II | A estrela sobre a relva

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Coisas estranhas aconteciam com Selena desde que ela ainda era um bebê. Parecia ser um imã para acontecimentos sobrenaturais. Certa vez, enquanto dormia em seu berço, foi visitada por um homem cujos fios eram como cascatas de um rio banhado à prata. Aquele homem criou uma empatia pela pequena muito antes desta abrir os olhos após o nascimento. Desde seu primeiro dia na casa de vovó, ele fazia questão de visita-la e após aquela noite, não parou mais. Ele aparecia todas as madrugadas para vê-la, passava horas vigiando a pequena Selena, contudo, desaparecia como fumaça quando o sol se erguia no horizonte e iluminava o quarto. Anos se passaram e aquele homem nunca a abandonou. E em nenhuma vez permitiu que Selena o visse, até quando esta se levantava à noite para beber um copo de água.

Certa vez, quando Selena tinha três anos, viu o que pareceu ser um gnomo carregando uma muda perto da floresta. Selena estava com seus brinquedos no quintal da casa naquele momento. Ele era do seu tamanho devido ao barrete vermelho na cabeça e tinha em seu rosto uma espessa barba acinzentada. Queria se aproximar dele e quando este a notou, fugiu amedrontado, largando a muda no chão. No dia seguinte, ela se sentou no mesmo lugar em que o gnomo esteve, a fim de que pudesse vê-lo novamente. Isso perdurou um mês inteiro; ele, porém, nunca mais retornou.

— O que faz aí, Selena? — perguntou vovó Gwen quando a viu sentada na grama olhando para a floresta.

Também haviam as esferas brilhantes que sempre apareciam para a menina. A primeira vez aconteceu quando estava ela e Artur deitados olhando para as estrelas, tinham acabado o jantar e o vovô os observava da janela. Estava concentrada na estrela mais brilhante do céu quando uma estranha luz surgiu a alguns passos à frente dela, na orla da floresta. Selena sempre desconfiou que havia algo naquele lugar que a chamava, contudo, sempre havia alguma situação para impedi-la de seguir adiante.

— O que é aquilo?

Levantou-se sem tirar os olhos da estranha esfera luminosa.

— Aquilo o quê?

— A luz... — Apontou para tal.

Artur olhou para a prima, confuso.

— Do que está falando?

E então, Selena olhou para ele e voltou a apontar para a luz, contudo, quando olhou novamente para ela, esta não estava mais lá.

Não era só em casa que elas apareciam. Certa vez, durante o recreio, quando estava sentada com os colegas de classe, novamente viu as esferas em plena luz do dia. Reluziam fracas, porém, o suficiente para atrair o olhar dela. Desde então, as aparições começaram a ser constantes. Era inevitável não as ver, pareciam chama-la para algum lugar. Quando um dia, enfim, arriscou-se a segui-las, vovô José surgiu ao seu lado, ele não disse nada, apenas levou a mão ao ombro da neta e quase que imperceptivelmente balançou a cabeça.

— O senhor as vê também?

— É desaconselhável segui-las, minha querida — respondeu, com a voz rouca de assombração.

Sonhos quase nunca fazem sentido; com Selena não era diferente. Desde pequena foi vigiada e protegida de qualquer mal por aquele homem. Este, no entanto, não podia protege-la da própria mente, cujos sonhos mais pareciam filmes de terror. Um personagem recorrente de seus pesadelos era o gigante lobo negro, cujos olhos brilhavam como estrelas rubras, sedentos por sangue. Sempre que aparecia, ele corria atrás da menina, e quando pega, acordava completamente assustada. Em uma dessas vezes, trovejava lá fora. O vento assobiava agourento ao passar pela janela. A pequena Selena então correu para o colo da vovó Gwen, que a acolheu com um abraço reconfortante em seu quarto.

— Está tudo bem, minha pequena princesa de gelo. Lembre-se das histórias que lhe contei. Você é a princesa de gelo, não precisar temer nada se a coragem morar dentro daqui. — Colocou a mão sobre seu coração.

Princesa de Gelo: O Legado da Aurora [Vol 1]Where stories live. Discover now