04. abortar missão

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Eu nunca tinha pensado antes em estar tão tenso e nervoso a ponto de desmaiar do nada. Na minha vida toda eu sempre nasci preparado para o que der e vier, aprendi assim com as pessoas com que trabalhei, aprendi a me virar sozinho com meus pais, e o mais importante de tudo: duvidar de exatamente todas as pessoas nesse mundo, duvide mesmo até de sua própria sombra.

Tive um desmaio porque, literalmente, me senti como se estivesse nas garras do animal mais feroz de todos, se bem que Jeonghan parecia mais um coelhinho fofo do que uma pantera pronta para me dar o bote. De qualquer modo, aparência não é tudo – aprendi isso no ensino fundamental.

Pelo menos eu não tive um AVC hemorrágico e não fui parar nas mãos de um médico legista, como eu imaginei anteriormente. O problema é que se eu continuasse desmaiando toda a vez em que Jeonghan me olhasse, minha próxima parada seria o necrotério.

Quando eu abri os olhos, a primeira pessoa que vi foi Seungkwan abanando uma revista em meu rosto e me olhando com aquela cara de espanto dele, menos mal, seria pior se eu encontrasse Jeonghan. Mais um desmaio não se encaixaria no meu currículo, se bem que eu também poderia trabalhar de ator com esse desmaio, imagino que deve ter sido bem dramático.

Na verdade, não foi. Eu só não caí como bosta no chão porque meu amigo me segurou, se não, ao invés de dramático seria hilário.

— Tá tudo bem? - Boo perguntou, parando de abanar aquela coisa na minha frente. Já estava me irritando.

— Tá, sim. Desmaiei porque não comi nada o dia inteiro, minha pressão caiu. - Menti.

Óbvio que eu não iria contar a verdade para ele. Imagine, Hong Jisoo, o homem mais bem preparado do mundo desmaiando por causa de um ladrão bonito. Não cairia bem para mim.

— Que bom. Pensei que estava nervoso com a missão. - Ele me conhecia muito bem.

Era praticamente impossível mentir para Boo Seungkwan, ou ele já sabia de toda a verdade antes mesmo de você contar, ou ele descobria depois. Ele sempre descobria tudo.

— Nunca! - Continuei a mentir. — E cadê o Jeonghan? - Perguntei ao sentir falta do homem naquela sala. Por um momento passou pela minha cabeça que ele havia descoberto tudo e fugido pelos cantos como um rato intruso.

— Ah, ele foi pegar uma água pra você.

Três... Dois... Um.

E tudo estava ficando preto novamente. Meus olhos estavam prontos para se fechar quando senti um tapa forte desferido em minha bochecha. Levantei rapidamente com o susto, passando a mão na possível vermelhidão em meu rosto. Seungkwan me deu um tapa para eu não desmaiar novamente, okay, eu acho que nunca tinha feito uma missão tão difícil como essa.

O pior de tudo é que nem começou direito.

— É, eu preciso comer, mesmo. - Proferi, sorrindo sem graça para meu amigo. Eu já odiava o fato de que eu estava praticamente submisso a Yoon Jeonghan, só de ouvir o nome dele, minha pressão caía mais que as ações da Odebrecht em tempos de crise.

— A água que você pediu. - Observei aquele lindo homem loiro se aproximando de nós com uma taça de água em sua mão direita, inclusive, ele tinha uma mão linda.

Ele caminhava até nós da forma mais bonita possível, parecia até que andava em câmera lenta para todos poderem desfrutar por mais tempo de sua beleza incomparável. Meus olhos brilhavam. Eu estava maravilhado ao vê-lo.

— Obrigado. - Seungkwan respondeu, pegando a taça da mão do outro e a estendeu para mim. Pensei até em negar, mas achei tão fofo que Yoon se deu o trabalho de pegar água pra mim.

Eu apenas peguei a taça e bebi logo todo aquele líquido de uma vez, chegou a arder minha garganta, a água estava gelada e com um gosto tão estranho...

"MEU DEUS, ELE COLOCOU VENENO NA MINHA ÁGUA!"

Foi o que eu pensei, mas logo lembrei que água de rico tem esses gostos estranhos, mesmo. Quando inclinei minha cabeça para o lado, pude ver um vidro d'água sobre a bancada onde serviam os drinks.

— Você está bem, rapaz? - Jeonghan me questionou, pendendo sua cabeça para o lado.

"Fingir."

"Se comportar."

"Falar como um homem rico."

Aquelas frases de Seungcheol rodavam em minha mente a todo momento. A tradução de fingir, se comportar e falar como um homem rico é literalmente ser mesquinho. Não me parecia ser tão difícil fazer isso, já que normalmente eu já não sou tão amigável.

— Sim, estou. Eu só não me familiarizei muito com essa água que me deu, isso é água de biqueira? - O respondi da forma mais fria possível, fazendo uma careta quando olhei para a taça – agora vazia.

Jeonghan arregalou seus olhos em espanto. Meu coração cortou alí mesmo.

— O litro dessa água custa quase quatrocentos dólares. - O loiro rebateu, falando baixinho. Ele parecia triste com o que eu falei.

Eu só queria abraçar aquele corpinho dele, me pedir desculpas e mandar ele roubar meu coração.

— Tudo bem, tudo bem. Dessa vez eu deixarei passar. Desculpe, qual seu nome, mesmo?

— Yoon Jeonghan. E o seu?

— Pode me chamar de Joshua. - Sorri de forma amigável. Dei as costas para o loiro apenas para deixar a taça sobre uma mesinha atrás de mim, mas logo voltei para minha posição.

As vezes me pergunto por que Jeonghan dava golpes logo na América? Ele nasceu lá?

Ele nasceu em outro lugar mas foi expulso do país?

Ele era coreano ou americano?

Estou sendo xenofóbico?

Não sei, meu nervosismo sempre me fez pensar besteiras absurdas sobre coisas e pessoas. Se eu falasse tudo o que pensasse, talvez eu estaria morto ou preso hoje em dia. Muita ironia.

— Você é bonito, Joshua. - Ele falou simplista, porém, seus olhos pareciam queimar meu corpo inteiro, e olha que ele só fitou meu rosto.

Eu precisava me segurar de qualquer forma para não ter um possível segundo desmaio no intervalo de uma hora e meia, mas Jeonghan fazia eu me sentir assim. Eu estava lá para o pegar, não para ser a presa do predador faminto.

"Se correr, o bicho pega. Se ficar, o bicho come." – Minha mãe me dizia essa frase, até hoje não sei de onde ela tirou isso.

Porém, eu preferi ficar. De qualquer forma eu já sentia que seria pego, desde o dia em que vi aquela foto dele no quadro branco pela primeira vez.


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