a vida vai melhorar

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27 de dezembro de 2019

Marcos

Acordei com Núbia me chamando e me chacoalhando. Abri os olhos depressa e me levantei num pulo. A garota de ontem, a que nos encarou momentos antes da batalha, estava encostada na parede ao lado da porta. Enquanto ela me encarava, Núbia acordava um por um.

Quando ela chacoalhou Porã violentamente, me lembrei do que havia acontecido na noite anterior. Núbia e Porã discutiram feio, quase saíram na porrada. Lembro de Porã dizendo que era injusto ter que ir atrás da mãe de alguém quando a mãe dela estava morta, lembro de Núbia dizendo que ela veio porque quis e pra controlar o "namoradinho". Porã também chamou Núbia de aproveitadora e disse que ela deveria parar de bancar a mãe de todo mundo. Também soltou a frase "todo mundo aqui já perdeu a mãe, você foi só mais uma, você não é especial por isso", o que, para mim, foi a pior coisa que ela poderia ter dito.

Quando Porã acordou, Núbia saiu de perto dela e voltou para o lado da garota estranha.

- Ela tem uma proposta e quero saber o que vocês acham - disse Núbia.

- Ouvi o pessoal dizendo que iam roubar seus pertences, inclusive seu carro, espancar vocês e deixá-los pelados na estrada - disse a garota. - Decidi ajudar, sabe? Eu já separei um carro pra vocês, mas tenho uma condição: vocês teriam que me deixar ir junto.

- E aí? - perguntou Núbia. - O que acham? Acham que deveríamos confiar nela?

- Ué, agora você quer nossa opinião? - perguntou Porã, com o mais alto nível de deboche na voz. - Finalmente decidiu pedir a opinião das pessoas ao invés de dar ordens?

- Vai tomar no cu, Poranga - disse Núbia surpreendentemente calma.

- É, antes que eu meta a mão na sua cara - disse Dandara agressivamente.

- Gente, que horas são, hein? - perguntou Matheus, ainda sonolento. - E quem é essa menina? Tu não é a doida que tava encarando a gente ontem?

- Eu me chamo Luana, mas pode me chamar de Lua - disse a garota. - Eu nasci nesse grupo maldito e sempre fui tratada mal por todos, inclusive meu irmão. Sabe o guarda negro que levou vocês pro Samuel? Então, meu irmão. Enfim, não gosto de falar de mim... Eu queria ajudar vocês pra que vocês também pudessem me ajudar. Não aguento mais viver nesse inferno e vi em vocês uma oportunidade de escapar daqui.

- Ninguém vai responder que horas são? - perguntou Matheus.

Chequei meu relógio de pulso.

- Quatro e cinquenta e cinco - respondi. - Acredito que seja madrugada.

- E é - Luana confirmou. - Vim esse horário justamente por ser mais seguro. Se partirmos agora, mesmo que só pra dormir no carro, temos uma grande chance de dar tudo certo.

- Eu acho que devemos confiar nela - disse Dandara. - A garota parece ter boas intenções, dá pra ver que ela tá desesperada pra sair desse inferno.

- Concordo - falei.

- Eu também - disse Matheus. - Além do mais, vai ser legal ter mais gente pra conversar, quem sabe ajuda a melhorar o clima...

- Eu não ligo, então o que a maioria decidir tá ótimo - disse Porã, uma pitada de desprezo na voz.

- Então tá decidido - Núbia sorriu. - Vamos logo, peguem as coisas e vamos.

Em silêncio, pegamos nossas mochilas e armas, saímos do complexo, caminhamos até a parte do "açougue" e saímos pelo portão de madeira. Não vimos nenhum guarda durante todo o trajeto.

Verão dos MortosWhere stories live. Discover now