J A N E I R O

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L O U I S

As férias de inverno pareciam que não iam terminar nunca. Eu dormia até tarde e ficava em casa o dia todo, de chinelos. O resto do mundo estava trabalhando, produzindo, mas eu não tinha nada para fazer. Joguei 6 milhões de partidas de campo minado, o que é... Pois é, nem eu sei. É claro que existem jogos melhores. Mas não consegui me concentrar em nada que envolvesse mais de uma fase ou qualquer tipo de estratégia complexa. Foi muito cansativo ficar em casa. O Natal no Caribe acabou comigo. Ter que sorrir o tempo todo, conversar sobre a faculdade, os meus amigos, os meus interesses, e nunca falar de Harry ou da padaria, de Nate ou das fotos. Guardar segredos é exaustivo. E quando toda a nossa vida se transforma em um segredo?

Contei ao meu pai sobre o rúgbi. Ele não gostou da ideia de eu praticar um esporte de contato.

– Você deveria jogar golfe.

– Eu detesto golfe.

– Qual é o problema do golfe?

Isso me faz pensar em Harry, em seu trabalho de caddie. Ele deve saber quando se deve usar um taco ferro nove ou um sand wedge. Deve ter opiniões sobre tacos e usar uniforme – talvez uma camisa polo impecável com uma bermuda cáqui. Deve ficar muito diferente. Passei muito tempo olhando para o Google Maps, procurando campos de golfe no Oregon, tentando adivinhar em qual ele trabalhava. Minhas notas chegaram. Dois A, dois A-. Meu pai as prendeu na porta da geladeira. Ele perguntou se eu encontraria com Nate, e quando eu lembrei a ele que havíamos terminado, ele disse: Vocês eram amigos antes de saírem juntos.

Talvez seja melhor não derrubar essa ponte. É óbvio que eu não liguei para Nate. Em vez disso, tirei um cochilo de quatro horas. No ano-novo, papai me levou para jantar e fez um auê por ter me deixado beber uma taça de champanhe. Na manhã seguinte, me emprestou o cartão de crédito para eu comprar "alguma coisa legal" para mim. Porque eu tirei boas notas. Porque ele estava muito orgulhoso de mim. Quando apareci com o casaco de caxemira que comprei no shopping – da cor dos olhos de Harry –, ele simplesmente me deu um beijo na testa, fez um carinho no meu ombro e me deixou sozinha vendo filmes de má qualidade no escritório.

À noite, bem depois que papai já tinha ido dormir, eu ficava deitado na frente da TV ligada esperando Harry ligar. Eu apagava algumas vezes. Estava tão cansado...

Mas quando o telefone tocava eu acordava. Dava risada. Sentia desejo. Sentia saudade. Ficava com o corpo em chamas, mordia os lábios, sussurrava palavras que nunca imaginei ser capaz de falar. Quero você. Preciso de você dentro de mim. Meu Deus, Harry. Ele me dizia coisas que queria que eu falasse. Sacanagens que de alguma forma não eram sacanagem para ele, eram apenas verdade. Eram reais. Ele pedia que eu falasse e eu falava. Qualquer coisa que ele quisesse. Mas havia palavras que eu não dizia.

Estou com saudade.

Eu te amo.

Devo ter pensado que haveria tempo para isso depois. Após as férias, quando voltássemos a nos ver, seríamos diferentes. Estaríamos próximos – tão próximos quanto ficávamos pelo telefone. Seríamos reais. Eu ainda não havia aprendido que, quando toda a nossa vida é um fingimento, a realidade não é algo que aconteça conosco. Quando nos cercamos de mentiras, todas as coisas verdadeiras começam a se decompor. Uma hora depois de ter chegado a Putnam, decido ir até o apartamento de Harry. Não consigo evitar. Preciso vê-lo.

Queria ter ido buscá-lo no aeroporto ontem à noite, mas ele deixou o carro em Des Moines e ia chegar tarde. Então acompanhei o voo, vi quando chegou a Ankeny, a apenas vinte minutos de mim. Imaginei Harry dirigindo sozinho para Putnam, no escuro. Hoje de manhã, eu havia prometido ao meu pai que ficaria para almoçar depois que minha irmã e eu fôssemos à loja de noivas para pegar o meu vestido. Charlotte não parou de me perguntar sobre minha vida amorosa, querendo saber se eu já havia esquecido Nate.

ProfundoWhere stories live. Discover now