CAPÍTULO I: Ascensão

115 27 80
                                    

Utopias... Uma sensação inexplicável. Eu deveria estar bem chapado... De repente, voltei no tempo. Voltei a ser um menino idiota que enlouqueceu por uma criatura tão repulsiva. Por um momento, éramos nós outra vez. Sem recordações futuras, tudo parecia perfeito... Como... Mas que porra é essa? Eu enlouqueci? Um sonho nojento e isto? Tsk... A vida é muito curta para alucinações. Aquela... Aquilo... O que significava aquilo? Por que aquela criatura? Já deveria estar em um maldito túmulo, não em minha mente. Precisaria arrancar o meu cérebro para esquecer-me de você?

- Adivinha quem voltoooou?!

De repente, um inesperado alívio, libertando-me de minha própria mente... Cardan. Com jornais velhos saltitava e ria, profanando estrondos altos o suficiente para a orelha arrancada de Van Gogh escutar. Sua euforia nunca passou, sempre elétrico e insuportável. Ouvir suas idiotices é a melhor maneira de se começar o dia.

- Se for alguma namorada sua, olha, eu real...

Não pude terminar minha fala, lendo o papel em minha frente. Eles voltaram... Eles... Estavam de volta. O noticiário apontava, pela manhã a Geussyzia estaria de volta. Alguém deveria estar zombando de mim. Alguma entidade que realmente odeie a minha vida. Despejando-me na cadeira, abri uma garrafa de vinho de oitocentos, passando a língua entre os dentes.

- Porra... Assim eu gozo.

Ri baixo, despejando toda a garrafa em minha boca, levemente, rodopiando. Os heróis voltaram! Caralho! Seria tão divertido! Se ficassem comportadinhos, talvez eu mostrasse minha bunda. Meu lado pornográfico sempre foi o mais valioso. Os grandes heróis Europeus não sobreviveriam sem o seu coração americano por muito tempo. Suas emboscadas superavam qualquer videogame. Eu não perderia essa por nada...

- Tá pensando em quê? Pode matar os presidentes e mandar as cabeças em uma maletinha.

Neguei com a cabeça, despejando mais vinho. Sua idéia excitava, mas não era o momento. Apesar de, confesso, precisar dar razão a Cardan. Nosso prezado reencontro precisava de algo especial. Algo marcante. Algo que fizesse a Europa chorar em desespero. Não quero me assemelhar a um vilão patético de filmes, mas foi um momento especial. Eu estava nostálgico... Ultimamente lia HQs e bebia com Cardan. Foi um maravilhoso intervalo, mas foi dada a hora de retornar a clássica programação. Sorrindo ladino, ergui duas taças de tinto, encarando Judas. Para a minha ascensão, precisaria ser alucinante. Eu faria história.

- E um brinde ao grande traidor.

Príncipe herdeiro da família britânica, "Aaron" Coleman. Ao invés de proteger seu reino como o grande rei que deveria ser, preferiu... Isto. Foram quinze anos juntos, estávamos para nos fundir. As taças de vidro se colidiram, logo o álcool fora derramado. Em minha mente, uma luz, a perfeita resposta para todas as minhas questões. Meu grande espetáculo.

- É... Isso! Diga a Holly para conseguir ácido. Você vem comigo. Vamos aquecer os corações de Nova Iorque.

[ . . . ]

- Não queremos problemas. Fique quieto e iremos embora sem feri-lo.

Da boca de Cardan, nenhuma palavra, apenas suas presas. Sua boca à mostra foi o bastante para o homem, que se quer pensou em contestar. Despojando-me na mesa e ajustando os equipamentos, segurei em minhas mãos o microfone do locutor. Sinto frustração ao usar vozes falsas, tenho certeza que esqueceriam Madonna ao som de minha sinfonia. Ajustes finais e então, se inicia. Com um sorriso em meu rosto e sangue em meus lábios, para o país anunciei.

- Bom dia, América! Eu espero que todos estejam tendo um ótimo dia!

Rodopiei berrante, inundado pela euforia. Segui com a fala, levemente, inclinando-me para fora. Minha visão se limitava, mas os meus alvos, nestante, entravam na mira. Principalmente... Tsk.

- Enriiico Passione! Consegue me ouvir? Está escutando? Sejam gentis e saudem nossos turistas. O sentimento de impotência já os machuca o bastante... E estamos na América! Liberdade! Festas! Diversão!

