Capítulo 02

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— Ele gritou?! — Meu tom saiu mais desesperado do que eu pensei que iria.

— Não...sim, na verdade, não é como você está pensando, senhorita Cassiane. Estamos tentando deixar os androids o mais similar possível para com os humanos. Assim nossos clientes conseguem se identificar melhor e é esse justamente nosso diferencial, entre as demais empresas. Colocamos sinalizadores que captam qualquer tipo de energia ou movimento em contato com as peças do corpo do android e eles ativam uma resposta de seu sistema, avisando-o para imitar reações de dor humana. Assim também será mais fácil caso os robôs estejam com algum defeito em seu equipamento e eles mesmos poderão concertar ou avisar seus donos que é hora de uma revisão. — Enquanto a programadora me explicava sobre essa informação crucial, da qual eu não fazia ideia existir, fiquei imaginando o que Attor sentia todas as vezes que usei bisturis, tesouras, agulhas e vários outros objetos pontiagudos para remodelar sua pele.

— Ele sente dor se cortarem sua pele?

— Ele não "sente" de verdade, mas sim. Os sinalizadores funcionam do mesmo modo. Por que? — Os olhos azuis se voltaram para mim, com clara curiosidade.

— Eu corto ele todos os dias.

— Ah...fique tranquila, pequenos cortes sobre a pele não são prejudiciais ao sistema. Como a pele não é tão importante quanto as demais peças, não deve "doer" tanto. — Sua expressão mudou, semicerrando os olhos para minha informação e revirando-os. A mulher deveria achar minhas falas e perguntas muito absurdas ou idiotas. Você está agindo como tola! Se preocupando com um robô!

Entendi. E agora? Ele está desligado. Precisamos continuar com as perguntas?

— Não. Já obtive as respostas que necessitava. O sistema de MZ130 tem respondido de maneira correta, sem desvios. — Após dizer isso, a mulher anotou mais algumas informações em dua prancheta e se aproximou do android, retirando os cabos de sua cabeça.

Era difícil me encontrar com os cientistas e programadores, sem que estivessem correndo para um lado ou para o outro, ocupados. Ou quando não me ignoravam. Cinthia podia me achar uma criança em relação às máquinas, mas ainda tinha o bom senso de responder minhas perguntas. Era melhor aproveitar aquela oportunidade para conseguir mais informações sobre a Renovull e seus protótipos. Eu aguentaria as caras e bocas da mulher para ter minhas respostas.

— O que aconteceu com o android que citou antes? Qual foi a falha?

— Senhorita Cassiane, nunca diga a ninguém nesta empresa sobre "falhas", entendeu? O senhor Lakúsvy não gosta dessa palavra nem em sonho, quanto mais correndo pelos corredores da empresa. Não houve falha alguma, apenas uma resposta diferente. — Na minha percepção, não deixava de ser a mesma coisa. Mas eu não iria falar isso na frente dela. — O android...usou tons agressivos para se referir a um de nossos técnicos.

— Ele foi violento?

— Ele não usou de violência física. Mas seu tom e respostas foram de algum modo...ríspidos, por assim dizer.

— E isso não está nas atualizações?

— Não mesmo. Nosso objetivo é deixar os clientes satisfeitos e alegres. Já pensou, após um longo dia de trabalho, ouvindo seu chefe dizer várias besteiras em seu ouvido, você chegar em casa e ainda ter de aguentar respostas mal educadas de seu android? Nem pensar. Os protótipos devem sempre ajudar os donos e deixarem suas vidas mais fáceis e agradáveis.

— Parece um trabalho difícil.

— Eles são máquinas. Não se cansam. Nada é difícil demais. — Seu tom foi cortante, me fazendo ficar quieta. — Cuidado, senhorita Cassiane. — A mulher se aproximou com a prancheta em mãos, batendo a caneta em um ritmo lento, sobre a folha. — Não deixe sua proximidade com MZ130 criar ilusões em sua cabeça. Um Android é e sempre será apenas um grupo de códigos e peças de metal. Já tivemos problemas o bastante com uma programadora ano passado, esperamos não te-los de novo. Compreendido?

Minha Bela Criação - Trilogia Androids Que AmamOnde as histórias ganham vida. Descobre agora