É você?

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Ana se virava de um lado para o outro na cama, seu corpo suava mesmo com o ambiente frio, em um movimento brusco se pôs sentada, seu peito se contraia e se expandia rapidamente, as mãos trêmulas foram levadas para seu pescoço e logo depois para o rosto enquanto tratava de controlar a sua respiração. Ao seu lado Luana dormia serenamente e Ana agradecia em silêncio por não acordá-la. Levantou-se com cuidado e arrastou seu corpo para o banheiro, o dia já estava quase clareando lá fora e Ana certamente não dormiria mais.

A semana tinha sido difícil, Ana quase não saiu do quarto, apenas saia para comer ou quando Luana insistia muito para que ficasse na sala batendo papo com Felipe e ela, o que não era algo ruim, os dois conseguiam fazer Ana se sentir melhor de uma maneira inexplicável, Ana tentava não demonstrar tanta tristeza perto dos irmãos, Luana já estava preocupada demais por estar grávida e não ter um emprego, Felipe estava cabisbaixo pois Felí o enrolava há semanas, Ana não queria ser o centro das atenções outra vez, então era assim que fazia, sorria quando tinha que sorrir, se trancava no quarto com a desculpa que precisava fazer trabalhos e estudar, Gabriela ligava todos os dias para contar como tinham sido as aulas e quais eram os trabalhos para fazer, já que naquela semana Ana não tinha ido para a faculdade, sua desculpa era uma virose qualquer, comia o máximo que conseguia, mesmo sendo mínimo para viver e evitava pensar, o que era irônico pois Ana pediu um tempo para Vitória para que pudesse
pensar, mas Ana tinha medo, não queria pensar; pensar traria de volta todo o rancor que um dia sentiu por Daniela, a levaria para um ponto de sua vida que um dia jurou ter ficado para trás, traria tantos questionamentos não saudáveis, a faria justamente pensar em Daniela e Ana não queria.

Enquanto deixava a água quente molhar seu corpo e assistia o vapor embaçando o box Ana lembrou-se da última frase dita em voz alta por Vitória“eu sei que isso não é sobre mim, mas eu preciso de você”, aquela frase atormentou os pensamentos de Ana a semana inteira, o vazio que Vitória  deixou ao sair era interminável e mesmo assim Ana não pôde deixá-la ficar, não podia deixar Vitória  ficar e ver como Ana
era fraca quando Vitória precisava de alguém forte por perto. Vitória  precisava de alguém forte por perto, Ana precisava ser forte, simples assim. Mas no fundo Ana
sabia exatamente que não era apenas isso que a fez pedí-la para ir, no fundo do seu peito, na parte mais obscura e egoísta de sua alma insegura e ferida Ana pensava que Vitória  a deixaria assim como um dia Daniela  fez, Ana temia ser abandonada outra vez
e em sua cabeça imatura se afastar era a melhor maneira para que isso não acontecesse, não conseguia enxergar que o abandono estava partindo dela, Ana estava cega, uma cegueira nascida do medo, que crescia e era regada todos os dias pelos seus choros silenciosos, pelos gritos abafados em seu travesseiro e pela saudade. O que era algo bem incoerente, pois a saudade era o fator mais fácil de ser vencido e mais difícil de ser ignorado.

O choque de encontrar Daniela e descobrir que era prima de Vitória estava passando aos poucos e aos poucos Ana conseguia raciocinar o que aquilo realmente significava, precisava enfrentar seu passado, apenas isso, precisava admitir que Daniela tinha ficado no passado e que agora seu presente era lindo com Vitoria ao seu lado, precisava perdoar Daniela, precisava se perdoar.

Alcançou a esponja e começou a esfregá-la pesadamente em seu corpo, era impossível pensar em Daniela e não se sentir suja, sentia vergonha de seu passado com a mulher que um dia amou, sabia que não podia se eximir da culpa de tê-la amado com todas as suas forças, de ter desejado e acreditado em uma mulher casada, sentia-se tão fraca diante de tudo aquilo. Ana esfregava com força a esponja em sua pele lembrando-se de todas as mensagens de preocupação e amor que Vitoria mandava todos os dias, de como estava sendo injusta com a mulher que amava, mas precisava fazer isso sozinha, Ana sabia que precisava se restabelecer para que Vitória não a abandonasse. Ana tinha que fazer isso sozinha. Era isso que pensava.
Quando finalmente sua já avermelhada pele ardia muito Ana parou, fechou o registro do chuveiro e se concentrou em sua respiração para não ser flagrada chorando pela irmã. A dor transferida para seu corpo não fez com que seu coração parasse de doer.
Saiu do box e se enrolou na toalha, escovou os dentes encarando sua face no espelho, sua aparência era deprimente.

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