Alguém para você

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Dentre as várias desilusões amorosas que vieram depois de Joe Hummfray, fui me perdendo, até que finalmente percebi que o amor não serve para mim e aqui estou eu hoje, com meus plenos 17 anos, no último ano do ensino médio, sobrevivendo a esse mundo de amores tóxicos, mesmo tendo um coração de vidro.
O caminho para a escola não era tão longo, então sempre preferi trilha-lo a pé. A manhã estava nebulosa, tal como meus pensamentos e ansiedade sobre o tão esperado, primeiro dia de aula.
Ao chegar na escola posso notar os milhares de olhares estranhos, me cercando. Ando rapidamente adentrando o enorme campus, de cabeça baixa, tentando desviar os olhares sobre mim. Meu coração estava acelerado e minhas mãos suavam como nunca. Sentia como se estivesse andando estranho, como se tivesse desaprendido como se andava, isso tudo, um efeito dramático de minha timidez.
De longe posso observar Savannah cercada por líderes de torcida e jovens jogadores do time de futebol da escola, extremamente clichê, até mesmo para mim. Desvio os olhos de sua pessoa e sigo andando rapidamente, seguindo pela direção direita, pelo extenso corredor, repleto de armários semelhantes, cercados de pessoas. Como em todo ano, desde que fui estudar naquela escola chique, meu armário não havia mudado, então já era automático ir até ele sem sequer perceber. Abro o armário com certa facilidade, a combinação do cadeado roxo ainda era a mesma, uma porção de números aleatórios. Jogo alguns cadernos para dentro do armário e como esperado, meus livros já estavam ali, juntamente com a folha de horários. A escola era realmente muito bem programada e organizada, não era à toa que meu pai sempre fazia questão de expor que pagava caro para estudarmos ali. Pego a folha dos horários em minhas mãos e à leio rapidamente, conferindo as aulas que teria naquele dia. Jogo alguns livros para dentro da mochila, junto com os cadernos que ali estavam e logo ouço o sinal ensurdecedor tocar, fazendo com que os corredores começassem a esvaziar de forma rápida. Respiro fundo algumas vezes enquanto caminho rumo ao segundo andar, onde ficava a sala de biologia. Quando estava a poucos passos da porta branca emadeirada, sou cortada por Savannah que atravessa a minha frente.
-Olá, irmãzinha!-Ela diz de forma alegre, enquanto lança seus longos fios loiros para trás, fazendo-os voarem com o vento.-Achei que já tinha começado com seu hábito de faltar, quando percebi que não tinha ido me procurar...
-Isso foi antes ou depois de perder a atenção de todo mundo?!-Digo rapidamente, em um tom certamente arrogante. Suspiro, me recompondo.-Desculpe...Estou nervosa pelo primeiro dia de aula.
-Credo, percebi. Sempre mau humorada, Alice...Desse jeito vai ficar sozinha.-Ela diz exibindo uma expressão ligeiramente enojada.-Vou para a aula...Beijinhos, sis!-Ela joga beijos pelo ar e logo segue a andar pelo longo corredor.
Adentro a sala com certa raiva, o que dava impressão de confiança. Me sento no primeiro acento que vejo, era o primeiro da fileira, eu havia prometido para mim mesma que esse ano não seria tão tímida e sentar bem no primeiro acento da fileira, era o mínimo que conseguia fazer por agora.
Posso ouvir os burburinhos e rumores caírem sobre meus ouvidos " Ela engordou!" "como pode a Savannah ser tão linda e ela tão...?!". Suspiro,mordendo a parte interior do meu lábio inferior, por conta do nervosismo. Já estava cansada, todo ano eu assumia o papel da irmã desajeitada, a sombra de Savannah Hale e nem sabia porque me permitia passar por isso.
