Vicente não gosta de tomate

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Aquela era provavelmente a primeira sexta à noite que Jonathan não estava morrendo de ódio por estar sentado à mesa com seus vizinhos, ouvindo seus pais conversarem sobre assuntos desinteressantes e chatos. Vicente estava sentado à sua frente catando os tomates para fora da comida e os empilhando em um canto do prato, aparentemente não gostava de comê-los. Por algum motivo, ele tinha feito aquela nota mental "Vicente não gosta de tomate". Era a primeira vez que prestava atenção nele, nos demais jantares tinha sido como alguém que nem sequer existia ali ou apenas estava presente para irritá-lo.

As coisas tinham realmente mudado.

Ele estava perdido pensando em tomates quando seu pai disse algo que atraiu a sua atenção.

— Vicente, como tem sido na escola? Meu filho tem tomado conta de você como combinado?

Os mais novos trocaram um olhar e o garoto limpou a garganta antes de responder.

— Sim, está tudo certo.

— Que bom, que bom — o homem ficou contente — Nesse caso, como vocês dois já estão mais próximos, o que acharia de dar aulas particulares de matemática a ele? As notas do meu filho estão cada vez mais vergonhosas.

— Pai! — Jonathan resmungou.

— Você acha que pode dizer alguma coisa quando apareceu em casa com o rosto coberto em machucados depois de brigar na rua como um delinquente? — seu pai o encarou irritado.

Vicente estava prestes a abrir a boca para explicar aquela situação, mas o outro negou com a cabeça e o fez se calar. Sem saber o que fazer então, ele disse que daria aulas particulares e o assunto morreu ali.

Depois que seu pai viu seu rosto machucado e ele inventou uma desculpa de que tinha brigado na rua, Jonathan ficou de castigo e tinha que lavar a louça todos os dias depois do jantar. Por isso, seu pai avisou que ele iria recolher o prato de cada um e que os levaria para a cozinha, os demais poderiam ir para a sala conversar e comer alguns doces. Vicente ficou olhando enquanto ele fazia todo o trabalho sozinho e se sentiu culpado, assim avisou que iria ajudar e não deixou seus pais intervirem.

Jonathan estava ensaboando os pratos na cozinha quando ele se aproximou e puxou um pano de prato.

— Vou enxugar — disse.

— Não é necessário.

— Você está de castigo por minha causa, eu acho que é necessário.

— Não fui eu que comecei isso tudo?

Aquilo era inegável, não tinha como Vicente rebater, por isso ele apenas se calou e começou a enxugar a louça já limpa mesmo assim. Eles não conversaram mais muito depois disso, o clima entre eles sempre era estranho, mas parecia que hoje estava ainda mais. Tudo o que Jonathan fez foi espiar o rosto dele de vez em quando, e nessas ele deixou a louça cair na pia umas duas vezes por desatenção, por sorte o outro não percebeu que era ele o motivo.

Enquanto os pensamentos de Jonathan estavam focados nele, os de Vicente estavam em outro lugar. As coisas não vinham fáceis na escola, Charlie fingia que não o conhecia quando cruzavam no corredor e os cochichos e rumores sobre ele continuavam circulando de forma incansável. Na aula de educação física alguns alunos o empurravam e aqueles que tinham brigado com Jonathan e seus amigos o ameaçavam com olhares e palavras ríspidas, porém não tinham mais tentado erguer os punhos, era provável que também tivessem levado um sermão de seus pais. Por conta de todas essas coisas, ir para a escola tinha se tornado um inferno. Se não fosse por suas melhores amigas ele nem saberia como estava sobrevivendo.

Quando todas as louças estavam limpas e secas, cada um foi para um lado. Havia perguntas que Jonathan queria fazer, porém todas elas ficaram presas em sua garganta naquela noite.

Primeiro amor na casa ao ladoDove le storie prendono vita. Scoprilo ora