Lucy

54 3 0
                                    

Lucy ainda se lembrava dos dias bons antes da guerra, dias quando ela e suas irmãs podiam sair brincar na rua, elas ficavam até tarde brincando, até que sua mãe ou seu pai as chamavam para jantar. Agora tudo é diferente, Rosa é quem as chama para o jantar, os dias passam e ela nem percebe, apenas quando seus pais retornam para visita-las, é que ela se dá conta de que já se passaram duas semanas. Seu pai Marco é braço direito do homem que é chefe de todos, sua mãe é a chefe de todas as mulheres que cuidam dos homens que trabalham com seu pai, sua mãe não gosta muito de comentar sobre o que ela faz, ela sempre diz "isso não é um assunto para alguém tão jovem querer saber". Os dias continuavam a passar, hoje o dia estava absurdamente monótono, Cassandra estava brincando e acabou se machucando, tudo seria mais fácil se isso acontecesse com Marina ou Olivia, Marina é muito durona, nunca chora e nunca sente dor, ela é bastante estressada, ela fica ainda pior quando Cassandra se machuca, porque na opinião de Marina, tudo isso que Cassandra faz é um jeito de chamar atenção pela ausência dos pais.

Lucy foi correndo onde Cassandra estava, lá ela encontrou Olivia em prantos tentando fazer algo, Cassandra chorando por seu joelho ralado e Marina de braços cruzados olhando toda aquela situação de uma forma até que prazerosa.

— Calma, vai ficar tudo bem, antes de você ter o meu tamanho isso tudo não vai passar de uma lembrança, e aqui — Lucy enxuga o sangue com a barra de sua saia — só vai restar uma cicatriz, pra lembrar o quanto esse dia foi legal.

— Mas dói muito — diz Cassandra em meio as lágrimas.

— Vocês deviam parar de passar a mão na cabeça dela, ela já tem quase a nossa idade, já está na hora dela crescer — diz Marina raivosa.

Lucy percebe o olhar de Olivia para Marina, ela sabe que dali sairá uma briga, e provavelmente Rosa terá que vir correndo para separar as duas. E de fato a discussão começou, Olivia se levanta já apontando o dedo na cara de Marina.

— Nós faríamos o mesmo por você! — Grita Olivia.

— Mas eu nunca precisei, e nunca vou precisar da sua ajuda, isso é ridículo, vocês a tratam como uma criança... — Também grita Marina.

— Você sabe que isso não é justo, nós tivemos muito mais tempo com o papai e a mamãe do que elas, você não tem noção do quão difícil deve ser... — disse Olivia.

— Eu não sei se você sabe, mas eles também são os meus pais e eu também sinto falta deles igual a ela, mas eu não fico me fazendo de vítima nem chamando atenção! — Disse Marina

— Isso por quê somos mais velhas Marina, nós temos outra visão de mundo! — Explica Olivia

Nesse momento Lucy fez a única coisa que sabia que faria com que as duas ficassem quietas, e não era chamar Rosa, ela começou a cantar um trecho de uma canção, que a mãe sempre cantava para elas depois do jantar, era um trecho de uma música muito antiga, Lucy não sabia nem o nome, apenas a letra.

Lucy lembrava de quando seu pai ainda trabalhava com cavalos e sua mãe no hospital da cidade, quando eles chegavam do trabalho cansados já começavam fazer o jantar, Lucy e suas irmãs chegavam da escola quase no mesmo horário que os pais chegavam do trabalho, o jantar era feito por todos de uma forma muito divertida, depois do jantar seu pai deitava no tapete da sala, para brincar com as meninas, enquanto a mãe ia para o quarto por um tempo, quando voltava começava a cantar várias canções. Essa era sempre a última, era a música aviso, pois todas sabiam que quando a música acabasse todas deveriam ir dormir, a voz de sua mãe era angelical, mas sempre que Lucy tentava cantar, todos a sua volta paravam o que estavam fazendo para ouvi-la. Foi o que ela fez dessa vez, começou a cantar como se não houvesse mais ninguém ali.

Filhas da PerdiçãoOnde as histórias ganham vida. Descobre agora