Esta era a razão para aquilo? Não... E eu realmente estava me fodendo. O dia seria incrível! Não sou um vilão, não. Eu não queria uma guerra, queria uma festa! Com comidas, presentes e um tapete vermelho! Eu seria o anfitrião. Seria a festa mais épica dos três mundos! Sem mais delongas, ao ponto central... É uma festa, afinal! E onde há uma boa festa, há incríveis presentes. No tão monótono Central Park, uma decoração especial era mais que necessária. Pizza é uma das minhas comidas favoritas, o que me causa certo pesar. Mas como todo bom americano, não há nada melhor que um hambúrguer. E não há gosto mais delicioso que sangue fresco em sua língua. Empalados em estacas, formando uma graciosa estrela, cinco imigrantes italianos, inteiramente esfolados. Seus olhos e línguas foram retirados, seu sangue provavelmente ainda escorria pelos cadáveres. Uma adorável família italiana trucidada por mim! Gostaria de estar lá para ver as suas reações. Para prestigiar grandes entradas, o tapete vermelho é o símbolo ideal. Vermelho não era exatamente a cor original, mas não demoraria para se tornar. Como cuidadosamente arquitetado por Stan, durante aquela madrugada, ácido começou a correr como uma cachoeira pelas ruas de Nova York. O homem, aterrorizado, não ousou dizer uma única palavra. Cardan ria, brincando com os equipamentos. De onde estávamos, conseguia ouvir perfeitamente a encantadora melodia... Mulheres gemendo, pivetes chorando e homens berrando por insaciáveis soluções. De fato, uma maneira majestosa de se começar um dia. Abrindo um genuíno sorriso, respirei profundamente, profanando cada sílaba com o mais profunda excitação.

- Meus queridos europeus... Eu, como grande patriota e anfitrião, do fundo do meu coração, desejo-lhes boas vindas e uma excelente estadia.

Cuidadosamente, posicionei o microfone em seu habitat natural, rindo tranquilamente. Não faço o tipo inseguro, mas partiria meu coração vê-los tão bem. Que excitante... Quase tão excitante quanto me alcoolizar pela primeira vez. Não precisava de algo absurdo, afinal, era apenas o início. Meu tapete de ácido seria a estrela do dia, e brilhar ia desgovernado por quem estivesse em seu caminho. Apenas me perguntava se estaria bem... Covarde como é, nunca voltaria. Melhor assim. Virei outra garrafa, balançando-me pelos cantos do local. Cardan, por fim, libertava o generoso velhote, que nos emprestou seus equipamentos. Tudo seria fácil se todos fossem assim.

- Até mais, coroa!

Acenei, pulando para fora. Cardan se jogou como um animal, planando felinamente. É... Não havia mais fuga, era o nosso destino. Uma brincadeira de crianças ou uma batalha até a morte, jamais fugiríamos. E quando tudo acabasse, devoraria os órgãos de Passione como café da manhã.

- Haha... Agora "Don't Stop Me Now"..!

[ . . . ]

Sangue pelas ruas, lágrimas correntes. Ossos estilhaços e maníacos reverentes. Civis enlouquecidos com a extravagante visão, outros desesperados por tudo o que perderão. Rádios sendo apedrejados por sua terrível fúria, como se o generoso locutor tivesse a culpa. Garotinhas amedrontadas buscando conforto em seus pais, embora uma simples criança não fosse nada aos demais. Cardan fora embora, estava completamente sozinho agora. Em suas faces, o medo e o desespero vinham à tona. Uma miserável distopia, que, cada vez mais, alimentava minha euforia.

- Aquele é o...

Uma mulher se aproximava, trêmula, boquiaberta. Relutante por mais um centímetro de onde estava, apontava para mim. Estava tímida? Se quisesse um autógrafo, daria de bom grado.

- Esse canalha não estava morto?

Um homem berrou, cerrando seus punhos, preparando para se lançar em meu corpo.

- Mamãe... O que está acontecendo?

Patéticas crianças questionavam seus pais, chorando, com medo de uma simples substância. Não foi o meu maior feito, não precisavam ter tanto medo. Os caras não demorariam a chegar. Acontece que Stan realmente adora se arrumar. Mas não era um problema lutar sozinho. Claro... O que poderia ser mais divertido? Meus olhos brilharam, quando, finalmente, os grandes convidados compareceram a cerimônia. Passione e suas putinhas, com escudos e arminhas. Não o encontrei na multidão, respirando aliviado, com certa comoção. Que nunca mais pisasse na América. Mas antes que meus blefes pudessem retornar, milhares de gatilhos prestes a atirar. Espadas e punhos não ficavam para trás, fundidos aos poderes que a bela organização traz. Sem mover um único músculo, apenas um trago em meu cigarro, que, ao tocar os solos, explodiu como uma granada. Era uma granada. Pousando nos céus, me dei por gargalhar. E finalmente, comecei a elucidar.

- Não há lugar como nosso lar.

Between Sex and BloodWhere stories live. Discover now