Um silêncio repentino se instalou no recinto enquanto mudavam o foco das fofocas milenares. De repente, mais buburios começam, mas dessa vez não eram sobre mim, falavam sobre algo que só pude entender quando olhei para cima e direcionei meu olhar sobre a porta de entrada. Um jovem alto de cabelos e olhos castanhos, ombros perfeitamente largos e abdômen desenhado, ao que se podia notar sobre a camisa um tanto justa. Ele passou pela porta de forma confiante, foi quando pude perceber que ele tinha um rosto padrão, com aquele olhar arrogante e um estilo típico de garoto babaca, mesmo parecendo novo por ali. Reviro os olhos ao ouvir os sussurros das garotas populares se derretendo pelo garoto tão antipático, enquanto o mesmo, apenas ignorava e distribuía desprezo à todos.
-Por favor, se apresente!-O professor Lincon incentivou o garoto.
-Travis Collins!-Ele respondeu em voz alta, sem demora. Sua voz rouca fez um leve arrepio correr minha espinha. O jovem caminhou exibindo um andar imponente, antes de se sentar na carteira atrás de mim. Suspiro, um tanto alto, não era possível que eu teria que aturar mais um garoto babaca na minha sala, ainda mais, tão próximo à mim.
As aulas naquela manhã passaram tão rápidas quanto um sopro tedioso e monótono.
Esfrego meu olhos contendo o sono que me dominava, afinal, levantar durante a madrugada para ajudar minha mãe a confeitar bolos não era uma tarefa nada fácil.
Me levanto e junto calmamente meus materiais espalhados pela carteira, quando sinto um esbarrão forte no lado direito do meu ombro, o que me impulsiona para frente. Olho de relance a jaqueta de couro do mais novo babacão da escola, sair da sala e reviro os olhos, já irritada. Minha atenção se volta à um belo garoto ao meu lado, que me encarava atenciosamente.
-Você está bem?- Ele questionou amigavelmente. Franzi o cenho, em confusão. Ele parecia estar ali à algum tempo já e eu sequer havia notado sua presença.-Ele foi desagradável com você!-Afirmou o mesmo, com um sorriso singelo nos labios. Concordei meio incerta e demonstrando minha timidez aparente.
-Eu sou Dylan!E você é Alice, certo?-Ele se apresentou de forma estranha e assustadora à mim. Me questionava como ele poderia saber o meu nome em tão pouco tempo.
-Sim...-Pronuncio de forma calma e um tanto desconfiada.
-Eu ouvi seu nome na chamada!-Ele se explica, ao perceber minha expressão estranha. Sorrio suavemente, levando uma pequena mexa do meu cabelo para trás da orelha, enquanto ouço o professor resmungar algo sobre ainda estarmos na sala.
-Com licença...-Passo por ele, apressada correndo pelo corredor à fora, sem me preocupar se o garoto tinha algo mais a dizer.
O restante das aulas pelo dia, foram tediosas e insignificantemente improdutivos, tudo o que conseguia pensar era no momento mais estranho ao lado do jovem alto, de rosto carismático, Dylan.
As aulas já haviam acabado e eu estava atravessando o extenso campus, para chegar à saída da escola, quando posso ver à certa distância, o carro do meu pai, apanhando Savannah na entrada da escola. Ele recebeu ela com um belo sorriso e um abraço carinhoso, eu tinha esperança, pensei que pelo menos uma vez na vida ele iria esperar por mim e me tratar da forma que realmente merecia, com carinho. Mas novamente, ele partiu e me esqueceu naquela maldita escola, enquanto dirigia pelas extensas ruas de San Diego.
Começo a trilhar meu caminho até minha humilde casa, andando em passos longos e furiosos, enquanto o som alto dos fones de ouvido, atingem meus tímpanos de forma agradável. As vezes eu não conseguia medir o quanto me afetava ser tão excluída pela minha própria família, não conseguia definir em palavras o quanto me magoava ser sempre a última opção de todos, a ovelha negra e defeituosa da família, mas era tão estranho como eu conseguia superar tudo isso enquanto estava junto de meus familiares, era como se os bons momentos, valessem a tristeza e angústia que me faziam passar. "And if the sun's upset and the sky goes cold. Then if the clouds get heavy and start to fall.I really need somebody to call my own.I wanna be somebody to someone. Someone to you..." o refrão tocante e evasivo, contagia cada nervo de meu corpo, quanto sinto a primeira gotícula fria atingir minha bochecha e como em um rápido passe de mágica, uma onda repentina de chuva começa a despencar aos sete ventos.
