CAPÍTULO 3

156 16 4
                                    

Lisa

Desvio os olhos dos dele, quebrando o contato visual intenso ao que estava presa, sentindo a dor em minha mão por ter me apoiado nela ao cair e gemo alto.
─ Você está bem? Desculpa... Eu... ─ ele tenta se desculpar e sua linda voz me acalma.
─ Também devo pedir desculpas. ─ admito. ─ Será que poderia me ajudar, não consigo me levantar sozinha. ─ gemo outra vez de dor e ele parece preocupado e me ajuda a levantar delicadamente, apesar de seu tamanho todo e provável força bruta.
Ao ficar em pé, sentindo suas mãos fortes me segurando, volto a olhar para seu rosto sério e... Lindo! Mas rapidamente desvio o olhar para me dar conta da bagunça espalhada pela calçada.
─ Ah, meu Deus! Que droga!
─ Não se preocupe, eu te ajudo.
Fico parada, me equilibrando nos malditos sapatos de salto alto, enquanto observo ele reagrupar todos os papéis e colocar na pasta, totalmente desorganizados, mas todos salvos. Ele me entrega a pasta e se volta para juntar os itens da minha bolsa e o vejo corar ao pegar o último item para guardar na bolsa, minha caixinha de absorventes. Tento segurar o riso na minha garganta e quase engasgo, mas disfarço tossindo.
─ Acho que está tudo aí. ─ ele me entrega a bolsa e o meu casaco, e quase derrubo a pasta outra vez, por tentar segurar tudo com uma mão só. Pois agora a dor da minha mão se espalhou pelo braço. Mas ele intervém antes que a pasta caia outra vez.
─ Opa! Pronto, pasta segura. ─ fala e sorri, me fazendo prender a respiração com sua beleza. ─ O que houve com sua mão?
─ Algo como "não sabe dar um soco de direita, garota?" ─ seus olhos se arregalam e ele parece ter alcançado algum tipo de compreensão que eu não entendo e depois simplesmente da uma gargalhada, me deixando ainda mais confusa. ─ Qual é graça?
─ Foi você! ─ ele diz ainda rindo.
─ Fui eu o quê? ─ já estava irritada outra vez e fiquei ainda pior ao me dar conta de quanto eu deveria estar atrasada. ─ Quer saber de uma coisa, você pode me explicar no caminho, preciso de ajuda com as minhas coisas e estou muito atrasada.
─ Bom, eu posso te ajudar, mas depois quem vai ter que me ajudar é você. Para onde você está indo?
─ Eu trabalho na Red Night, é para lá que estou indo.
─ Mas não está indo no sentido errado?
─ Não, você é que está indo para o sentido errado. ─ ele se vira e olha para trás, avistando a entrada e o letreiro da boate.
─ Eu acho que passei direto, estava distraído com o celular e...
─ Isso explica muita coisa. Vem! ─ não espero por uma resposta e vou seguindo na frente.
Abro a porta que fica ao lado da boate, que da nas escadas leva a parte superior da boate, onde ficam o escritório e a sala de Amanda, e entro com o desconhecido logo atrás.
Só agora me dou conta de que não perguntei nem o seu nome.
Chego ao final das escadas e me deparo com Carol dando um belo amasso no Felipe. Isso me faz revirar os olhos e interrompo.
─ Será que poderiam lembrar por um minuto apenas de que este local não é adequado para esse tipo de comportamento? ─ eles se viram para mim sorrindo e pude perceber os olhos da Carol se arregalarem. E me dou conta novamente do estranho atrás de mim.
─ Bom dia para você também, Lisa. Como está a mão?
─ Quebrada.
─ Pelo visto vou realmente ter que te ensinar a dar uns socos. ─ diz Felipe com um largo sorriso.
─ Quem é seu amigo? ─ Pergunta Carol com uma cara que eu não soube definir.
─ Bom na verdade... ─ me viro para ele, que está sério a nos observar, mas com um semblante bem tranqüilo.
─ Ah, meu nome é Dean Jahnsen. ─ hummm, belo nome. Felipe o cumprimenta com um aperto firme de mão, enquanto minha amiga faz sinais estranhos para mim e falando sem voz. Mas não entendi porcaria nenhuma.
─ Amanda já está me esperando? ─ pergunto para quebrar o silencio.
─ Pra sua sorte, ela acordou resfriada e pediu que fizéssemos a reunião semanal no próximo sábado. ─ diz Carol, pegando a sua bolsa para ir embora.
─ E o resto do pessoal?
─ Já foram. Você se superou no atraso hoje, ruiva. ─ Fala Felipe me dando um beijo na testa e me entregando as chaves do escritório. ─ Quem chega por ultimo fecha tudo e sai, são as regras. ─ Ele segura na mão da minha amiga e eles saem, me deixando sozinha com o Dean.
Solto bolsa e casaco em cima de uma poltrona e desabo nela, respirando fundo. Vejo Dean me observando e lembro-me que ele disse que precisava de ajuda.
