19 de Junho de 1990 (Terça-Feira)

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Naquela noite sonhei que Diego tinha ido ao meu quarto, como fazia na sua casa em Nápoles. O sonho foi tão intenso e vívido que despertei molhada de suor e com a carne a palpitar de desejo. O duche que tomei foi com água fria para me acalmar. Não queria pensar em sexo durante aqueles dias. Se o resto da comitiva se portava bem, e entre eles havia homens casados e com namoradas de anos, pelo que sentiriam mais falta do que eu, eu também me iria portar bem.

Mantive-me fechada no quarto porque era dia de visita da família e não pretendia conviver com ninguém. Na verdade, não queria que descobrissem que eu estava em Trigoria, embora tivesse chegado a pensar que toda a gente já o soubesse e que aceitavam esse capricho do capitão sancionado pela equipa técnica, porque significava realmente que a campanha no mundial teria resultados diferentes se eu os abençoasse com a minha presença e com as minhas feitiçarias. Eu era a bruxa de serviço. Era uma figura especial e não me devia misturar com quem era externo ao estágio, pois isso diminuiria os meus poderes. Elaborei esta teoria para justificar a minha reclusão. Continuava a não querer interagir com as famílias dos argentinos e admitir que essas pessoas tinham a legitimidade para serem excessivamente amigáveis comigo, tratando-me como uma velha conhecida, mais uma parente. A minha relação com os jogadores não era extensível, determinei.

Preferia também estar sossegada depois de termos chegado tão tarde de Nápoles após um empate que me irritou e de ter tido um sonho que eu classificava de impróprio.

Pedi o pequeno-almoço e, por volta da uma da tarde, pedi um lanche composto por uma simples salada e muita água. Vi televisão, especialmente os programas desportivos, havia um canal italiano que se dedicava exclusivamente a notícias do mundial, e pude rever os jogos do dia anterior, aquele que vira no San Paolo e o embate entre soviéticos e camaroneses. Rinat Dasaev voltou a não estar na baliza. Convenci-me de que ele já tinha saído de Itália e estava de férias.

No resto do tempo, comecei finalmente a escrever o trabalho sobre a coluna de Trajano. O texto inicial estava muito bom, mas continuei a achá-lo trivial, algo que podia fazer em Portugal e que não espelhava a minha estadia de mais de uma semana em Itália num intenso intercâmbio cultural.

Saí do quarto. Signorini atravessava um dos corredores que ligava os dois edifícios do complexo e encontrá-lo foi providencial. Lancei os braços ao ar e chamei-o num tom alegre:

– Fernando! Que sorte! Era mesmo tu que queria encontrar.

– Boa tarde, Tina. Querias ver-me?

– Sim. – Entreguei-lhe uma folha dobrada em duas que arrancara do meu caderno. – Precisava de um favor. Será que me podes ajudar?

– Claro que sim. O que é isso?

– É uma lista de livros. Bem, na verdade é uma lista de temas que preciso consultar em livros que eventualmente possam falar sobre isso. Desconheço que títulos poderão haver numa biblioteca ou onde existirá uma biblioteca! Estou a fazer um trabalho sobre um monumento de Roma...

– Ah, a coluna dos romenos!

– Sabes sobre a coluna? – admirei-me.

– Toda a gente em Trigoria sabe sobre a coluna dos romenos que estás a estudar.

– Não é bem um estudo profundo e detalhado – emendei, constrangida. – Só preciso de acrescentar informação ao que já tenho escrito. Não conheço nada sobre Roma e as suas bibliotecas. Pensei que me pudesses ajudar... não tenho tempo para andar a cirandar pela capital e como tu moras em Itália há algum tempo... Percebes? Precisava desse favor.

– Queres que te encontre livros sobre a coluna dos romenos.

– Sim, se não for muito trabalho.

– Não é. Posso ajudar-te. E sim, é melhor não andares a cirandar por Roma, Diego fica nervoso. E isto aqui... o que é? Que pedido é este?

O Outro Lado do VerãoWhere stories live. Discover now