23 - Uma brisa da esperança

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[Música do capítulo: Starset - Everglow]

Daryl Ulric

Esse foi o preço da imortalidade: lembrar-se de tudo quando o que você quer mais fazer é esquecer.

Por um lado eu não perderia mais meus familiares, por outro eu reviveria todos os dias os meus maiores pesadelos dentro da minha cabeça.

Conclusão: Nem sempre eu fui um vampiro frio e mal.

Bucareste  - Transilvânia, 1964

O ano era novo, e com ele, boas novas vinham juntos.

Eu agora tenho 22 anos, casado com Annie, uma prima distante. Ela foi um dos múltiplos desejos da minha mãe para que eu possa continuar como sucessor da família de maneira legítima e tranquila.

Annie não foi uma escolha, e sim uma obrigação. Um ano após o nosso casamento, ela ficou grávida e neste ano novo meu filho virá saudável e forte.

Marrie, era ela. Minha filha, minha pequena, um pedaço de mim que amarei até a morte.

Marrie tinha os olhos da mãe e poucos fios loiros no topo da sua pequena cabeça. Eu nunca vi algo mais adorável que isso.

O momento em que ela segurou meu dedo indicador firmemente foi o suficiente para eu agradecer todos os dias por ter me casado com Annie — mesmo que fosse uma obrigação.

O tempo foi passando e Marrie foi crescendo. Ela já podia dar seus primeiros passos, soltar gargalhadas e exibir seus dentinhos novos e branquinhos. Os cachinhos loiros caiam gentilmente pela sua testa, as vezes tapando seus olhos azuis, mas ela sorria formidavelmente para mim a cada descoberta.

Marrie foi a coisa mais importante e preciosa que eu pude ter, mas nada é para sempre, e nem tudo é justo.

Uma praga tomou conta do pequeno vilarejo que eu e minha família morávamos. Era algo como bruxaria, pois veio do nada e do nada levou toda a vida que se manifestava na cidade.

Os ciganos — que odiavam nosso pequeno vilarejo — diziam ter a cura, e como um último suspiro eu entreguei minha pequena para eles a curarem.

O que eu vi ficou grudado em minha retina: homens virando lobos.

As mulheres e os velhos riam e se divertiam alegando que só aquelas feras ajudariam o vilarejo: matando todos os infectados.

Marrie morreu destroçada em minha frente, me chamando desesperadamente. Aquelas feras fedorentas a levaram de mim.

Um desejo de vingança me tomou, e um ódio interminável surgiu dentro de mim. Eu precisava fazer aquilo, minha alma tinha sede disso.

Eu encontrei alguém que alegava poder me ajudar, mas o preço seria caro. Tudo para poder vingar minha pequena garota de cachinhos loiros.

Todos em minha família aceitavam. Quem não aceitaria? Não adoecer nem perecer de coisas humanas e fúteis. A morte não nos atingiria e viveríamos eternamente.

Eu só queria os poderes que aquilo poderia me proporcionar. Eu cego pela vingança fiz minha família cair em desgraça, mas eles iriam morrer pela peste. Desespero.

Foi aí que eu conheci Margô. Ela possuía poderes medonhos que transformavam os homens que conviviam com ela. Eu a matei, ou pelo menos pensei que tinha matado — ela e os idiotas que apoiaram aquela loucura.

Vinguei a todos naquele vilarejo. A doença se foi e o lugar cresceu. O nome Ulric ficou gravado como salvadores, mas, a guerra não acaba aí.

A minha pequena Marrie, hoje vejo que deveria ir com você. A eternidade só me trouxe dor e agonia e também o desespero.

...Dias atuais

Eu estava sentado na cama revendo toda a cena na minha mente. Dos meus olhos brotavam pequenas lágrimas que escorregavam pelo meu rosto.

Sou arrancado do meu pesadelo com a ratinha me chamando e passando uma toalha em meus cabelos.

— Mesmo você não ficando resfriado, deve secar os cabelos sempre que lavá-los.

Eu sabia que ela estava sendo gentil comigo por que estava com pena. Apesar de não saber da história, ela desconfia de quem Marrie foi para mim.

Para esta criança que ajudei a vir para o mundo, eu quero dar a ela tudo o que não pude dar a minha Marrie. Ela será uma brisa leve em meio ao meu tormento. Seu sorriso arrancará de mim as lágrimas que eu possa ter momentaneamente.

— Por que está fazendo isso? — eu pergunto para ela sentindo sua mão pentear meus fios de uma maneira gentil.

— Temos nossas diferenças, mas isso não quer dizer que não posso ajudá-lo. Não pense que estou perdoando o que você me fez, pois isso eu nunca vou fazer. Seja quem você for, ou o que passou que acabou te deixando assim, irei devolver com minha bondade e compaixão. Nada de vingança, nada de ódio.

Meu peito teve a sensação de ser preenchido logo que ela fechou os lábios. Eu ouvi sua respiração acelerada e aquilo me incentivou de uma maneira que eu não posso medir em palavras.

Eu me virei para ela e a encarei. Aqueles olhos verdes que queimavam minha pele, ela e somente ela podia me queimar assim.

— Por que não revidar? Agora você pode. — eu disse com uma voz grave e baixa.

Ela sentou-se sobre seus tornozelos e pôs as mãos em cima da coxa.

— Você não morre. Terei muito tempo para atormentar você. — ela diz olhando para as unhas — Então quando você precisar de mim, eu estarei aqui para lhe abraçar, e depois jogarei tudo na sua cara. Tirarei fotos de você chorando no meu colo, descabelado e desesperado e farei um mural para exibir para todo mundo assim que você me chatear. Está bom assim? — ela ri calorosamente enquanto seus olhos verdes com um leve tom amendoado se fecham com o levantar de suas bochechas.

Eu não resisti e meus lábios tocaram os dela de uma maneira calma e lenta. Eu pude sentir seus músculos tensionarem e seu sorriso sumir da sua face. Podia sentir também seus olhos abertos me encarando até que desistiram de entender e só se render.

Ela me correspondeu desajeitadamente o que eu achei uma graça. Suas mãos passaram por meus ombros e se apoiaram ali. Pedi passagem para aprofundar mais ainda o beijo e meio receosa ela deixou.

Pude sentir meu coração — a alma — explodir por alguns segundos até que posso ouvir o Enrique se aproximando, e eu tenho que me afastar.

Ela lentamente abre os olhos sem entender e então se assusta com as batidas na porta.

— Sou eu Amy. — ela ruboriza e eu dou uma risada me levantando para abrir a porta para o desnorteado do Enrique que entra sem entender nada.

É maninho, não sei se conseguirei manter o nosso acordo.

Casada com um Vampiro - Livro 01 (Série Universo Ulric) [HIATUS]Where stories live. Discover now