QUINZE ::: 05 de Abril de 2009 - Conselhos Importantes (II de III)

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— Está tudo bem com você? — Lace perguntou a Jackie em meio de sussurros ao perceber a expressão assustada e pálida como o cal da jovem.

— E-es-tá. — Gaguejou engolindo em seco. Era mentira, mas não queria preocupar ninguém mais do que já tinha preocupado sua família e amigos e principalmente não queria ser alvo de atenção e perguntas.

— Quer sair daqui? — Caroline questionou também em murmurios e Jackeline se sentiu acolhida por ambas e sorrindo as tranquilizou.

— Não, obrigada. Eu ficarei bem. — Garantiu a ambas, inspirando fundo e tentando se acalmar.

— Em primeiro lugar eu gostaria de falar do medo. — Richard iniciou, caminhando lentamente no centro do círculo com as mãos nos bolsos. Seu rosto tinha reflexos vermelhos pela barba por fazer e estava sereno, agindo como um profissional e não como uma testemunha de atrocidades e também uma vítima.

— A primeira questão que se coloca é: Porque sentimos medo? Se não tivéssemos medo, não teríamos nenhum receio de carros em alta velocidade, de animais venenosos e de doenças contagiosas. Tanto nos seres humanos como nos animais, o medo tem por objetivo promover a sobrevivência. Houve uma pequena polémica quanto à expressão literal de "face do medo", ou seja, a expressão facial de olhos arregalados e boca aberta que costuma significar medo extremo, se tornou motivo de discussão. E a questão "Por que as pessoas fazem essa expressão quando estão aterrorizadas?" se levantou. Alguns diziam que Deus dera a todas as pessoas uma maneira para que outras soubessem que estavam com medo caso não falassem a mesma língua. Charles Darwin, por outro lado, disse que isso era o resultado de um enrijecimento instintivo dos músculos disparado por uma resposta desenvolvida para o medo. É a habitual questão entre a Crença e a Ciência.

» O ser humano pode ter o dom da antecipação, o que nos faz imaginar coisas terríveis que poderiam acontecer: coisas sobre as quais ouvimos, lemos ou vimos na TV. A maioria de nós nunca vivenciou um acidente de avião, mas isso não nos impede de sentar em um avião e agarrar firmemente nos apoios dos braços. A antecipação de um estímulo de medo pode provocar a mesma reação que teríamos se vivêssemos a situação real e isso também é um benefício obtido com a evolução.

» O circuito da reação de medo pode ter sido afinado pela evolução, mas também há um outro aspecto do medo: condicionamento. O condicionamento é o motivo pelo qual algumas pessoas temem cachorros, ao passo que outras os consideram praticamente um membro da família. O temor que uma pessoa sente de cachorros provavelmente se deve a uma resposta condicionada. Quem sabe se essa pessoa não foi mordida por um cachorro quando tinha três anos de idade e, muitos anos depois, o cérebro dela (a amígdala, em especial) ainda associa a visão de um cachorro com a dor da mordida?

» Mas também não nos podemos esquecer que por vezes utilizamos o medo como um condutor de adrenalina. Isto é, se você gosta de filmes de terror, já sabe que o medo pode ser excitante. Muitas pessoas gostam de sentir medo. E a excitação da reação de luta ou fuga pode ser prazerosa e até imitar a excitação sexual, o que faz que não seja nenhuma surpresa o fato de pessoas quererem ver filmes de terror e andar de montanha-russa em encontros românticos.

A palestra podia ser considerada chata por muitos outros, mas por pessoas vítimas do medo constante aquilo era um meio de se tentarem entender, de perceber o que sentiam, porque sentiam e porque não conseguiam ultrapassar. Com exeplos simples Richard mostrava a todos ali presentes que o medo era comum, uma evolução do ser humano e um mecanismo de defesa e isso deixava Jackie se considerando mais normal.

— Eu li um artigo sobre a relação entre o medo e excitação. Falava de um estudo feito por psicólogo. Era algo relacionado com duas pontes. Uma estável e outra instável. No final das pontes estavam as assistentes estonteantes do psicólogo. Depois do grupo de cerca de 30 homens atravessar as pontes, elas fizeram umas questões e deram os números de telefone a todos eles, para o caso de quererem tirar dúvidas. Apenas 2 dos trinta homens que atravessaram a ponte segura contataram a assistente, enquanto 9 dos outro 30 que atravessaram a ponte instável, contataram a outra assistente. A conclusão do psicólogo foi que o estado de medo estimula a atração sexual. – Uma garota morena falou e algumas outras soltaram trejeitos de espanto e incredulidade.

