Dois minutos depois

801 100 0
                                    

Dois minutos depois

Eu não conseguia me mover; meus braços doíam, meu crânio martelava e eu só sabia que estava cansada e queria voltar a dormir.

Olhei para o céu estrelado com o prato prateado iluminando a minha noite enquanto eu sentia que estava voltando à consciência depois de um péssimo e real pesadelo.

Comecei a fechar meus olhos quando uma luz forte e amarelada atingiu o meu rosto. Pisquei forte.

O mar tentou me levar pela segunda vez, e pela segunda vez alguém me salvou. Era isso um sinal?

— Elisabeth? — reconheci aquela voz e perguntei-me por que ele estaria na praia aquela hora da noite, então me recordei que havia aquela garota na festa que me pediu para entregar um bilhete para ele.

Eu acabei de quase ser morta.

Eles deveriam ter marcado um encontro na praia e eu provavelmente estava atrapalhando com a minha quase morte.

Grande Elisabeth.

— Você está bem? — senti suas mãos quentes envolvendo meus ombros e abraçando, transferindo calor corporal mesmo que ele também estivesse molhado.

Jason me fez sentar, pois ainda estava atordoada.

— Eu acho que tentaram me matar — comecei a rir e tossir, inclinei meu corpo para frente e vomitei, porém de meu organismo saiu apenas água.

Eu havia engolido tanta água.

Tanta...

— O que aconteceu? — ele enfiou a lanterna na areia e retirou meus cabelos da frente dos meus olhos, mostrando-me aqueles olhos cinzentos preocupados assim como os cabelos loiros... um anjo.

Naquele momento eu acreditei que ele fosse um anjo da guarda e estava me protegendo.

Abracei-o e tentei ignorar a tensão do seu corpo contra o meu dizendo que era apenas por causa da água, por que eu estava fria e molhada enquanto ele estava quase seco e quente.

Coloquei minha mente para funcionar, não fazia sentido.

Por que alguém tentaria me matar? Eu era uma pessoa comum, não sabida de nada demais para que alguém almejasse e planejasse a minha morte.

E talvez isso também tenha acontecido com Will.

Ele estava se correspondendo o ser misterioso, estava usando drogas e saindo com Vanessa.

No momento em que ele morreu, todos o estavam odiando. Parecia que ele havia planejado...

“A polícia revistou a casa, mas eu já havia me livrado das drogas, eles pegaram meu celular quando souberam da mensagem. Disseram que ele tinha se matado.”

— Eu acho que as mesmas pessoas que mataram o meu irmão estão atrás de mim — murmurei minha reflexão em seu ombro fingindo que não estava chorando ou soluçando, o que eu estava fazendo.

— Eu não acho que você tem a ver com os antigos problemas de seu irmão — ele afagou minhas costas e eu olhei para os lados, estávamos sozinhos.

— Ele estava mexendo com as pessoas erradas ou fazendo algo que não deveria... não sei... eu só não quero morrer, eu não quero! — deixei-me derramar lágrimas em seus ombros começando a perceber que eu poderia estar em risco por algo que não sabia o que era.

Tudo culpa de William.

— Já acabou. Já acabou — ele sussurrou para mim puxando meu rosto para que eu o olhasse — você está bem?

— Tentaram me afogar.

— Eu sei, eu vi, quer dizer, eu ouvi o seu grito, então quando vi o homem contra a água soube que você não estava segura. Agora acabou, eu estou aqui — e eu me sentia segura.

— O que você está fazendo na praia a esta hora da noite? — perguntei aceitando a sua ajuda para que nós nos levantássemos juntos.

Comecei a espremer minha roupa, a blusa branca bufante de manga comprida, a saia marrom longa...

Eu havia escolhido a roupa perfeita para entrar na água.

— Aquele bilhete da festa era de uma garota que dizia para que nós nos encontrássemos no penhasco quando fosse meia-noite.

Meia-noite? Ainda era meia noite? Eu me recordava de olhado o relógio e eram dez para a meia-noite antes de tudo ter acontecido.

— Acho que você acabou pegando o caminho errado, o penhasco é do outro lado — comentei apontando ainda espremendo a blusa e os cabelos.

— Eu... — ele passou a mão na calça retirando areia dela e pegou a lanterna, era pequena portátil, o filho de um mecânico deveria mesmo andar com uma lanterna no bolso, eu poderia aprender algo com isso — eu não queria ser mais um nome na lista dela, fiquei andando pela cidade e vim para a praia por ser do outro lado da ilha, então encontrei você.

— Eu gritei tão alto assim? — perguntei com um pouco de curiosidade, pois eu imaginei que havia gritado, só não sabia se foi alto o suficiente para chamar ajuda.

— Sim, alto e em bom som.

Puxei minha saia até as minhas coxas e a espremi, enrolei-a o máximo que pude e comecei a andar, não conseguiria fazê-lo antes com o peso que ela estava.

Ele retirou a sua blusa de manga comprida preta e me entregou mostrando que ele estava com uma camiseta azul-marinho por baixo.

— Eu não estou com frio — ri enquanto devolvia para ele.

— Apenas coloque, tudo bem? — ele disse sério e eu obedeci sem entender.

Ficou largo e grande em mim, como quando eu era pequena e pegava os casacos do meu pai para dormir por que eles eram mais confortáveis do que os meus.

— Obrigada.

— Quer que eu a acompanhe para a sua casa? — ele perguntou todo cavalheiro.

Parei onde estava e o encarei.

Eu não havia pensado nisso, mas não queria ir para casa. O último lugar que eu queria ir era para casa.

Encarei minhas mãos pálidas e enrugadas pela água do mar. Parecia que eu estava reluzindo, que minha pele estava refletindo a luz da lua de tão clara que ela era, o oposto de meus cabelos castanhos e olhos amendoados.

Tentei colocar em palavras os meus sentimentos, todo o turbilhão que se movia dentro do meu peito, porém não conseguia fazer os meus lábios pararem de tremer tanto quanto minhas mãos, portanto cruzei-as e calei-os.

Neguei com a cabeça, olhando para o chão; não sabia se Jason iria achar estranho ou normal, não sei quantas pessoas ele conheceu que quase morreram afogadas. Duas vezes.

Senti algo se encostando contra a minha mão e fitei-a, era a mão dele contra a minha.

Percebi que eu havia buscado por sua mão, e ele estava entrelaçando nossos dedos, afagando as costas de minha pele.

— Vamos dar uma volta — ele me puxou antes que eu pudesse assentir ou recusar.

Teria muito que agradecer aquele garoto quando o sol raiasse e os fantasmas que estavam me assombrando fossem ofuscados, pois, naquele momento, eu não conseguia me imaginar estando sozinha.

E de uma coisa, e apenas uma coisa, eu soube, se tudo ficasse ainda pior, eu conseguiria lidar com isso.

EstilhaçosWhere stories live. Discover now