Capítulo 04: Pintura Íntima

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CAPÍTULO 04 – Pintura ÍntimaDELILAH DANVERS

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CAPÍTULO 04 – Pintura Íntima
DELILAH DANVERS

Eu conheci Lisa Castillo na faculdade. Ela fazia o curso de Artes Plásticas e eu, Jornalismo. Acredito que Lisa sempre tenha sido a melhor aluna de sua classe. Suas pinturas eram tão caprichadas e inspiradoras quanto as bem reconhecidas na indústria cultural.

Eu gostava de pensar que a sensação de vê-la com pincéis e tintas em frente a uma tela era a mesma sensação que as pessoas geralmente têm quando voltam para casa depois de muito tempo fora. Só soa revigorante. Não sei. Lisa realmente se dedicava para as coisas que prezava. Era bonito. Lisa era única.

Lembro-me do dia em que Lauren apresentou Lisa para o nosso grupo de amigos. Lembro-me de Joshua resmungar sobre como nós não deveríamos confiar em gente nova. Lembro-me de Miles e eu termos conversado sobre como Lisa nos parecia tão quieta, mas com tantas coisas a dizer.

Já não sei se isso importa.

— França é tão bonita — Devon comentou.

22 de Setembro. As meninas estavam no quarto de Lisa. Ela dividia a suíte de hotel com o namorado, Joshua. Lisa e Josh formavam um casal bonito, até começarem a discutir. Eles não sabiam lidar com as diferenças, é a ideia que eu adotei. Josh às vezes aparentava ter um bom caráter e Lisa sempre e verdadeiramente teve. Poderia ser mais complicado.

— Não é lindo? Papai já me trouxe aqui duas vezes — Camille contou, amarrando os cabelos escuros em um penteado. — Mas fomos à Paris, eu nunca vim à Cannes.

Lauren a encarou.

— Meu pai também ia me levar para Paris nas férias passadas, mas ele não teve tempo suficiente de organizar — disse.

Lauren era assim.

— Ainda têm muitos lugares que eu gostaria de visitar — Camille prosseguiu, sem responder Lauren. Sequer sei se a ouviu. — Aqui em Cannes mesmo.

— Eu queria muito ir ao Vieux Port, aquela marina famosa — manifestou Lisa, do canto do quarto, enquanto rabiscava em uma tela sentada no chão, com o quadro apoiado entre suas coxas pálidas. — Parece bonito.

— Eu não conheço nenhum desses lugares — Devon gargalhou sozinha. — Para mim, até passar o dia no hotel já está de bom tamanho.

Lisa continuou com os rascunhos na pintura. Eu estava distante e sem as lentes, não conseguia enxergar o que estava desenhando. Ela gostava de pintar tudo. Qualquer coisa mesmo. Desde paisagens detalhadas até caricaturas. Mas todas pareciam seguir um padrão de paleta de cores, ou talvez só fosse coisa da minha cabeça. No mais, era de se admirar.

— Delilah está tão quieta — Lauren estreitou os olhos de mel em minha direção. — Ficou doente, com certeza.

Não absorvi muito da conversa. Estava quieta porque estava pensando. Eram poucas as vezes em que eu me acomodava no silêncio.

— Eu programei um lugar para todos nós irmos — anunciei. Talvez tivesse sido melhor ter mantido a língua calma. Lisa enfim tirou os olhos do quadro e os levou até mim. — Boulevard de la Croisete — pronunciei do meu jeito. As aulas de francês do papai foram pagas à toa.

— É uma avenida, não? — ela esboçou um sorriso. — Pesquisei tudo antes de vir.

— E o que tem para fazer lá? — Camille se apressou.

— É, é uma avenida. Deve ter de tudo. Mas não interessa, porque eu marquei presença em um salão de festas. Consegui ingressos de graça. Acho que é um baile, talvez uma confraternização, uma festa. Não sei. Parece ser diferente.

O improviso é a chave.

— Por que não nos avisou que marcou presença? — Belmonte voltou a questionar. — Eu teria comprado algo para vestir.

— Eu acabei esquecendo. Mas a Devon já sabia de tudo e comprou máscaras de baile antes de viajarmos. — Não sei se elas não entenderam, ou se entenderam e só não gostaram. Suas expressões não eram boas. Aguardei pela confirmação de Devon para a mentira, que acenou com a cabeça. — O uso é obrigatório.

Lauren se animou bruscamente. Não que fosse raro. Lauren animava-se para quase tudo. Sua voz sussurrava entusiasmo, criando uma sinfonia de antecipação para a noite que acabaria em terror.

— Você tem o convite guardado?

Devon e eu nos entreolhamos.

— Não... não temos convites, a presença é confirmada por lista. Não é necessário apresentar convites.

A ansiedade nos meus olhos era como faíscas de uma fogueira de emoções, alimentando a expectativa do inexplorado que aguardava na iminência do baile, onde as máscaras esconderiam não apenas rostos, mas também a pior história que hoje tenho para contar.

— Não sei se máscaras de gala combinam comigo — Camille ficou ali me olhando, talvez esperando que eu dissesse que tudo não passava de uma brincadeira e que não iríamos a baile algum.

— Não precisam combinar. Se você usá-las, ninguém vai saber que é você. — Devon levantou-se do chão, limpando a traseira da calça jeans com as mãos. Eu concordei.

Entre risos e suspiros, discutíamos as máscaras que escolheríamos, cada uma guardando seu segredo por trás da promessa de anonimato.

— Quando é? — questionou Lauren.

Novamente, Devon e eu trocamos olhares, temendo com as possíveis respostas. Ela começou a rir.

— Ah... veja bem...

— Amanhã — Devon me interrompeu.

E aí a Camille começou a entrar em pânico. O tamanho do cabelo ou as unhas do pé dela não estavam do jeito que ela queria, já me esqueci o que era. Lisa não mais parecia nos ouvir, só ver. E só via a moldura em sua frente sendo traçada aos poucos por seus esboços. Minha visão sempre fora fosca, mas recordo-me de enxergar muito detalhadamente tons quentes de laranja.

Acho que foi a última vez em a vi fazer o que amava. A tal sensação já não era mais tão revigorante.

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