O Sonho

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- Andrew? - sussurrei confusa.

Estava escuro naquele beco, mas o pouco de luz da lua que inundava o ambiente me permitiu reconhecer o herói. Ele batia com fúria no homem que tentou me esfaquear, de modo que o mesmo se encontrava com o rosto ensanguentado e já estava desacordado, Andrew estava em cima dele ainda o socando com raiva explícita. O homem que estava me segurando foi até o local onde o canivete caíra e o pegou ; ele se pôs a caminhar , tão cauteloso quanto uma serpente, em direção a um Andrew totalmente distraído socando seu adversário. Percebi sua intenção e antes que eu pudesse falar algo meu corpo se moveu sozinho, quando dei por mim estava correndo em direção a Andrew sem que ninguém me notasse.

- Nãoo! - gritei me pondo entre o andrew e o agressor.

O homem não teve tempo de mudar o rumo das coisas, seus olhos se arregalaram ao me ver em sua frente e o tempo pareceu correr mais devagar, em câmera lenta como se estivesse estagnando.

Senti a lamina perfurar minha barriga; ela era fria, mas me queimava a medida que perfurava minha carne. Pude sentir o cheiro da morte, ou talvez tenha sido apenas o cheiro do sangue que escorria pelo meu nariz, experimentei uma dor aguda, constante e violenta; o sabor do sangue se fez presente em minha saliva. O canivete afundou até o cabo; a morte me pareceu o único fim provável, mas eu não estava preparada para morrer. Pude imaginar o sofrimento de minhas irmãs e da Lucy, o desespero do meu pai e da Liz e a dor mortal que minha mãe sentiria. Senti a dor piorar e o local do corte latejava.

Em pensar que eu morreria assim, que deplorável! morreria pelas mãos de um desconhecido sujo. Apesar de tudo não me arrependia e para o horror de meu agressor, e minha própria surpresa, eu estava sorrindo. Tentei corrigir minha postura, porém tudo estava ficando escuro e distante; senti meu corpo fraquejar e caí, contudo não a cabeça contra o chão pois alguém impediu.

- Por favor não morre - era Andrew, seu rosto estava perto o suficiente para que eu pudesse ver seus olhos lindos, que no momento estavam marejados. - fica comigo. - disse tentando vencer sua vontade de chorar.

- Eu gosto dos seus olhos - falei a ele, com a voz embargada pela dor, Andrew sorriu ao ouvir minhas palavras, mas logo seu sorriso foi se desfazendo junto com minha visão e meus sentidos. Me afoguei na escuridão.

Eu estava em uma campina, pelas flores sei que é primavera, usava um vestido rodado que ia até o meio da perna na cor bege rosado, sendo ele justo até a cintura e de alças largas. O vento soprava fazendo meus cabelos se agitarem, as arvores na margem da campina permitiam que suas copas dançassem em perfeita sincronia com o vento. Me senti livre, de uma maneira que nunca senti antes ; me vi correndo pela campina com um sorriso no rosto, fiquei no centro da campina e comecei a girar freneticamente em êxtase. Continuei girando por alguns segundos quando em uma das voltas meus olhos se depararam com uma figura recostada ao tronco duma das arvores na margem da campina enquanto me encarava. Pousei o olhar sobre ele, tentei assimilar quem era o estranho que me observava; ele começou a andar em minha direção com um sorriso no rosto que me fez sorrir também, estava tão muito bem vestido que eu podia jurar que era um príncipe do século XVIII, não desviei o olhar nem por um segundo. Já estávamos bem próximos quando me atrevi a romper o silêncio.

- Andrew eu preciso lhe confessar que ... - parei ao notar algo estranho, ele não reduzia a velocidade, Andrew estava a olhar através de mim e seu sorriso não era para mim.

Ele passou por mim e seguiu para a loira de olhos claros que o encarava e sorria. Andrew lançava para ela um sorriso terno e lhe deu um beijo apaixonado ; odeio admitir mas aquilo doeu, a agonia e a sensação de estar sendo roubada me corroía, a dor era tão intensa que desejei morrer. Andrew nem ao menos me notou alí, me senti abandonada e insignificante. Corri em sua direção para tentar separa-los, porém quanto mais eu corria, mais distante eu parecia estar. Eu chorava amargamente.

O Diário de MarriêOnde as histórias ganham vida. Descobre agora