1: (re)encontrar

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Comentem bastante e não esqueçam da

Tag: #ConfienaCamomila

Boa leitura! 🧡

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Fevereiro/2009

  Yoongi nunca tinha provado um sorvete de baunilha tão amargo na sua vida. A massa açucarada derretia em sua boca cheia de saliva, o açúcar se dissolvia e ele nem conseguia sentir uma misera parte do gosto. Só sentia a sensação úmida e incômoda das lágrimas descendo por seu rosto, inundando sua pele clara. Colocou mais um pouco do sorvete na boca, mas não sentia nem mesmo o gelo do doce tocar sua língua dormente. Havia chorado tanto que nenhum membro de seu corpo funcionava direito, anestesiado por causa da dor insuportável que sentia naquela manhã gélida, que arrepiava seu corpo pequeno.

  Seu coração estava aos cacos, completamente quebrado. Podia ele, um adolescente de quase dezessete anos, sentir tamanha tristeza no que diziam ser o melhor momento de sua vida? E ainda mais, por causa de alguém? Yoongi martirizava a si mesmo por deixar-se sentir tanto por alguém que o havia abandonado, esquecido que ele era um simples ser humano, deixado ele com a mão suja de sorvete de baunilha derretido porque não conseguia parar de chorar para comer.

  Ele soluçava no meio da praça coberta pelas nuvens cinzentas do céu. O casaco de lã grossa que usava era mais gelado que uma camada de gelo em seu corpo. Era o casaco dele. Tão gelado que ele não conseguia tirar, havia grudado em seu corpo e se recusava a sair.

  Yoongi voltou a pôr o sorvete na boca. Não tinha gosto. Era diferente de quando ele comia na primavera, sentado exatamente no mesmo lugar, observando os pequenos pássaros transitarem pelo gramado da praça central. A paisagem, antes coberta pela doce luz do sol, estava fria, cinza, as cores vivas estavam enfraquecidas, apagadas. No mesmo banco, onde antes conversava com ele, trocavam suas poucas histórias de vida e tinham tempo para se apaixonar, Yoongi subiu as pernas no assento até abraçar seus joelhos com uma mão.

  Havia passado por uma experiência tão dolorosa que nem sabia como estava ali. Doía, quebrava e partia seu peito ao meio. A sensação escorria por seu corpo como o ácido mais forte, o machucava, queimava. Yoongi sentia a dor como nunca a sentiu. Era a primeira vez que passava por aquilo. E era pior do que ele lia em livros. Seu imaginário nunca chegou perto das mil agulhas que se afundavam em seu coração naquele instante.

  Nem mesmo seu sorvete favorito pode o alegrar. Era inverno, mas ele estava ali a tanto tempo que o sorvete tinha começado a derreter. Yoongi moveu o braço para frente, para impedir que algumas gotas manchassem sua calça. A bola branca acabou caindo no concreto, sobrando só a casquinha.

  Os soluços, que antes haviam diminuído, voltaram rasgando sua garganta com força intensa, ele tentava segurá-los, mas seu peito doía quando o fazia. Eram dez horas de uma manhã fria de fevereiro, horário que um garoto do ensino médio chorava na praça de uma cidade da Coréia do Sul por causa de um sorvete caído. Algumas pessoas passavam por ele e o olhavam com pena, outras nem ligavam. Yoongi mal as via passar, derrubou a casquinha e colocou a mão na boca para abafar seu choro. 

   Havia fugido do colégio e de seus pais. Yoongi deveria ter ido com eles, só que sua casa era pequena e sua mãe o ouviria chorar e tentaria conversar com ele. Preferia ficar sozinho por algumas horas, se permitir liberar o que estava afogando-o, para depois enfrentar seus pais preocupados. Ele não os culpava, agradecia pelo cuidado e carinho, mas precisava se acalmar sozinho antes.

  O pranto acalmou-se, não passava de poucas lágrimas que desciam pelo seu rosto inchado. As pálpebras doíam, era difícil abri-las. Arrastou a mão pelos olhos para limpá-los, depois pelo nariz. Limpou-a na calça azul do uniforme e depois colocou em cima do joelho. Agora, somente seu coração ardia dolorosamente, como uma queimadura recém feita por acidente, que doia mesmo tendo tomado cuidado para não se ferir com a superfície perigosa.
  
   Respirou devagar, com dificuldade pelo nariz entupido. O cansaço o abateu, seu corpo amoleceu e ele enfiou a cabeça entre os joelhos. Apertou as mangas da blusa marrom, desejando que fosse outra coisa no lugar do tecido o cobrindo: uma pele suave, lisa, quente. Depois repreendeu-se por aquele desejo que o deixaria pior ainda.

Confie na Gata [Yoonseok]Where stories live. Discover now