Velhos fantasmas

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O cemitério da cidade não é muito grande, por ser novo de certa forma, há no máximo 340 túmulos sendo a maioria túmulos vazios à espera dos seus respetivos donos, cruzes fincadas para os pobres pouco se tinha pois as lapides eram em maior número, capelas se contavam em uma mão apenas, três pequena capelas no inteiro do cemitério com pequenas varandas para abrigar os familiares do defunto ali enterrado. Constância passa um por um observando, lendo e passando a mão enluvada pelas lapides, no seu rosto um óculos escuro esconde as lágrimas que derrama enquanto vagueia entre os túmulos desconhecidos, alguns com musgo ou relvas, se dirigiu para mais fundo no cemitério até parar em um tumulo de mármore negro muito bem preservado e limpo, nele ela deposita flores azuis e amarelas sobre a placa de ferro que tem cravado o nome ''Marcilio Redentor de Castro'' com uma foto em preto e branco de um homem de meia idade.

- eu sinto tanto a sua falta. Disse sozinha olhando o tumulo negro

- ele também sente sua falta filha. Disse uma voz familiar vindo das costas de Constância, uma voz roca como de uma velha. ela se vira porem não está assustada pois reconhece a voz, sabe de quem pertence.

- não me assombre velha desgraçada, já está morte pela graça e deus agora parta. Constância se irrita com Guiomar.

- nos duas sabemos que há muitas maneiras de ficar preso a essa lado, não pretendo fazer a passagem sem antes levar você comigo, nossa família nos espera. Guiomar é sarcástica e perspicaz, a marca dos Mazini.

- pois trate de arrumar um assento, vai se cansar em pé.

- você me matou, sei disso, me matou porque sabia que iriamos fazer o ritual, o ritual de reencarnação, impediu que nosso deus volta-se dos mortos, você interferiu no progresso da humanidade. Guiomar se aproxima mais e mais de Constância que se afasta mais e mais dela.

- o que há de progresso em um homem com cabeça de boi sua velha estúpida, eu te matei pra me livrar de você e suas ameaças, estava cansada das suas extorsões. Constância se altera furiosamente.

- você vai pagar por isso Constância, eu juro.

- não pode fazer nada contra mim, você morreu e como um fantasma não pode fazer nada.

- eu tenho irmãs que virão de terras distantes vingar minha morte, fica sabendo disso, você irá morrer.

Constância deu as costas para Guiomar e saio do cemitério sem olhar para trás, colocou sua bolsa de ombro em outro braços e seguiu caminho fora do cemitério subindo uma rua e virando na outra e depois na outra até sair no centro da cidade onde parou em um bar para descansar as penas e beber algo. Pediu ao homem de trás do balcão um copo de gin rosa com gelo e limão e uma carteira de cigarro ''Luckiff'' que tem um gosto de mel e nozes, um cigarro atípico na Europa e em países frios do hemisfério norte porém o homem informou não ter tal cigarro e ofereceu a ela tabaco, ''pode ficar com essa porcaria pra você'' disse Constância em seus pensamentos ao receber tabaco do homem de trás do balcão. Ele vendo a formosura que é Constância começou a puxar assunto.

- a senhora anda muito bela dona Constância, a muito tempo não há vejo pelo centro da cidade.

- não nenhuma desocupada pra ficar perambulando por ai sem ter o que fazer. Constância toma uma dose do seu Gin.

- nossa mais que feroz, parece que a irritei.

- você não tem essa capacidade.

Seu descansou durou pouco no bar, aquele lugar a repudiava e quis sair de lá o mais de pressa possível, tomando sua gin e partindo em viagem de volta ao hotel. No caminho para lá ela observa a cidade que está muito diferente, antes onde haveria casas de madeira e bodegas hoje se encontra uma galeria de lojas e prédios de dois andares, a vegetação só há nas margens da clico via estreita que passa pelo meio da avenida onde estaria anteriormente linhas amarelas de divisão e tartarugas de estradas. O chegar no hotel ela encontra dona Edna hospedando uma mulher que acabou de chegar na cidade de longos cabelos negros e olhos verdes que se registrou no Hotel como Aurora Pinheiros.

