até o local do ocorrido.

- Essa região tem muita armadilha para captura de pequenos animais - informou ele - elas ficam escondidas embaixo de uma camada generosa de folhas.

- E não passou pela mente de ninguém criar placas de aviso? Talvez um caminho alternativo? - indaguei, explodindo em raiva.

- A gente não está no Rio de Janeiro, moça. Nossos recursos são escassos e raramente temos esse fluxo de gente na cidade - ele respondeu, de forma ríspida.

Encontramos Camilo agachado, quieto e tentando manter a calma.

Eu não sabia exatamente o que tinha acontecido, mas mesmo estando em silêncio (ensurdecedor), sabia que Camilo estava totalmente vulnerável e ferido.

- Você acha que caiu em uma armadilha? - perguntou Bruno, levantando lentamente Camilo, que gemeu de dor.

- Não, acho que não - ele conseguiu responder, em voz baixa - mas acho que quebrei minha perna.

- Calma, provavelmente foi só uma lesão - tentei dizer, encostando em seus ombros, em uma tentativa maluca de consolá-lo - onde está a ajuda que você pediu?

Bruno tentou novamente levantar Camilo, mas de alguma maneira insana, sua perna parecia presa naquele buraco. Talvez, de fato, havia uma fratura, por isso estava sendo tão difícil movimentá-lo sem causar dor.

Mil coisas se passavam em minha mente, e meu coração batia tão forte, que o sentia quase saindo pela garganta.

Milo era um surfista, meu Deus. Esse esporte era sua vida. Esse ano era o seu ano de ouro. O que seria dele, agora?

Em pouco menos de vinte minutos, um grupo de quatro homens apareceram e pediram para que eu desse um pouco de espaço, no intuito de tirar aquele homem de 1,85m de onde estava.

Camilo estava pálido, suado e vermelho como um pimentão.

Aos poucos, os ajudantes cavaram ao redor do buraco e lentamente conseguiram remover a perna de Milo de lá, apoiando-o em seus ombros para carregá-lo.

- Nós não conseguimos uma ambulância - falou Bruno, preocupado com a minha reação - mas há 15km daqui tem um centro médico que costuma ser bem vazio. Vou pegar o furgão do hotel e eu e o pessoal o levará até lá.

- Eu vou junto - exclamei - eu não vou deixá-lo sozinho assim...

- Vá com o meu carro - Camilo exclamou - a chave está no nosso quarto.

- Procura no Maps "Hospital Regional São Francisco" e nos encontre lá - disse Bruno com euforia, enquanto ajudava os outros.

Em poucos minutos, vi Camilo, aquele lindo e grande homem ser levado pelos outros, como se fosse uma criatura mundana e frágil. Sua perna estava imensa e roxa, levemente pendurada, mas o excesso de inchaço camuflava tudo, me deixando confusa quanto ao real diagnóstico.

Entrei em nosso quarto como um foguete e peguei as chaves do carro assim que as vi. Tive a rápida ideia de pegar uma troca de roupa para Camilo, que estava bastante lambuzado de barro e terra após ter sido praticamente desenterrado pelos colegas de Bruno. De forma cuidadosa, abri a pequena mala dele e retirei de lá uma calça de moletom cinza e uma camiseta branca lisa (talvez a peça oficial do seu guarda-roupa) e me atentei em pegar o pequeno pedaço de papel escrito 16/01 seguido por um coração. Coincidentemente, hoje era 16/01.

Examinei o papel com cuidado, observando o tom roxo da tinta da caneta que não se vinculava com uma caneca azul convencional. Não conhecia a letra de Camilo, mas poderia apostar que aquela letra não era dele.

Então, de quem que era?

96 HORASHikayelerin yaşadığı yer. Şimdi keşfedin