INOCENTES E IMPOSTORES

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Antes de abrir seus olhos pesados, Joan buscou livrar-se do cansaço ao respirar fundo, preenchendo seus pulmões ao máximo com o doce aroma do ar terrestre. A consciência sobre seu corpo foi vindo aos poucos durante o ato, o seu estômago estava faminto, a sua costela dolorida, os seus lábios e garganta secos, e seu pulso latejava no ritmo de seus batimentos cardíacos.

A imagem nítida do fogo apareceu em meio a escuridão de seus olhos fechados, seguidas pela sua pulseira destruída, as faíscas azuladas saindo dos circuitos derretidos e, enfim, o rosto do impostor próximo ao seu, com sua mão pesada sobre seu ombro e seu olhar compadecido sobre ela.

"Você não tem escolha no momento, gracinha"

Um nó entalou em sua garganta.

Ela abriu os olhos rapidamente, sentando-se no piso de metal. Por um segundo a superfície gelada e o todo cinza ao seu redor a fizeram pensar que voltara para a arca, mas logo se acalmou ao reconhecer as marcas de parafuso no chão onde os acentos antes ficavam, e a lona cobrindo a passagem de entrada da nave.

Deixando isso de lado, Joan olhou para seu pulso. O ato serviu apenas como uma confirmação ao seu temor, pois a leveza em seu braço comparado a antes era ridiculamente notável. O impostor tinha tirado aquela droga de seu pulso, e no lugar, pôs um trapo sujo de sangue para cobrir o ferimento que o metal quente havia deixado.

Seu coração diminuiu no peito, sabendo o que isso significava. O rosto dócil de seu pai com lágrimas correndo por suas bochechas foi reproduzido em sua mente com grande nitidez, torturando-a um pouco mais do que o necessário. Ele devia pensar que ela estava morta e provavelmente nesse momento, seu pai lutava contra o luto e a culpa de tê-la mandado para a Terra.

Joan fitou o teto ao respirar fundo, contendo as lágrimas de caírem por seus próprios olhos, e então sacudiu as lembranças para fora de sua cabeça, voltando a mirar para o trapo em seu pulso. Será que haviam limpado seus ferimentos antes de colocá-lo ali? Impossível, eles não tinham água, muito menos álcool.

Seus dedos deslizaram sobre o tecido de algodão com cuidado, e a imagem ali escondida embrulhou seu estômago. A marca era fiel ao desenho da grossa pulseira, ela contornava seu pulso em uma mancha escura e uniforme, e algumas bolhas amareladas enrugavam o tecido de sua pele. Na parte de dentro de seu pulso, os pinos de metal que antes penetravam em suas veias, haviam deixado furos em sua carne, e ao redor deles podia-se ver a diferença entre a primeira e a segunda camada de pele, perfeitamente delimitadas em pequenos círculos de pele morta, queimadas pelo calor dos choques.

— Você acordou — Octavia entrou pela porta da nave, afastando a lona com uma mão e segurando um pote improvisado de metal com a outra. — Que bom.

— Ou não, isso vai doer pra caramba. — Charlie se abaixou para passar por baixo da lona que Octavia havia largado, quase brincando para que o pano não a alcançasse ao entrar. Seus olhos sarcásticos deslizaram rapidamente para o pulso ardente de Joan. — Pegamos água, sabe, pra limpar isso daí.

Eu peguei água. — Corrigiu Octavia com um pequeno sorriso convencido em seu rosto, se aproximando de Joan com cautela para não derrubar o líquido no pote em suas mãos. — E infelizmente, não só para você.

A garota perdeu seu sorriso por completo ao ajoelhar-se ao seu lado, seus olhos verdes perdidos mais ao fundo da nave, acesos em uma curta onda de raiva. Seus lábios comprimidos em desgosto também premeditavam o que Joan veria ao se virar, então não foi surpresa nenhuma quando encontrou Murphy desacordado a quase dois metros de distância.

Seus braços não pareciam feridos pelo fogo, por outro lado o seu rosto... Seu olho esquerdo estava inchado a ponto de não poder abrir, e ela chutava que o hematoma estava do mais escuro tom de roxo, porém o sangue seco que cobria boa parte de seu rosto fino a impedia de ver.

Redone | Bellamy BlakeWhere stories live. Discover now