Parte 5

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     Nem preciso pensar duas vezes para saber o que eu quero fazer hoje.
   OVELHAS!!
   Subo para trocar de roupa depois de ter tomado meu café da manhã e junto com o seu pai, vamos cuidar e alimentar as bichinhas. O cara que cuidava delas estava de folga para passar o natal com a família.
   Desisto de abraça-las por não estarem com um cheiro muito bom e nem com aquela cabeleira toda. Com a chegada do verão, eles tiravam toda a sua lã.
   Uma cidade doida com pessoas doidas e um tempo mais doido ainda. Quando chegamos aqui, o tempo estava de um jeito. Ontem estava frio nublado e chuviscando. Hoje amanheceu com sol. Mas ainda continuava frio apesar de ser verão.
   _Está vendo aquela ali? -pergunta Marina apontondo para uma ovelha que saltitava toda desengonçada.
   Afirmo com a cabeça.
   _Ela se parece com você! -diz sorrindo.
   Dou um tapa em seu braço.
   _Eu não sou desengonçada!
   _Ei! Eu não disse que você era desengonçada... só um pouco estabanada.
   Dou lhe mais um tapa.
   _Ai, seus tapas doem!
   _É? -continuo batendo em seu braço- não estou sentindo nada!
   _Para com isto! -diz ela prendendo os meus braços para trás. Me beija.
   _Me solta, está me machucando! -digo evitando seus beijos.
   _Vai parar de me bater?
   _Vou!
   _Então me beija.
   Eu a beijo e então ela me solta. Abraço a com força.
   Tirando a nossa plateia de ovelhas ali presente do outro lado da cerca -não estavam nem aí pra gente- outra pequena plateia nos assistiam da varanda da casa.
   _Temos plateia! -digo.
   _Ei, esquece eles, vamos ser só nós duas hoje...
   Sorrio beijando a.
   _Já que você insiste!
   Passamos o resto da manhã ali fora aproveitando cada segundo daquele sol.
   E é chegada a bendita hora do almoço.
   Antes de entrarmos, Marina pede para que eu me comportasse.
   Eu estou me comportando!
   _Me passa o azeite por favor! -pede a tal Maria.
   Pego o azeite, viro um pouco na minha salada e volto a coloca-lo na mesa.
   _Pode me passar o azeite, por favor? -insiste.
   Dou um garfada na minha comida como se nada tivesse acontecido.
   Todos me olham.
   _Raquel! -chamou me o Sr. Carlos.
   _Sim...
   _Você não está ouvindo a Maria pedindo que lhe passe o azeite?
   Olho para a tal Maria, olho para o azeite, torno a olhar para a Maria. Dou mais uma garfada pegando o azeite.
   _Achei que eu fosse invisível pra você. -digo com a boca cheia passando o azeite- Espero que não me enxergue só quando precisar que lhe passe o azeite!
   Sinto Marina me fuzilando com os olhos. Ninguém diz nada.
   Volto a comer naturalmente no meio daquele climão todo.
   _Você não presta, sabia? -diz Marina depois que voltamos a ficar sozinhas outra vez.
   Na maior cara de pau pergunto o por quê.
   _Você prometeu se comportar!
   _Mais eu me comportei!
   _Jura!?
   Sorrio.
   _Ela mexeu comigo primeiro! Meu santo não bateu com o dela desde a primeira vez quando ela veio me cumprimentando de qualquer jeito.
   _Não viaja Raquel, ela te cumprimentou normalmente.
   _Ah sei, normalmente, claro! Eu vi como vocês se abraçaram. Naa minha vez, foi só um tapinhas na minhas costas como se eu não fosse nada.
   _Você está implicando com ela por causa do modo como ela não te cumprimentou? Meu Deus Raquel, como você é tão... tão...
   _Tão o quê?
   Ela sorri se aproximando, aperta a minha bochecha.
   _Tão linda, tão fofa quando está com ciúmes... delicada como um coíce de mula!
   Cruzo os meus braços.
   _Eu nem estou com ciúmes...
   _Ah não está não?
   _E não era pra tá? -me afasto- Você vê o jeito como ela te olha? Como ela te trata? É Marinazinha pra lá, é Marinazinha pra cá... vem toda cheia de nhê nhê nhê...
   _Ela tem idade para ser a minha vó!
   _O amor não tem idade!
   _É sério isto?
   Dou de ombros.
   _Sei lá...
   _Relaxa e para de ficar cultivando essas minhocas na tua cabeça. Ela é como uma segunda mãe pra mim, me criou como a filha que não pôde ter.
   _Tadinha! -digo sarcástica.
   Ela me abraça por trás mordendo o meu pescoço.
   _Tenha respeito pelos outros! -diz.
   Tombo a minha cabeça para o lado para que continuasse a me morder. Ela se afasta.
   _Não, você não está merecendo!
   Bufo empurrando a para o lado.
   Diferente da parte da manhã, na parte da tarde, estava quente e abafado.
   Entro para beber um pouco de água.
   A tal Maria estava na cozinha catando feijão. Passo por ela sem dizer nada, pego a água. Eu ia saindo mas dei meia volta sentando na cadeira à sua frente.
   _Bom... -começo depois de respirar fundo tomando fôlego- eu queria pedir desculpas pelo modo como falei com você hoje na hora do almoço...
   _A sua mãe não lhe deu educação? -pergunta sem me olhar.
   _Como?
   _Não se diz 'você' para uma pessoa mais velha, se diz 'senhor ou senhora'.
