capítulo 11

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Uma frialdade rósea me acordou. Alvorado.

Senti a falta do seu calor antes mesmo de abrir os olhos, e descobri que você não estava mais ali.

Senti falta do seu calor. Estendi o braço: o lugar que você ocupara ainda estava morno. Talvez você não tivesse saído há muito tempo. O contorno do seu corpo estava estampado na areia. Passei os dedos pela depressão onde sua cabeça repousara, depois pelos seus ombros largos, suas costas e suas pernas. A areia estava firme e compacta no lugar onde você deitara. Restos de pintura tinham manchado algumas partes dela.

Apertei mais os cobertores no corpo, barrando o gélido frescor da manhã. Mas o dia já estava muito claro. Minhas pálpebras adquiriam uma tonalidade laranja quando eu as fechava. Então me sentei. Estava coberto de areia.

Devia ter ventado durante a noite. Engraçado, eu nem sentira nada.

Espanei a areia. Vi uma linha feita com pedras indo até um trecho de areia mais fofa, alguns metros adiante. Segui as pedras. No final da linha havia algumas palavras escritas na areia.

Saí pra pegar uma cobra. Vejo você depois. Com amor, harry b

Eu me ajoelhei e apaguei o "b". Depois o escrevi de novo. Você não me parecia o tipo de cara que escreveria um "b" na areia, significando um beijo.

Senti um frio no estômago quando pensei no assunto, mas dessa vez não foi de medo.

Fiquei de pé. Meu corpo estava frio e precisava se movimentar. Olhei para a casa, mas não tive vontade de ir até lá. Não ainda.

O que eu realmente precisava era sentir seus braços firmes e quentes de novo em torno de mim. Precisava muito do seu calor.

Abracei a mim mesmo, friccionando os dedos nos braços, para cima e para baixo. Acho que as pessoas são como insetos às vezes, atraídas pelo calor. Uma espécie de ânsia por raios infravermelhos. Meus olhos vasculharam a paisagem, procurando calor humano. De um humano, em particular. Pestanejei e esfreguei os olhos.

Eu estava sendo idiota. Mas não conseguia agir diferente. Eu queria, e ao mesmo tempo não
queria, estar perto de você. Não fazia sentido. Sem realmente pensar no assunto, comecei a caminhar na direção dos Separados.

Parei ao lado da camela. Ela estava sentada e sonolenta. Estendi a mão e a afaguei entre os olhos. Suas pestanas roçaram meu pulso. Eu me sentei ao lado dela, me aconcheguei em sua pele morna e contemplei o nascer do sol, em tons róseos e acinzentados.

A manhã estava perfeita, tranquila. Vindos de muito longe, ouvi os guinchos de um bando de pássaros que chegavam aos Separados para seu banho matinal. Tirei as botas, mergulhei os dedos dos pés na areia e os esfreguei nos grãos. Tentei ficar imóvel por alguns momentos, recostada na camela, observando o amanhecer. Mas queria encontrar você.

Descalço, andando nas pontas dos pés, evitando cuidadosamente as plantas espinhosas e as pedras pontudas, comecei a me dirigir aos Separados. De repente, vi pegadas frescas na areia. As suas. Coloquei o pé dentro de uma delas; seu pé envolveu totalmente o meu.

Suas pegadas contornavam os rochedos. Comecei a fazer o mesmo, lentamente, passando os dedos nas pedras e plantas que me ladeavam. Senti a superfície das rochas passar de lisa para áspera. Toquei os sulcos que havia na superfície de uma delas. Eram as marcas de um antigo riacho. Um pássaro preto grasnou para mim do alto de uma árvore; um aviso áspero, que quebrou o silêncio. Talvez ele estivesse alertando os companheiros sobre a minha
presença, um desastrado ser humano entrando aos tropeços em seu território.

Caminhei até me deparar com um ressalto rochoso que se projetava dos Separados. Não consegui enxergar o que havia no outro lado. Mas vi uma série de pedras grandes e lisas que subiam por sua extremidade, formando um caminho que parecia contorná- lo. Apoiei o braço no paredão lateral, para obter equilíbrio, comecei a pular de uma pedra para outra.

Stolen (L.S Version)Where stories live. Discover now