─ Então, DJ, o que posso fazer para te ajudar?
─ DJ? ─ pergunta, levantando as sobrancelhas.
─ Sim, acho agradável. Você não?
─ Bem... ─ não espero ele terminar e continuo.
─ De que tipo de ajuda você precisa?
─ Talvez você nem queira mais me ajudar quando eu te contar.
─ Só vou saber se me disser, mas em todo o caso, eu disse que ajudaria. Diga. Se estiver ao meu alcance... ─ ele respirou fundo e tentou não olhar para a minha mão, mas eu percebi.
─ Ok, ontem houve uma festa a fantasia na boate e... Bem, meu irmão deixou cair um componente da fantasia que estava usando e preciso encontrar.
─ Hum, acho que teremos que entrar no salão para dar uma olhada. Se tivermos sorte a tia da limpeza ainda não começou. Espera só um segundo.
Olho para o relógio chamativo que fica na parede do escritório e confirmo que pelo horário, Mari a senhora que traz sua equipe de limpeza ainda não havia chegado.
Vou até a sala que divido com minha chefe Amanda, deixo a pasta em cima da minha mesa. Em outro momento eu tento reorganizar a merda da papelada.
Volto a sala principal, pego minha bolsa e meu casaco. Peço para o Dj ir a frente enquanto tranco a porta e quando estamos prestes a descer, uma dúvida me intriga, pois como vou poder ajudar a encontrar o que ele precisa se não sei do que se trata nem onde exatamente devemos procurar.
Eu paro no primeiro degrau da escada e o encaro no degrau abaixo.
─ O que foi?
─ Eu acho que você esqueceu-se de me dizer o que exatamente está procurando. ─ de uma hora para outra ele parece ter ficado desconfortável.
─ È que meu irmão estava fantasiado de... Policial e perdeu o distintivo ─ ele termina de falar e olha novamente para a minha mão e neste momento a ficha caí e compreendo. Olho para minha mão enfaixada, com meus dedos quebrados e volto a olhar para ele.
─ Seu irmão...
─ Infelizmente.
─ Você quer dizer que o cretino que eu soquei, era seu irmão?! Mas que merda! ─ digo nervosa e me desequilibro e sei que vou cair pelas escadas, mas ele não deixa e adivinha? Caio direto em seus braços.
─ Que inferno! ─ digo e me desvencilho dos braços dele, tentando me distanciar, mas sendo impossível no espaço estreito das escadas.
─ Pare com isso! Tá querendo rolar as escadas e quebrar o pescoço? ─ ele segura firme em meus braços. Eu o encaro.
─ Você tinha razão! Não tenho a mínima vontade de te ajudar. Saia da minha frente para que eu possa descer e ir embora!
─ Ah, qual é! Eu não tenho culpa de o meu irmão agir como um idiota! ─ respiro fundo e tento me acalmar.
─ Mas deveria ficar de olho nele quando está bêbado, isso me rendeu dois dedos quebrados!
─ Isso é culpa sua, por não saber dar um simples soco!
Me esquivo dele e vou descendo as escadas, apressada e com o sangue pulsando de raiva. Chego ao final da escada e lembro que tenho que trancar a porta de entrada, sou obrigada a esperar que ele desça e tenho que encará-lo outra vez.
─ Por favor, seja menos hostil. Eu não sou o culpado de nada e preciso viajar ainda hoje, não posso perder o vôo.
─ Não posso fazer nada a respeito, seu irmão que se vire!
─ Estou pedindo, por favor. ─ ele toca em meu braço e sinto uma paz que a muito tempo eu não sentia. Como pode isso, com um simples toque? Eu devo estar com algum problema e não acredito nas minhas palavras e nem no tom suave que emprego nelas.
─ Tudo bem. Mas fica me devendo essa. ─ ele sorri e não consigo não retribuir. O que há comigo! ─ Vem.
Vou à frente e destranco a porta lateral da entrada principal que está fechada e dou acesso para que ele entre primeiro.
Entro, fecho a porta e ascendo as luzes e vou até a parte de trás do bar principal, onde temos uma caixa de achados e perdidos.
Ao olhar dentro da caixa, vejo o reluzente distintivo se destacar das outras coisas. Como existem pessoas irresponsáveis que perdem as coisas e a maioria nem se dá ao trabalho de voltar e procurar suas quinquilharias. Bem, nem todos, já que um voltou.
Pego logo o distintivo e me viro, encontrando ele próximo me observando. Algumas idéias me passam pela cabeça ao olhar para ele de cima a baixo. Vou fazer isso custar caro, para ele e o irmão.
─ Aqui está, DJ. ─ ofereço esticando o braço e com a mão aberta com o distintivo ao alcance, mas fecho a mão quando ele tenta pegar. ─ Não tão rápido.
─ Tudo bem, o que você deseja em troca? ─ ele suspira frustrado.
─ Você precisa voltar algumas vezes e me pagar algumas bebidas, ou o seu irmão, como compensação, até eu pensar em outra coisa. ─ sorrio.
