capítulo especial

76 8 30
                                    

NOTA DA AUTORA: Esse é um capítulo especial que se passa um dia antes do apocalipse zumbi (em 1979) e depois mostra o dia do apocalipse, tudo pela perspectiva da Ana Carolina. Você pode pular esse capítulo, já que ele não tem ligação direta com os acontecimentos relacionados à jornada da Núbia, mas é um capítulo que mostra como os pais dela se conheceram e talvez você se interesse por isso. Boa leitura

24 de dezembro de 1979

Ana Carolina

Era onze da manhã e eu já havia terminado meu serviço. Passei todas as roupas do Carlinhos, cuidei de sua alimentação, ajudei-o com os estudos de francês e levei-o para andar de bicicleta.

– Amanhã eu venho depois do almoço, Carlinhos – falei para a criança de nove anos. – Espero que você coma bastante na ceia de natal, ok?

– Ok, Nana – a criança respondeu. – Vou me sentir sozinho amanhã de manhã.

– Mas você tem sua mãe e seu pai – tentei consolá-lo.

– Você sabe que eles não ligam pra mim – ele respondeu cabisbaixo. – Se você fosse mais branquinha, poderia ser minha irmã mais velha.

– Que história é essa de irmã mais velha? – dona Adelaide, mãe de Carlinhos, perguntou exaltada ao entrar no quarto da criança. – Essa negrinha é sua babá, uma empregada e nada mais. Não confunda as coisas, Carlinhos!

A mulher saiu do quarto e fez sinal para que eu a acompanhasse. Fui atrás dela, andamos até a sala de estar e ela apontou para a poltrona. Sentei, já imaginando a merda que sairia da boca dessa senhora.

­– Que tipo de coisa você fica dizendo pro meu filho? – ela perguntou, quase gritando. – Você sabe que isso não é saudável.

– Com todo respeito, dona Adelaide – falei em tom baixo. – Eu não tenho culpa de passar mais tempo com seu filho do que a senhora. Ele é novinho, por isso acabou se confundindo, mas pode ficar tranquila que eu não vou deixar isso se repetir.

– Negrinha insolente! – Adelaide gritou e me deu um tapa no rosto. – Você não tem outro emprego à tarde? Pode ir. Nos vemos amanhã de manhã.

– Amanhã eu só venho à tarde – falei me levantando.

– Você vem no horário que eu quiser! Eu sou a patroa, você é a empregada, então deve fazer o que eu mandar!

– Mas eu já havia combinado com seu marido que viria à tarde porque quero passar o natal com minhas amigas, dona Adelaide. Pode confirmar com o senhor Mário.

– Tudo bem, Ana Carolina, você pode vir mais tarde, mas eu vou descontar do seu salário. Até amanhã. E é melhor você não vir de cabelo solto de novo.

Adelaide voltou para o quarto de Carlinhos. Fui até a cozinha para pegar minha bolsa e dar tchau para Simone.

– Ela vai descontar do seu salário? – Simone perguntou. – Típico dessa nojenta.

– Pois é – respondi cabisbaixa. – Veja pelo lado bom, pelo menos eu só sou a babá.

– Sortuda – Simone riu. – Eu vou ter que ficar aqui até tarde pra fazer essa ceia ridícula. Nem sei se vou conseguir voltar pra casa.

– Espero que consiga – falei enquanto abraçava Simone. – Boa sorte, minha amiga, e feliz natal.

– Tsc, feliz natal – ela desdenhou. – Feliz pra quem?

– Pra sua patroa – gargalhei. – Tchau.

– Tchau, querida.

Saí do casarão e desejei feliz natal para a professora de francês que estava chegando.

Verão dos MortosWhere stories live. Discover now