VIII

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  Já eram três horas da tarde. Eu fui um pouco cedo demais para a sorveteria. Eu estava um tanto paranóica. Eu não queria contar para ele o que aconteceu.

  Passaram-se trinta minutos e nada de Renato. Ele estava definitivamente muito atrasado.

  Enquanto eu o esperava, peguei um copo de Milk Shake, e depois, Ângelo aparece do nada, em uma cadeira ao meu lado.

  — É hoje que você revela todos os seus sentimentos para o seu grandioso amor da sua vida, né? – Ele perguntou num tom de sarcasmo.

  — Ele não é o amor da minha vida e eu não tenho sentimentos por ele. Apenas vamos conversar, como sempre fizemos. – Bufei.

  — Não tem sentimentos por ele? E o que foi aquela conversa toda que você teve com a Gih? – Questionou me encarando com aqueles olhos que deixariam qualquer uma totalmente louca.

  Arregalei os olhos.

  — Espera aí, como você sabe o que eu conversei com a Gih?

  Ângelo deu uma risada.

  — Meu amor, eu estou em todos os lugares, mas você não vê. Simples.

  Respirei fundo. Aquele cupido podia ser um desastre, mas ele era um bom ninja. Não importa o quão escondida eu esteja, ele sempre dá um jeito de ver e ouvir o que eu estou fazendo. Parecia até um stalker.

  Como sempre, nós dois ficamos em silêncio. Isso sempre acontecia com nós, mas nunca ficava um clima constrangedor. Parecia até que éramos melhores amigos, que até no silêncio nós ficávamos à vontade.

  Ele me encarava profundamente com a cabeça apoiada na mão, é o braço apoiado na cadeira. O silêncio então se quebra quando um celular vibra.

  Antes que eu pudesse ver se foi o meu, ele me interrompeu:

  — Relaxe, foi o meu.

  Vi então ele tirando um celular do bolso, de uma marca bem cara. Ele estava fazendo questão de mostrar que tinha um desenho de uma maçã mordida na parte de trás. Me surpreendeu bastante.

  — Não sabia que cupidos tinham celulares...

  — Na verdade eles não tem – Explicou Ângelo — Bom... Eu achei esse celular dentro de um bueiro. Talvez alguém deixou cair, sei lá. Eu peguei. Estava com a aparência de estar lá por uma ou duas semanas, então eu limpei ele e aqui está. Fiquei com pena de quem deixou essa belezura cair, pois vi em uma loja que estava por 6 mil reais.

  — Você fuça bueiros? – Ignorei a história completa, pois a única parte que me chamou atenção foi que ele achou esse celular em um bueiro.

  — Bom, e-eu... – Ele ficou vermelho. Tipo, muito. Tão vermelho que chegava a ser roxo — Sim. Mas é que às vezes tem umas coisas legais dentro deles sabe? Uma vez eu achei uma chave de um carro, mas o dono tava desesperado por ela então eu devolvi...

  Antes que ele terminasse de falar, Renato entrou pela porta da sorveteria e viu nós dois. Como ele nos viu, não tinha como Ângelo simplesmente sumir do nada, senão ele poderia ficar assustado ou pensar que tinha alucinações. Então meu cupido teve que ficar lá e arranjar um jeito de sair.

  — Oi... – Ângelo falou sem jeito — Eu já estava de saída.

  Ele se levantou e foi embora apressadamente. Tirando o fato que ele levou uma topada com o mundinho em uma mesa do lado, tudo até que correu bem na saída dele.

  — Esse não é o cara do shopping? – Perguntou Renato, se sentando onde estava Ângelo.

  — É. – Respondi. Eu estava muito nervosa por algum motivo. Eu não sabia direito o porquê.

  — Você está se tremendo um pouco... Mas tá um calor de 35 graus! – Exclamou com as sobrancelhas franzidas — O que diabos tá acontecendo? Esse cara fez alguma coisa com você?

  Olhei para minhas mãos. Elas realmente estavam tremendo um pouco. Isso acontece quando eu estou nervosa.

  Rapidamente, tirei minhas mãos que estavam em cima da mesa e coloquei-as na minha perna, só para disfarçar um pouco.

  — Não, ele não fez nada. Acho que você tá vendo coisas, eu não tô tremendo – Menti para poder desviar logo o assunto — Mas então, viemos aqui pra falar de você, não de mim.

  — Ah sim! – Exclamou — Enfim, o que foi que aconteceu ontem? Eu perguntei pro Lucas, mas ele não quis me contar nada.

  Mordi meus lábios inferiores. Eu não queria contar para ele que ele me beijou. Isso poderia estragar a amizade ou sei lá. Então decidi omitir algumas partes.

  — Bom, teve uma hora que eu estava no banheiro e, do nada, você entrou. Você tava totalmente bêbado, apesar de só ter tomado 2 latas de cerveja. E, enfim, chorando. Te perguntei o que tinha acontecido, e você disse que viu a Gih ficando com... Bom, meu ex. Você disse que é totalmente apaixonado por ela e me... Quer dizer, foi embora. Isso é tudo de interessante que aconteceu. – Falei, quase deixando escapar a parte do beijo, mas falei.

  Foi quando eu parei para refletir: Gih tinha me falado que ela e Renato já se pegaram e tão super de boas. Por que eu ocultaria isso?

  A resposta é simples: eu sou cagona.

  Olhei para Renato, e ele estava vermelho.

  — Bom... Isso é verdade – Ele suspirou — Eu tô totalmente apaixonado pela Gih. Eu sei que não deveria, mas eu tô.

  Lembrei que Gih tinha me dito que não gostava dele do jeito que ele gostava dela. Engoli em seco, e por algum motivo, eu estava feliz com esse fato, mas ao mesmo tempo triste pelo Renato.

  — E eu sinto que ela sente a mesma coisa que eu – Continuou — Ainda tô juntando coragem pra pedir ela em namoro.

  Quando ele falou isso, me engasguei com o Milk Shake que eu estava tomando. Meu Deus, o coitado é trouxa demais.

  — Você acha que eu tenho chance com ela? – Perguntou, ignorando completamente minha engasgada.

  — Sim, 100% de chance meu amigo! – Soltei isso tão rápido que eu nem tinha percebido. Me senti meio mal por ter mentido outra vez para ele. Quer dizer, eu não estava mentindo outra vez, até porque na história eu só omiti um fato, certo?

  — Que ótimo! – Ele sorriu — Bom, eu tenho que ir. – Renato se levantou da cadeira.

  — O quê? Você chegou agora!

  — Me desculpa, mas eu preciso ir falar uma coisa meio que urgente para o Lucas – Disse enquanto se aproximava da porta — Muito obrigado Dani, a gente se fala outra hora!

  Ele foi embora, junto com a minha dignidade, que já era inexistente naquela hora. Por que que eu tinha que ser tão otária? Por que que eu menti para o meu amigo? Por que eu sou tão trouxa? Por que eu simplesmente não confessei que ele me beijou, eu revelava meus sentimentos por ele, aí a gente se beijava e ficava feliz?

  Epa, o que diabos eu tava pensando?

  Quando, do nada, uma voz muito conhecida para mim, fala no meu lado:

  — O coitado vai ficar iludido pelo resto da vida e a culpa é sua.

  — É, eu sei disso Ângelo. A minha função na Terra é só ferrar as coisas e piorar as que já tão ferradas. Socorro.

 
 

 
 

Meu cupido é um desastreWhere stories live. Discover now