─ Já sei. Isso vai nos custar por todo o acontecido.
─ È pegar ou largar.
─ Então eu pego.
─ Não tenho garantias, você pode sair por aquela porta e nunca mais voltar aqui. Enfim, vou ter que acreditar na sua palavra. ─ dou de ombros. Ele parece ofendido.
─ Pois saiba que sou um homem de palavra, Lisa. ─ diz todo sério e isso o faz parecer um pouco sexy. Sem contar que ouvir meu nome saindo dos seus lábios me arrepia.
Ofereço mais uma vez o adereço, ele estende a mão. Solto na sua palma e fico observando quando ele se vira e vai andando até a porta. Ele se vira uma última vez para me olhar e dar um pequeno sorriso antes de sair e eu perde-lo de vista.
Suspiro e pego minhas coisas. Apago todas as luzes e estou saindo quando a equipe de limpeza chega.
─ Olá, minha linda! ─ diz Mari, sorrindo ao me avistar na porta. Eu sorrio, ela é sempre querida comigo. Mas seu sorriso se desfaz ao ver minha mão. ─ Ah branquinha, o que você aprontou dessa vez?
─ Nem te conto. Soquei a cara de um idiota.
─ Você precisa para com isso, Lisa. Nem todos têm más intenções com você. Precisa esquecer tudo que aconteceu e seguir em frente.
─ Esquecer como? Não é como se eu pudesse apagar do meu cérebro e do meu coração tudo que vi e senti.
─ O primeiro passo é conversar com um psicólogo. Isso pode ajudar.
─ Não tenho tempo para isso, e nem sei se quero pagar pra um cara ficar me ouvindo. Preciso ir.
─ Tudo bem. O que vai fazer o resto do dia já que não vai trabalhar?
─ Dormir? ─ pergunto sorrindo, só de pensar que posso passar o dia na cama.
─ Vida social? ─ pergunta ela retrucando
─ Não preciso disso. ─ dou um beijo em seu rosto e sigo meu caminho para casa.
Detesto pensar no meu passado. Nas coisas que realmente não gostaria de me lembrar.
Eu tenho sérios para me relacionar com pessoas e interagir com elas. Passei minha infância toda em orfanatos em Los Angeles, e as vezes em lares adotivos que acabavam me devolvendo para o orfanato.
Fui abandonada aos cinco anos de idade por minha mãe viciada e por um pai violento, mas acho que o abandono aconteceu até mesmo antes. Sempre fui negligenciada.
Foi uma criança indesejada, vim ao mundo por um descuido da minha mãe, que estava sempre drogada e mal se lembrava de comer, como se lembraria de tomar a pílula? Meu pai por sua vez, casou com ela apenas por estar bêbado e por ter prazer em ter em quem bater quando tinha vontade. Eu não deveria me lembrar de muita coisa, pois era pequena, mas infelizmente me lembro de coisas demais.
A única coisa que gostaria de ter na minha memória, é de alguma vez ser amada ou me sentir assim.
Fui adotada quatro vezes, e em todas elas, sofri abusos. Não entendo qual é o problema do maldito sistema. Eles deviam ser mais cautelosos e ver o que há de errado com os miseráveis candidatos.
A desculpa para os maus tratos das outras crianças do orfanato era sempre a mesma, que eu era muito bonita e que a princesinha merecia tratamento a altura, então adivinha quem sempre levava a culpa por tudo?
Quando fui escolhida pela primeira vez, não gostei da mulher, que do casal era a pior.
No começo ela me tratava bem, mas depois começou a ter ciúmes dos mimos que o marido dela dedicava a mim. Ele me olhava com adoração, pois era seu sonho ser pai, mas não era o sonho dela ser mãe, e descobri isso da pior forma. Ela tentou queimar minhas mãos em uma panela de água fervendo, isso causou uma séria discussão entre os dois, houve separação pela "insensibilidade" dela e de quebra, voltei para o orfanato.
Resolvi parar de pensar sobre o passado e relembrar das devoluções, como se eu fosse um bichinho de estimação temporário, e dos maus tratos assim que cheguei à segurança do meu pequeno apartamento. Relaxei ao tirar os saltos e colocar uma roupa confortável.
Minha cama naquele momento se tornou muito irresistível, e como sempre, me deixei levar pela nossa atração correspondida e me deitei, suspirando profundamente.
Como era bom dormir... Mas uma coisa estava me incomodando muito. O que era aquilo que estava sentindo com relação aos últimos acontecimentos? O era isso que eu havia sentido na presença do DJ? Nunca me senti assim, não sabia dizer o que era. E aquele olhar... E seu toque me fazia acelerar o coração.
Deitei de lado abraçada ao meu travesseiro, pensando no lindo desconhecido, que porfalta de garantias, não tinha certeza se veria outra vez, apenas sua palavra.
Fechei meus olhos com a lembrança fresca de seu rosto em minha mente e adormeci.

Descrições ProibidasWhere stories live. Discover now