Oitavo Capítulo:Bônus

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Publicado: 20/07/2017


Ela subiu na cerca de madeira, passando uma das pernas para o outro lado. Faltava pouco para o nascer do sol e Carolina adorava as diferentes cores. Naquele lugar em especial era possível ver a árvore preferida de Thamara, elas costumavam quando crianças se divertir nos balanços e admirar a mudança que jurava acontecer na cor de seus cabelos.

Era um tempo sem cobranças, sem grandes anseios e os únicos acontecimentos que colocavam um irmão contra o outro era quem ficaria com o último pedaço de bolo. Dessa vez Carolina não pudera bancar a apaziguadora e a lembrança da voz de Thamara era de alguém quebrada.

Carolina havia listado todos os motivos para não agir como um elo para José Pedro, só que o caçula havia implorado, e como ela se arrependia de ter vivenciado a situação.

— Thamara?

Eles ouviram apenas a respiração do outro lado, assim que José Pedro assumiu o celular.

— Desculpa.

A mulher de olhos verdes quis bater naquele peão estúpido. Como era possível usar aquela palavra para tentar apagar os minutos mais terríveis que transformou a visita? E nem se assustou por não conseguirem nenhuma resposta.

Thamara tinha o direito de já ter finalizado a conversa, mas Carolina sabia que não era dessa forma que a Miss Vaqueira agia. Ela tinha o costume de ouvir quando era ferida,  não para se curar, era uma forma de tortura, a contagem de quantas palavras seriam usadas ao machucá-la e na possível cicatrização.

— Espero que tenha perdoado seu marido.

Ótimo, José Pedro! Demonstre o tamanho do estrago.

— Soube que visitou vovó Maraísa.

E novamente o peão silenciou. Como poderia existir alguém no mundo tão ruim para construir um diálogo decente? Segundo o olhar profissional, a pragmática de José Pedro estava uma vergonha!

— Estamos com saudades.

E mais uma vez ele interrompeu, só que Carolina já esperava uma resposta diferente.

Olhou para a mão esquerda e ergueu os três dedos, numa contagem rápida.

— Droga, Thamara! Eu não queria dizer aquilo.

— Mas, disse! —Thamara finalmente replicou e desligou.

Expirando, a fonoaudióloga observou a beleza da natureza.

O mês de julho era o pior de todo o ano para Carolina, poucos dias para lembrar a data de aniversário de Igor bem como o tempo que a transformara em uma viúva tão jovem. Olhou para as botas, perguntando-se quando realmente se daria outra chance de ser a menina que sonhava com uma vida idêntica aos dos pais.

— Bom dia, caçadora de ruivos.

Ela riu, aceitando uma mão de Guilherme:

— É uma pena que eu tenha que descer — reclamou, ao pular para o chão — Seu dever era sentar ao meu lado.

—Pode encostar na cerca que é a mesma coisa — ele argumentou, puxando o chapéu para cima — Estou velho, Carolina.

— Um velho muito bonitão — ela elogiou, abraçando-o — Sabe que gosto de ficar aqui no final de semana, eu deveria me sentir um pouco fora de órbita, mas Leotie continua sendo minha casa.

— O que você esperava? — Ele perguntou orgulhoso — Você aprendeu as tarefas muito rápido e sempre adorou participar das provas dos tambores, e até tinha talento no touro mecânico.

— Eu era muito preguiçosa — Carolina completou com uma risada.

— Sim.

— Eu pensei que ao menos Augusto fosse se aventurar... Igor gostava das competições.

Carolina se interrompeu, aceitando que não sentia mais uma dor inexplicável ao falar do marido, havia restado uma saudade suportável.

— E você pode me ajudar com o projeto das escolas — Guilherme sugeriu com um sorriso vitorioso, fazendo-a revisar os olhos.

— Pai, o senhor tem que parar com essas malandragens!

— Segundo sua secretária você tem um tempo livre e os meus netos se mostraram interessados.

Carolina franziu o cenho:

— Os alunos são todos crianças?

Guilherme ergueu as mãos:

— De quatro a sete anos, a maioria mora em fazendas próximas.

Carolina suspirou, encolhendo os ombros:

— Eu ajudo, mas não quero surpresas. Entendido?

O patriarca da família meneou a cabeça, concordando, mantinha o sorriso vitorioso. Ele realmente precisava da ajuda de Carolina, uma vez que Bianca estava decidida a ficar ao lado de Thamara. Sua Miss Vaqueira chegaria dia nove de julho e os únicos informativos sobre a gravidade da situação partia de Priscila.

E Guilherme sabia que a madrinha da filha era capaz de florear os últimos acontecimentos.



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