   Eu fiquei tipo: do quê ela está falando?
   _Você disse 'você' ao invés de dizer 'senhora'! - responde como se adivinhasse o que eu estava pensando- os seus pais não lhe ensinaram isto não?
   _Eles até me ensinaram, mas sabe como é, né... -dou de ombros- eu não quis aprender!
   Ela me encara serena.
   _Você é muito malcriada, menina, mas eu sei como cortar isto. Já cuidei de crianças piores.
   Bebo a minha água enquanto ela ia falando.
   _... não vá pensando que pode fazer o que quiser aqui. Temos regras. E não é só porque você é visita e é a namorada da minha Marina que pode fazer o que bem entender. Não pode me afrontar disperdiçando comida, andando descalço por aí ou achando que pode me desrespeitar...
   Sorrio.
   _Do quê estar rindo? Estou com cara de palhaça? Estou contando alguma piada?
   MEU DEUS!!
   Ela consegue ser pior do quê a minha mãe!
   _Vai aceitar as minhas desculpas ou não? -pergunto suspirando.
   _Eu ainda não acabei de falar!
   Diferente da minha mãe, essa tal Maria não gritava e nem se gesticulava. O modo como ela me chamava a atenção -olhando nos meus olhos e a voz baixa mas ao mesmo tempo firme- eu preferia que ela me xingasse, que gritasse, até que me batesse, qualquer coisa, menos daquele jeito.
   Deixo ela falando no modo silencioso. Não a escuto.
   Que cara, não coração. Quem a visse pela primeira vez, diria que ela é doce e gentil com aquelas bochechas e a carinha de anjo. Mas ela é o capeta em pessoa.
   Não se enganem!
   Ela deve ser frustada por não poder ter filhos e por isto é rabugenta assim.
   Engraçado, muitas mulheres querem ter filhos mas não podem ter, e muitas mulheres que podem ter filhos, não querem ter... a vida é meio injusta, né?
   Tiro a do modo silencioso a tempo de ouvi-la dizer que quem mandava na casa era ela apesar de que era o Sr. Carlos quem pagava o seu salário, e ela queria respeito fazendo tudo o que ela mandasse eu fazer.
   Se bem eu entendi, ela era a governanta da casa e governava a mãos de ferro. Eu teria que seguir a suas ordens se não ela me lançaria aquele olhar tenebroso e continuaria a fingir que eu não existia.
   Estou com medo dela. Vai que ela bota alguma coisa na minha comida!
   Levanto me quando ela faz uma pausa.
   _Eu já posso ir ou você... quer dizer, ou a senhora ainda tem mais alguma coisa pra dizer?
   Antes que ela abrisse a boca novamente, completo.
   _Não precisa dizer mais nada, eu entendi o seu recado. Não vou mais disperdiçar comida, vou sempre calçar o meu chinelo e não derespeitarei a senhora, MAS, me trate com respeito e será respeitada. Resumindo: a senhora não entra no meu caminho, eu também não entro no seu. Nós duas saímos ganhando! E mais uma coisa, não é menina e nem garota. Meu nome é Raquel! E agora com a sua licença, eu estou indo.
   Saio de cabeça erguida. Acho que estavamos entendidas.
   _Você demorou. -diz Marina deitada na grama.
   Sento me ao seu lado.
   _Eu estava tendo uma conversinha com a tal da Maria.
   Ela se senta rapidamente.
   _Não se preocupe, foi um conversa produtiva.
   _O que conversaram? -pergunta ela preocupada.
   Sorrio me aproximando dela.
   _Vem cá, só pra me preparar... se eu for pedir desculpas para os seus pais pelo modo que me comportei hoje... eles também vão fazer um monólogo igual a tal Maria fez dizendo o quanto ela é isto e aquilo?
   _Você pediu desculpas para ela?
   Dei de ombros.
   _É, me dei conta que eu estava sendo uma idiota agindo assim.
   Marina me abraça beijando a minha testa.
   _Que gracinha... Soltem as pombinhas, a paz mundial voltou!
   _Não enche! -digo deitando na grama.
   Marina deita ao meu lado. Damos a mão uma para a outra eicamos vendo as nuvens.
   Mas tarde, eu enfiei o rabinho entre as pernas e fui pedir desculpas para os pais da Marina. Eles me desculparam e pediram desculpas também por qualquer coisa que tenha me chateado.
   Até para o Joaquim eu pedi desculpas. Mesmo ele não me fazendo nada e eu também não fazendo nada a ele, eu pedi mesmo assim. Pedi desculpas por não ter dado muita atenção a ele, disse que ele me lembrava alguém de que um dia eu gostei muito e já não estava mais entre nós.
   _E eu não sabia como agir vendo o senhor e me lembrando dele.
   _Ah sim, entendo!
   Ele não é de muitas palavras.
   Bom pra mim que não precisei entrar em detalhes dizendo quem era ou o que fosse. Peço desculpas mais uma vez e o deixo sozinho limpando o carro.
   O jantar ocorreu tranquilamente.
   ACHO!!
   A tal da Maria me testou.
   _Pode me passar o sal, Raquel?
   _Claro! -digo lhe passando o sal.
   _Obrigada.
   _Amém!
   Marina levanta o seu copo.
   _Um brinde a família Ovalles! -diz segurando a minha mão em cima da mesa.
   Brindamos a família Ovalles.

NÃO É A MINHA CULPA SER ASSIM!!!  (Volume 1)Where stories live. Discover now