Capítulo 13

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< POV Luísa >

21 de julho. Sábado. Ana Caetano ao vivo em Londres. Meu coração estava prestes a sair pela boca. 7h da manhã. A primeira da fila, junto com Helena. Não haviam grades, seguranças, nada. Só eu, minha irmã, e pessoas andando pela rua. Ana ainda não havia chegado no Royal Albert Hall, nem mesmo sua equipe. Não tinha visto Felipe e muito menos Isadora. Em alguns minutos Eduardo chegaria para nos fazer companhia e surtar quando Ana chegasse ao local do show.

"Luísa? É você?", disse ele, enquanto se aproximava de nós duas. Ele era meio ruivo, tinha os cabelos cacheados e era também muito alto. 1.76, por aí.

"Eduuuuu!", berrei, e fui correndo em sua direção. Nos abraçamos, sentamos de volta na fila e então ficamos conversando por horas e horas até finalmente a equipe começar a chegar.

Isadora foi a primeira. Ela desembarcou do táxi e passou reto por nós, ainda que gritássemos seu nome tentando chama-la para conversar. Depois de um tempo, mais algumas fãs chegaram, e os seguranças começaram a arrumar a fila. Colocaram grades e dividiram as entradas por setores.

Por volta das 11h30, Felipe e Ana chegaram. Também desembarcaram de um táxi em frente à casa de shows, e dessa vez passaram por nós. Só eu e Eduardo clamávamos para que os dois viessem até a gente para tirar uma foto. Edu tinha conseguido conhece-la na quarta-feira, no voo para Londres, o que eu acho que fez ela vir falar conosco. Assim que eles se aproximavam, meu coração passava a acelerar mais rápido. Quando grudou na grade e disse um "oi" seguido de um sorriso, meu corpo quis desligar. Edu estava um tanto quanto calmo enquanto conversava com ela, mas eu estava paralisada. A única ação que eu fui capaz de fazer foi cutucar Helena e manda-la levantar para que falasse com Ana por mim. Eu tinha comprado alguns presentes e queria entregar a ela. Minha irmã, como já havíamos combinado, fez isso por mim.

"É... isso daqui é pra você. Minha irmã comprou pra te dar", naturalmente, ela ergueu a sacola de papel para Ana. A morena agradeceu com o sorriso mais sincero do mundo enquanto abraçava Helena. Ela então me chamou para abraça-la também. Eduardo me empurrou, e eu fui. Foi ali que eu descobri o que era um abraço de verdade. Um abraço casa. Era aquilo ali. Eu estava tremendo um pouco até demais, e os seus braços em volta de mim me acalmaram de uma forma que eu nem sei explicar.

< POV Ana >

Quando eu saí do carro e vi aquelas 10 pessoas na fila, a única coisa que se passou na minha cabeça foi "graças a deus, esse show não vai ser um desastre". Cutuquei o Fê e disse que queria ir até elas. E fomos. Assim que íamos nos aproximando, a imagem das duas meninas se tornava cada vez mais clara na minha cabeça. Luísa. E Helena. Felipe também reconheceu, e só sussurrou um "aja normalmente" na medida que chegávamos mais perto. Meus olhos encheram de lágrimas, e eu tive que contê-las. E lá estava eu, grudada na grade da fila. Dei oi, tentei ser mais simpática possível. Luísa estava parada. Ela não sabia como reagir. Desacreditada, com certeza. Conversei com o filho de Vitória, que por mais incrível que parecesse, estava junto com elas. Helena, tímida, se aproximou e ergueu uma sacolinha, e disse que era presente de sua irmã, Luísa. Peguei, e sorri. Abracei a pequena, e depois chamei a maior para um abraço também. Ela estava realmente sem reação, não sabia o que fazer além de ficar entrelaçada por meus braços. Eu não queria soltar, e eu sabia que ela também não.

Por causa da sua reação, pude perceber que ela não sabia que eu era sua mãe. Ela não lembrava. Mike era realmente nojento. Minhas próprias filhas não lembravam da nossa relação, e isso fazia o meu coração quebrar, despedaçar, e por fim, explodir.

Me despedi das meninas, fui tirar foto com as outras da fila e então fui embora. Entrei junto com Felipe no Royal Albert Hall. O sonho estava acontecendo, ali, na minha frente. O maior show internacional da minha carreira. Deixei minhas coisas no meu camarim e fomos até o palco. Que lugar lindo. Parecia o teatro municipal de São Paulo, só que melhorado e ampliado. Sentei na cadeira e fiquei observando por minutos até me dar conta que era real. Ana Caetano ao vivo em Londres era realidade, e tava esgotado.

< POV Luísa >

Eu ainda estava um tanto quanto desacreditada depois daquele momento. Eduardo teve de ir num restaurante para comprar água pra mim. Passando mal era apelido, eu estava morrendo. Ana Caetano tinha me abraçado, cara. ABRAÇADO!!!! Não foi um abraço qualquer, eu pude sentir seu coração batendo. Eu pude sentir cada pedacinho daquela mulher. O cheiro do seu cabelo, o cheiro do perfume que usava no pescoço, suas mãos, tudo. Ela era o amor da minha vida, e nada nem ninguém poderia me provar o contrário.