Me encolho, aumentando a velocidade de meus passos ferozes, quando vejo alguns carros passarem pela rua ao meu lado, de forma que a água já acumulada nas poças, me atingisse rapidamente. Em fração de segundos, o movimento dos carros havia diminuído, porém a chuva só tendia a aumentar. Olho ao redor, com o temor de nenhuma alma solidária aparecer para me ajudar e logo volto a olhar para a frente, quando percebo que a rua já estava quase deserta.
Minha mente estava turbulenta, meu coração gritava por ajuda. Como podia meu próprio pai ter me esquecido ali, ainda mais em um dia de chuva?!Como ele pode nem sequer voltar?!
Eu continuei a andar de forma determinada, apenas esperando para chegar em casa e finalmente poder derramar as lágrimas de decepção que tentavam me consumir. Ouço um motor renovado roncar, um tanto próximo à mim e então, o automóvel parece parar ao meu lado, na extensa rua asfaltada e de repente, uma luz se acende em meu coração, com o pensamento de que poderia ser meu pai e que ele não havia realmente esquecido de mim ali, mas o ar esperançoso desaparece rapidamente, quando rolo meus olhos para o lado e vejo que se tratava de um belo Porsche 918, um carro que meu pai, com certeza não usaria, já que julgava como "coisa de vagabundo".
-Hey garota...Quer uma carona?-A voz rouca, sooa de forma certamente calma e indiferente enquanto o jovem esbelto abaixa o vidro escuro do carro esportivo. Tento conter meu olhar surpreso quando percebo que se trata de Travis, o novato da escola. Seu semblante era sério, nunca deixando seu tom indiferente de lado. Olho ao redor, buscando uma forma de negar sua ajuda, mas estava realmente sem muitas opções. Tinha que tomar uma rápida decisão, eu entrava no carro com aquele garoto desconhecido, aparentemente arrogante e babaca ou eu morria de hipotermia. Não foi uma decisão tão difícil, quando envolvi a palavra morte, porque afinal, eu não queria morrer tão jovem.
-Vou molhar o banco do seu carro...-Sussurro um tanto insegura. Ele revira os olhos e da de ombros.
-Entra logo!-Sua voz rouca e baixa era incrivelmente sexy para alguém tão sério. Ele faz um rápido sinal com a cabeça para que eu entre no carro e eu logo me jogo no banco do passageiro, completamente congelada.
O olhos de Travis correram pelo meu corpo como uma avaliação. Um suspiro longo saltou de seu lábios avermelhados quando o mesmo arrancou sua própria jaqueta e a jogou sobre meu colo. Arqueio as só sombrancelhas em confusão e Travis bufa, irritado.
-Veste a jaqueta!-Ele diz, de forma bruta. -Não quero um cadáver no meu carro.
Assim que ouvi sua estranha frase franzi a testa em um rápido instinto, enquanto arrumava a enorme jaqueta sobre meus delicados ombros.
Percorremos mais algumas ruas em total silêncio, até que decidi tomar coragem e quebrar o silêncio cortante.-Então...Esta gostando da cidade?
Ele suspira, parece estranhar minha ousadia por lhe dirigir a palavra, o que era completamente estranho para mim. Ele logo solta um sorriso sarcástico, enquanto me olha de canto de olho.
-Pensei que ia odiar mais...Mas até agora, está me surpreendendo bastante!-Ele diz, de forma que me sinto intimidada por suas palavras sensuais.
Sinto meus lábios se contraírem em um sorriso inesperado, enquanto olho ao redor, tentando não demonstrar meu sorriso à ele e então, percebo que já estávamos passando pela rua onde morava.
