The Lonely Witches

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Ao longo da história sempre existiram bruxos solitários... que moram sozinhos, que trabalham sozinhos e muitas vezes sequer seus familiares sabem que tem um bruxo na família. Talvez seja aquele seu tio esquisito, ou o primo que sua mãe chama de hippie. Muitos bruxos se sentem melhor praticando a arte dessa maneira, acabei por me tornar uma delas.

Aos treze anos, enquanto passava por uma transição religiosa e espiritual, onde questionava os princípios divinos e cristãos, me tornei cética por uns anos até Vera aparecer em minha vida. Vera morava no fim da rua, em sua casa de cercado enferrujado que não escondia um belo jardim, o mais belo jardim que já vi. Havia pequenos ossos pendurados em sua varanda e as crianças da vizinhança tinham medo dela, medo qual era incentivado pelas histórias falsárias que seus pais contavam.

Vera não machucaria uma mosca.

Seus longos cabelos brancos sempre me fascinaram, sempre soltos, na altura de sua lombar, a postura invejável de mais de cinco décadas como bailarina e professora de ballet. No fim de sua meia idade, beirando os sessenta anos, sempre desejei envelhecer como Vera, ser como Vera. Eu também era bailarina naquela época, não era muito boa, mas era o que me mantinha distraída e duas horas a mais longe de casa. Certo dia minha professora havia se adoentado, para minha surpresa, minha vizinha veio substitui-la. A mulher me cumprimentou como uma velha amiga, mesmo tendo apenas me visto pelas redondezas da vizinhança. Ali era apenas o inicio de meu laço com Vera.

Ela não voltou a ensinar nas minhas classes, porém passei a visitá-la com certa frequência, todo fim de tarde, depois da aula ia até sua casa, tomar café ou chá com biscoitos no jardim de trás. Vera me contava suas histórias de quando dançou no ballet de Moscou, me mostrava suas fotos da juventude, sempre a mais alta de sua turma, com seus 1,80 de altura e corpo esguio. Vera havia me ensinado tudo o que hoje sei, sobre a vida e sobre magia, já que ela também era, no fim, uma bruxa solitária.

Hoje sinto saudades de Vera, minha mãe de coração, da qual me defendia com suas unhas e dentes, e deixava eu me esconder em sua casa quando meu pai ficava... estranho... queria ter ouvido mais Vera. Queria ter lhe dado ouvidos quando me alertou sobre os garotos de minha idade quando meu corpo estava mudando, queria ter lhe ouvido quando me alertou sobre ele.


Não queria ter me afastado, mas havia sido o melhor que eu podia fazer, já havia lhe causado muitos problemas. Ainda tinha a última coisa que ela havia me dado, meses antes de eu fugir de casa, uma gatinha com grandes olhos da cor de um cristal de ágata azul, nome qual lhe batizei.

Antes de vir a Noruega, antes de começar a trocar cartas com Lena, saí de Londres para Birmingham para visitá-la. Havia novos moradores em sua casa, não havia mais vida em seu jardim, as cercas de ferro agora eram madeira branca, igual a todas as outras da vizinhança. Os ossos não estavam pendurados na varanda e a forte púrpura das paredes havia dado lugar para um branco gelo. Não havia mais sinal de Vera. Depois de questionar os novos moradores, descobri seu paradeiro.

"Casa Herondale & Kingfisher, enfermagem e especialização em cuidados para pessoa com demência"

- Puta nome longo.

- Como? - Perguntou o homem que só agora notei estar sentado ao meu lado, me olhando intrigado ao que com suas mãos enluvadas por causa do frio daquela tarde, tentava inutilmente tampar os ouvidos do garotinho que estava em seu colo.

- Espero que chegue logo o outono. - Minto, e ele balança a cabeça confirmando e solta um "Ah, sim.", já mais despreocupado que seu filho não havia ouvido um palavrão. Como se ele não fosse falar coisas piores no futuro.

Voltando aos meus pensamentos após a quebra de raciocínio...

Quando encontrei Vera, parecia que parte de si havia evaporado, toda sua vitalidade parecia um fantasma em suas costas. Seus longos cabelos estavam presos em um coque alto, suas roupas coloridas haviam sido substituídas por tons terrosos, que fazia parecer que ela afundaria naquele jardim sem graça a qualquer momento, misturando-se entre os troncos das árvores. Ela me olhou com relutância com seus olhos pálidos, um lado de seu rosto paralisado. Parecia lutar com sua mente para lembrar de meu rosto.

"Sou eu, Vera, não se lembra de mim?"

Ela tocou meu rosto, as mãos enrugadas, tocando as tranças em meus cabelos.

" Você gostou? Eu sempre te disse que queria ter o cabelo longo, agora finalmente tenho. Igual ao seu!"

Seu queixo parecia maior, sua gengiva havia se desgastado, provavelmente usando prótese dentária de má qualidade. Vera voltou a olhar para o jardim, agora me ignorando completamente.

"Eu sei que está brava comigo, tive medo que nunca mais quisesse me ver. Mas escute..." segurei sua mão, que estava apoiada no braço de sua cadeira de balanço. "Irei para a Noruega em alguns meses, lá vou conseguir um bom emprego, já tenho até uma casa! Você iria adorar, fica em Kråkstad, é bem pertinho de Oslo. Tem um bosque ao redor e espaço para um jardim." respiro fundo, procurando alguma reação sua. " Eu quero... quero poder te levar para morar lá comigo, e com Agatha, claro, lembra de Agatha, não é? Ela está bem, mesmo na meia idade em idade de gato, ela ainda brinca muito."

Black Magic Woman (Pelle Ohlin)Where stories live. Discover now