18h. As portas se abriram. Fui a primeira a entrar junto com Helena e Eduardo. Corremos que nem no filme Jogos Vorazes, quando o tributo não quer morrer. Ocupamos a grade. Estávamos exatamente na frente da cadeira que ela iria se sentar para cantar para 6 mil pessoas. Aos poucos a multidão vinha enchendo o local, e eu passava a me sentir um tanto quanto esmagada. Edu estava lá pra me dar apoio. Ele foi capaz de pedir aos bombeiros para que trouxessem água várias vezes, senão eu iria enfartar.

21h. O Royal Albert Hall escureceu. Tudo que eu conseguia ouvir eram gritos. A introdução do show começou a rolar e meu coração havia disparado novamente. Todos os pelos do meu corpo eriçaram, e eu estava paralisada mais uma vez. E lá estava ela, com um vestido vermelho, atravessando o palco até chegar na cadeira e pegar seu violão. Deus é mulher e eu posso provar.

Coração Carnaval. Dengo. Chamego Meu. Trevo. Cor de Marte. Te Encontrei. Singular. Janeiro. Clichê. Roda Gigante. Ai Amor.

< POV Ana >

Ai Amor era provavelmente a melhor e mais profunda música que eu já havia feito. Ela falava sobre Vitória. Falava sobre a falta que ela fazia na minha vida e o quanto eu queria ela de volta. Meus olhos marejaram por completo enquanto eu cantava. Quando abria, eu só sabia olhar para Luísa, na minha frente, que cantava a letra com toda a força do mundo. Ela mal sabia. Sorri para ela, e então passei a olhar para o horizonte. Enxerguei cabelos cacheados no meio da galera. Enxerguei cabelos cacheados e loiros, da mulher de mais ou menos 1.70. Dos olhos cor de marte e da pele mais macia do mundo. Além do sorriso mais bonito que eu já havia visto.

Vitória Falcão estava lá também.

Terminei a música e saí do palco. Isso não estava no roteiro, mas meu coração pedia para não voltar. Ele não iria aguentar até o final.

"Felipe, eu não consigo. Eu não consigo voltar. Eu não sei o que fazer", comecei a dizer, enquanto a maquiagem do meu rosto passava a borrar de acordo com as lágrimas que desciam no meu rosto. Ele pedia para que eu explicasse o motivo, e eu não sabia falar. As únicas quatro palavras que saíam da minha boca eram: eu. não. consigo. voltar. Ele olhou para os lados, respirou fundo, se abaixou, pegou nas minhas mãos e começou a falar.

"Ana, esse é o maior show da tua vida. Ele tá esgotado. A gente esperou por tanto tempo pra ele acontecer, e você vai desistir assim, por causa de uma pessoa que tá no público? Beleza, é difícil, eu sei, tô ligado. Eu sei o que aconteceu entre vocês duas" ele inspirou, expirou e voltou a falar. "Olha, aquelas duas meninas ali na tua frente não gostariam que você acabasse o show na 11ª música. Não decepcione elas, elas te amam, e eu sei que você as ama também. Vou falar com os seguranças, eu peço para que levem elas pra te verem no final, mas não termina assim. Pode ser? Você consegue?"

Ergui a cabeça. Passei a mão no rosto. Tirei um tantinho da maquiagem para parecer ao menos que não estava chorando. Felipe havia tocado nas minhas filhas, e eu não queria decepcioná-las. Forcei um sorriso, o abracei e voltei para o palco. Sentei na cadeira. Olhei para o público, que gritava animado. Meus olhos voltaram-se novamente para Luísa e Helena. Pairei o chão, sorri.

"Londres! Vocês tão um tanto quanto animados, hein? Vambora. Tô emanando amor daqui, enviando boas energias aí pra vocês, então façam o mesmo e bora fazer isso aqui continuar sendo lindo, combinado?"

Tua. Fica. Cores. Nós. Talvez a Deus. Mistério. Emmylou. Palavras no Corpo. Me Abraça. Beija Eu. Agora Eu Quero Ir.

Saí do palco. Esse era o momento que todo mundo achava que eu estava indo embora de vez, e que não iria voltar. Demorei um pouco, e voltei animando o público com Dê Um Rolê, acústico. Eu era o amor da cabeça aos pés, e aqueles dois pedaços de gente na minha frente também eram, aquele guri do lado delas também era, e aquela mulher, no meio da multidão, era ainda mais que todos nós juntos.

Encerrei o show. Dessa vez saí do palco de vez e fui para o camarim. Fui parada algumas poucas vezes para agradecer a produção, conversar com algumas pessoas e tudo mais, e então quando cheguei, minhas duas meninas lá dentro, sentadas observando o local.  Tudo que meus olhos sabiam fazer no momento era soltar lágrimas sem parar.

a arte entre nósWhere stories live. Discover now