ONZE ::: 05 de Abril de 2009 - Exemplos

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Jackie estava novamente parada na frente do prédio que albergava no 3º andar a sala onde decorriam as reuniões da OAVS. Agora ela não se sentia indecisa de entrar ou não. Tinha optado por começar frequentar as reuniões há uma semana, mas só agora ela tinha finalmente tomado coragem, pois a felicidade do primo e da melhor amiga tinham lhe dado essa coragem.

O fato que a fazia permanecer do lado de fora do prédio era um bem mais simples. Faltava ainda uma hora para reunião começar e as portas do prédio estavam fechadas.

Jackie permaneceu parada olhando fixamente para a fachada do prédio, contorcendo as mãos. Um gesto habitual desde que ela era pequena que demonstrava o quanto ela estava nervosa.

Escutou duas risadas se aproximarem dela e desviou o rosto do prédio para olhar na direção do som. As duas mulheres da outra semana chegavam de braço dado, cochichando qualquer coisa que aparentava ser engraçada, pois vez ou outra, elas riam.

Uma delas olhou assim que viu Jackie as encarando. Hale virou rapidamente o rosto para baixo, desviando o olhar e se sentindo envergonhada por tê-las olhado tão descaradamente. Os seus dedos repuxavam uns aos outros, se contorcendo mais ainda, demonstrando que ela estava incomodada e deveras nervosa com a situação.

— Oi. — Uma delas a cumprimentou num tom de voz suave e sereno, fazendo Jackie erguer timidamente o rosto para encarar as duas belas mulheres.

Hesitante em responder, porque sua voz lhe falhava em momentos de nervosismo, Jackeline sorriu brevemente e tornou a encarar a fachada do edifício com exagerada atenção.

— A reunião só começa dentro de uma hora. — A belíssima e alta loira informou.

— Eu sei. — Hale murmurou em resposta sem desviar o olhar de volta para as duas.

— Vai ficar esperando? Nós vamos esperar ali no café em frente. Se quiser se juntar a nós. — A outra mulher, de voz doce, convidou com um olhar expectante.

Jackie titubeou por longos quinze minutos. Havia tantas entraves que ela mesma colocara para se relacionar com gente nova. Não só pelo que lhe aconteceu, mas por ter receio de falar do seu passado, mas logo ela jogou todas essas indecisões e temores para o alto. Com o resquício de coragem que lhe restava, se encaminhou até o café em que as duas mulheres aguardavam o começo da reunião. Afinal ela não precisava temê-las. Elas provavelmente passaram por algo semelhante e iriam respeitar o silêncio de Jackie.

Ao abrir a porta o cheiro amanteigado de croissants acabados de fazer tomou conta do ar. O café não estava muito cheio. Algumas senhoras de idade sentadas à beira da janela, tomavam os seus chás e comiam variedades de bolos; alguns homens jovens sentados ao balcão, bebiam as suas cervejas, falando entre si e rindo alto; e por fim ao fundo do salão, as duas mulheres, conversando animadas, bebendo algo e comendo croissants frescos.

Jackie caminhou até elas e finalmente as cumprimentou verbalmente.

— Oi. — Sua voz soou um pouco falha, fazendo Jackie aclarar a garganta com um pigarreio e repetir o cumprimento. — Olá.

— Oi. — As duas cumprimentaram em uníssonos, sorrindo para a jovem. — Sente com a gente. — A morena de intensos olhos azuis convidou, puxando a cadeira para a novata.

Uma das funcionárias do estabelecimento se aproximou da mesa com um bloco de notas e uma caneta nas mãos e aguardou o pedido da nova cliente. Jackie olhou o que as meninas tomavam e indicou que iria querer o mesmo. Chocolate quente e croissant amanteigado.

— O meu nome é Lacey e essa é a Caroline. — A morena apresentou as duas com extrema simpatia.

— Mas me trate apenas por Carol. Caroline parece minha mãe me dando sermão. — A loira riu, revirando os olhos divertidamente e mordiscando mais um pedaço do seu croissant.

— Jackeline, mas podem me chamar apenas de Jackie. — Se apresentou igualmente num tom de voz baixo, ainda se habituando aos poucos da informalidade.

— Que bom que decidiu voltar. — Lacey comentou animadamente.

— Costumam demorar mais tempo. Algumas não voltam mais. — Carol explicou e Jackie prendeu a respiração, temendo que elas perguntassem algo que ela não queria responder.

— Você foi muito corajosa. Saiba que pode contar com a gente para o que precisar. — A morena falou séria, caçando sobre a mesa a mão de Jackie e a apertando num gesto carinhoso.

— Vai ser difícil nas primeiras reuniões para você se enturmar e conviver com as outras pessoas do grupo, mas queremos que saiba que ninguém vai obrigar você a nada. Você fala quando você quiser, se apresenta quando você quiser, conta sua história quando se sentir preparada... — Caroline elucidou num tom mais grave e Hale assentiu com o olhar turvo.

— O único compromisso que você terá é consigo mesma e com mais ninguém. — Lacey finalizou, soltando por fim a mão de Jackeline e dando a ela um tempo para se recuperar e limpar as lágrimas teimosas que caiam por seus olhos cor de avelã.

Jackie foi tomada de surpresa por aquele discurso tão repentino e tão direto das duas. Estava tão acostumada que as pessoas pisassem ovos quando estavam perto de si, que evitassem qualquer assunto triste ou que pudesse ferir suas suscetibilidade que aquela "intervenção" positiva foi um choque.

Talvez essa frontalidade fosse porque elas já estiveram no lugar de Jackie e podiam compreender o que ela sentia, bem como sabiam como abordá-la de uma forma que poderia parecer um tanto assustadora a princípio, mas que a faria pensar no verdadeiro significado de tudo aquilo.

Jackie se sentia mais aliviada agora que muitas coisas tinham sido esclarecidas e sorriu sincera e agradecida para as duas.

Com aquelas palavras ela se sentiu mais livre de tomar decisões, como também se sentiu mais responsável por essas mesmas decisões.

Tal como Lacey havia dito, o único compromisso que Jackie teria era com ela mesma e se ela estava disposta a afastar todos os demônios que ficaram agarrados a ela desde que fora liberta do cativeiro, então também teria de estar disposta a se comprometer a ir a todas as reuniões, que, comprovadamente, faziam muito bem às participantes.

Concluía isso ao olhar para as caras animadas das duas mulheres à sua frente.

— Há quanto tempo... — Quis questionar algo, mas de novo a sua voz soou baixa demais. — Há quanto tempo estão... estão aqui? — Perguntou curiosa enrugando a testa numa expressão indecisa.

— Sete anos. — Carol respondeu.

— Cinco anos... — Lacey hesitou. — É, acho que quase cinco anos.

Jackie se assustou um pouco com o tempo, arregalando os olhos. Demoraria ela assim tanto tempo até se refazer do que passara? Até se livrar de todos esses demônios?

Antes que afundasse em questionamentos negativos, ela se afastou dessas questões quando a empregada trouxe o seu pedido.

Não importava o tempo que fosse demorar até se refazer, importava era que se refizesse... e exibisse sorrisos tão alegres quanto o das duas mulheres. Elas eram dois exemplos a serem seguidos, tal como Elizabeth. E Jackie as seguiria sem quaisquer dúvidas.  

Stockholm [PT/BR]Onde as histórias ganham vida. Descobre agora