— Obrigada pela informação Angela. Isso realmente é um estudo bastante interessante. — Beth agradeceu.

— Aí no livrinho tem oito dicas, que saíram em um artigo da revista Prevention intitulado "Do que você tem medo? Oito segredos para fazer o medo sumir" para lidar com os medos diários. — Aiden substituiu o pai no discurso e pegou no livreto, folheando o mesmo e indicando a página onde esse artigo estava e começando a ler em voz alta.

1º: Não importa o motivo de você ter medo: saber o motivo de ter desenvolvido um medo específico não ajuda você na hora de superar esse medo e atrasa seu progresso em áreas que realmente vão lhe ajudar a ter menos medo. Relaxe e pare de tentar descobrir o porquê.

2º: Aprenda sobre aquilo que você teme: a incerteza é um grande componente do medo. Desenvolver um entendimento do que você tem medo ajuda bastante a apagá-lo.

3º: Pratique: se houver algo que você tem medo de tentar porque parece assustador ou difícil, trabalhe em etapas. Criar familiaridade aos poucos torna essa coisa mais fácil de se controlar.

4º: Descubra alguém que não tem medo: se há algo de que tem medo, encontre alguém que não tenha medo dessa coisa e passe um tempo com essa pessoa, levando-a para lhe acompanhar na hora de enfrentar seu medo. Acredite, vai ficar muito mais fácil.

5º: Fale sobre seu medo: compartilhar seu medo com outras pessoas faz com que ele fique bem menos aterrorizante.

6º: Faça jogos mentais consigo mesmo: se tiver medo de falar na frente de várias pessoas, isso provavelmente acontece porque você acha que elas irão lhe julgar. Tente imaginá-las sem roupa, já que ser o único vestido na sala coloca você na posição de julgá-las.

7º: Pare de olhar a floresta inteira: olhe apenas a árvore que está a sua frente. Se tem medo de alturas, não pense que tem de ir ao quadragésimo andar de um prédio. Em vez disso, concentre-se apenas em entrar no corredor.

8º: Procure ajuda: o medo não é uma emoção simples. Se estiver com problemas para superar um medo sozinho, procure um profissional para ajudá-lo. Há vários tratamentos para o medo, e não há nenhuma razão para você não experimentá-los, desde que tenha a orientação de alguém com treinamento e experiência.

— Vocês podem estar se perguntando a relação do medo com o que vocês sofreram. O medo pode estar bem mais presente e intenso em uma pessoa que sofreu algum tipo de trauma. O sequestro em si já é um grande trauma e tenho certeza que a maior parte de vocês ficou com receio de alguma coisa após retomarem suas vidas depois de um rapto, certo? — Richard continuou o discurso após o filho. Eles pareciam ter aquilo muito bem ensaiado, mas ao mesmo tempo saia com naturalidade.

— É, eu fiquei com medo da água. — Lace revelou e Jackie a olhou, se questionando curiosa o que tinha acontecido com ela.

— E porquê? — Aiden questionou inocentemente, não com o intuito de a fazer reviver, mas de a fazer de exemplo.

— Porque meu raptor sempre me colocava debaixo de água por vários minutos sempre que se sentia frustrado. — Relembrou triste, mas não abalada por revelar isso.

— E eu fiquei com medo de alturas. — Angela contou. — Quando assaltaram o banco em que eu estava os sequestradores exigiram um helicóptero de transporte pra saírem dali. Me levaram a mim e a mais dois reféns com eles até o último andar do prédio, onde o helicóptero nos esperava e subimos com eles. Mas daí a polícia começou disparando e eu me desequilibrei e por pouco não cai do helicóptero que já estava no ar. — Contou e havia uma sombra de terror ao relembrar, que rapidamente se dissipou.

— Entendem agora o porquê do medo ser abordado nesse tema? — Ainden perguntou para as restantes garotas e todas assentiram.

Jackie estava mais relaxada por não terem escolhido o Síndrome de Estocolmo para primeiro tema, mas encarava com pesar Lacey após a declaração sobre o medo dela por água e lamentava por ele ter passado por isso. Ao mesmo tempo lembrava do seu medo, o silêncio, a solidão e a escuridão.

Stockholm [PT/BR]Onde as histórias ganham vida. Descobre agora