- seja bem vinda querida, sou Constância Mazini, a proprietária. Ela estende sua mão para cumprimenta-la.

- prazer em conhece-la, seu hotel é muito bonito, eu adorei.

- que gentil da sua parte mas tenho que concordar, tenho um bom gosto para decorações.

Após gracejos com Constância a moça subiu ao seu quarto, o cravo preso em seu cabelo chamou a atenção de Edna e Constância. '' Ela é muito bonita, será que é uma atriz? '' perguntou Edna porem não obteve respostas de sua patroa, Constância se dirigiu para a cozinha trancando a porta para que ninguém entra-se, seguiu para o armário de vassouras e atravessou a porta escondida que leva direto ao porão do Hotel, lá ela encontra Romano de cueca deitado de peito pra cima em seu colchão.

- Romano, vista-se precisamos conversar. Constância puxa o pequeno banquinho próximo a mesa para se sentar.

- aqui está muito quente, vou ficar assim mesmo, diga o que quer. Romano também se levantou e se dirigiu a outro banco próximo a mesa.

Constância começa a olhar para Romano com ternura, lágrimas finas caem de seus olhos e seu sorriso está alargado mas não de felicidade, mas sim de outro sentimento indefinido.
- sabe, você foi a melhor coisa que me aconteceu nessa vida, sempre te amei desde o dia em que soube que estava gravida, seu pai ficou tão feliz que deu uma festa, mal sabia ele que seria seu último momento.

- você o amava mamãe?. A pergunta foi como dúvida mas na verdade é uma curiosidade pessoal.

- sim, eu o amei demais, Marcilio era um homem exemplar, era gentil comigo e sempre me cortejava com flores e doces beijos, todos os dias ele me conquistava como se fosse na primeira vez.

Romano ficou pensativo, ele nunca viu o pai pois havia morrido antes do seu nascimento e ver a mãe falar dele lhe trouxe um pouco de desconforto. Ele olha os olhos verde musgo da mãe coberto de lágrimas e pergunta.

- porque ninguém me ama mamãe?. A pergunta foi tão pesada em dizer que não pode impedir que seus olhos ficassem marejados.

- Romano, não pensei assim, eu amo você. Ela se aproxima dele preocupa com a reação do filho.

- porque ninguém nunca me deu flores ou quis me beijar?

- porque você é um menino Romano, e são as meninas que ganham flores, vejo que está angustiado, porque ?. Constância não entende Romano e isso fica explicito em seu rosto.

- por nada.

Romano se afasta da mãe e volta a deitar no seu colchão abraçando a almofada com força, Constância vê esse comportamento e se preocupa, algo está errado com ele mas não sabe o que é, não faz o menor sentindo ele ter essa atitude, sempre foi sozinho, sempre esteve preso a aba da sai da mãe, nunca gostou de ninguém, porque isso agora. ''será que está apaixonado'' pensou Constância e tal pensamento a fez arrepiar, um súbito calafrio a tomou e a sombra da escuridão do porão tomou forma rodando a luz acima dela. Ela se abaixa e deita na cama de Romano, o puxa para perto e o abraça.

- durma meu pequeno, e esqueça suas dores, mamãe está aqui.

Nessa mesma tarde algo terrível acontece deixando a população de Nova Califórnia espantados, o jornal da cidade no dia seguinte divulgou a seguinte manchete:

''ASSASSINO EM SÉRIE?....o corpo de uma jovem de dezenove anos foi encontrado nesse sábado no lixão da cidade, mais um corpo com as mesma caraterísticas de outro corpo encontrado na beira da estrada na segunda-feira da semana passada, acredita-se que isso seja a retaliação dos índios que viviam nesse região e querem reclamar seu terreno, entretanto a polícia da cidade capturou uma criatura asquerosa que acredita ser o responsável pelo crime, pois foi pego próximo ao local do crime com suas roupas e mãos manchadas de sangue...''

Vermelho ViolaçãoWhere stories live. Discover now