NÓS OU ELES

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Quando Joan era menor ela se esgueirava pela área agrícola da arca para surrupiar algumas folhas e frutos, lá sentia o cheiro da terra recém regada, a fragrância que exalavam as frutas cítricas ao amadurecer, a mistura do aroma de hortelã com as flores de morangueira... sentia-se mais próxima da felicidade toda vez que entrava na estufa, era aconchegante estar junto da mãe natureza e ela nunca se sentiu mais abraçada do que neste momento, cercada pelas árvores altas e o céu azul infinito sob sua cabeça.

— Bem-vinda ao lar... — Sussurrou, sua cabeça jogada para trás, seus olhos fechados para melhor apreciar a sensação doce de preencher seus pulmões com o ar puro da Terra. O toque do sol gentil sobre sua pele pálida.

Apesar de tudo que teve de passar, ela se sentia feliz.

Parecia, contudo, um pouco injusto. Todos aqueles que possuíam o real mérito de eles conseguirem descer ainda estavam no espaço, ou então nos céus...

Ela não podia evitar pensar em Amanda, em sua teoria e na sua tentativa falha de fugir da arca. Se tivesse esperado alguns anos mais, talvez pusesse seus pés da Terra e cumpriria seu sonho de qualquer maneira, e assim, quem sabe, Joan ainda teria alguém para chamar de mãe.

— Parece que ela estava certa afinal — A voz áspera grave e o estalar de gravetos secos no solo, fizeram Joan olhar sobre seu ombro. Atrás dela o falso guarda se aproximava com um sorriso discreto no rosto e suas mãos na cintura, onde sua arma ainda descansava. Joan se manteve atenta, evitando demonstrar qualquer emoção para o rapaz.

— Quem?

— Sua mãe. Sobre sobrevivermos na Terra. — Ele explicou com um sorriso satisfeito no rosto, aproximando-se ainda mais dela em passos cautelosos, parando apenas quando chegou ao seu lado, seus ombros milímetros de se tocarem.

Joan não gostou nem um pouco disso.

O impostor estava fazendo uso do apego emocional que ela demonstrou na nave para tentar se aproximar dela. Usava a admiração por sua mãe como uma vantagem para ele. Não o permitiria disseminar sua imagem corrupta com palavras amigáveis, Joan tinha demasiada suspeitas em cima do intruso e não deixaria sua guarda abaixar a seu respeito até descobrir toda a verdade sobre quem é e como chegou ali.

— Ela deve ser uma mulher muito... — Bellamy continuou a falar, sem pensar muito no silêncio vindo da parte da garota.

— Ela está morta — Joan o cortou rápida e precisamente, virando-se para ele. — E eu nunca a conheci.

O impostor perdeu seu sorriso, engolindo seco antes de pôr-se de frente para ela também, um pouco mais retraído. Não sabia bem como interpretar seu comportamento, parecia irritada, enquanto suas palavras deveriam soar como pesar.

— Sinto mui...

— Escuta aqui... Bellamy, não é? — Ela estalou a lingua ao cuspir as palavras, e ainda mais intrigado com seu jeito, ele assentiu, cruzando os braços sobre seu peito.

Joan deu mais um passo na direção do impostor, não sobrando muito espaço entre eles, seus corpos tensos como rochas. A raiva a afetava, sua respiração ofegante contra a dele, e seu maxilar apertado, rangendo os dentes. As palavras saíram por seus lábios, estáveis e firmes, carregadas de ódio.

— Não é porque fiquei do seu lado na hora de abrir a porta que eu estou do seu lado, ok?

Eles mantiveram a curta distância entre eles, as bochechas dela rosadas com o fervor da raiva e suas sobrancelhas arqueadas sobre seus olhos âmbar chamuscantes. Bellamy não deixou de notar cada detalhe delicado em seus traços finos, as sardas pontilhando seu rosto, os lábios rosados perfeitamente desenhados, o contorno de sua clavícula... Era ridiculamente bonita, mesmo brava.

Redone | Bellamy BlakeWhere stories live. Discover now