-Eu moro aqui!-Solto, em um tom um tanto alto, proporcionado pelo nervosismo, quando meu coração acelera abruptamente dado ao temor de ficar mais um segundo com aquele jovem de olhar malicioso, no carro. Travis sequer me olha, quando pronuncio as palavras, não tinha certeza se ele havia me escutado e então uma onda de tremores nervosos atinge meu corpo, enquanto tento manter a calma, até que ele estaciona o formoso carro bem em frente a minha casa e meu coração sente o alívio repentino. Não sabia o que estava pensando ou sentindo exatamente, só sabia que queria saltar logo daquele carro.
-Obrigado pela carona!-Digo saltando rapidamente para fora do carro e correndo em direção a entrada da casa. Quando estou na metade do caminho, correndo próximo ao jardim frontal, posso ouvir sua voz firme pronunciar algo difícil de ouvir e apenas ignoro, adentrando a casa. "Espera...Você está com a minha jaqueta!"
Os minutos se passaram rapidamente enquanto eu almoçava e me preparava psicologicamente para enfrentar a multidão de clientes que possivelmente teria que atender na lanchonete de minha mãe.
O caminho até a lanchonete foi rápido e agitado, pois a cidade costumava ficar mais movimentada pela tarde, e graças aos céus a chuva havia cessado.
-Bom dia, Judy...-Digo, atravessando a porta dupla de entrada, da formosa lanchonete, sorrio involuntariamente quando ouço o tão famíliar sino de boas- vindas aos clientes tocar, me aproximando do extenso balcão de mármore negro.-Onde minha mãe está?
-Bom dia, pequena Lily...Sua mãe está na cozinha!-Ela diz, forçando sua voz rouca e falha à sair. Judith Givens costumava ser uma moradora de rua, até que minha mãe à encontrou e acabou simpatizando com seu delicado rosto idoso e resolveu ajuda-la. Ela era como uma avó para mim, adorava ouvir suas histórias de vida, por mais tristes que fossem, adorava estar a sua companhia e além do mais, ela fazia um bolo invertido como ninguém.
Olho ao redor e percebo que a lanchonete estava demasiadamente cheia e então posso ver a expressão exausta, no rosto de Judy enquanto ela vê mais um par de amigos cruzarem pela porta de entrada.-Porquê não vai descansar um pouco?-Digo levantando a pequena portinhola do balcão e logo atravessando para o lado onde Judy estava.-Posso cuidar daqui...
-Você é um doce, pequena Lily...-Ela diz, acariciando meu rosto de forma carinhosa.-Obrigado, querida!-Ela diz por fim, me entregando seu avental e logo,
adentrando a pequena cozinha, atrás de si.
Olho ao redor, pensando no que faria primeiro e logo me lembro da tremenda organização de Judy, nesse quesito éramos muito parecidas. Rolo os olhos pela parte interior do balcão emadeirado, a procura dos pequenos pedaços de papéis que Judy colava como etiquetas por todo o lugar.
-Mesa 7...-Sussurro ao pegar o primeiro papel em minhas mãos. Passo através do balcão, de forma determinada e logo, sigo em direção à mesa 7, onde finalmente posso ver os rostos que estavam a aguardar para citarem seus pedidos.
-Oi...Alice, não é?-A voz calma e cintilante de Dylan soou um tanto alegre.
-É...Oi!-Digo rapidamente, exibindo um sorriso singelo, enquanto passo meus olhos pelos outros rostos ali presentes, entre eles estava Travis, que até o momento, evitará olhar em meus olhos, enquanto mantinha sua pose de garoto antipático.
-O que desejam?-Pergunto mantendo certa firmeza na voz.
-Uma salada e um suco de laranja...-Uma garota com cara nada amigável destina sua voz sobre meus ouvidos-Natural!-Ela termina, enquanto concordo com a cabeça, tentando ao máximo não fazer contato visual com a mesma.
-Eu quero um milk shake de morango!-Um rapaz com piercing nas sombrancelhas diz, animado. Olho para Dylan esperando seu pedido, de forma paciente.
-Um refrigerante qualquer!-Ele fala rápido e sorridente. Sorrio de volta, e neste momento percebo o olhar de Travis sobre nós.
-E v-você?-Me praguejo mentalmente por gaguejar. Ele sorri de lado e não responde inicialmente.
-Quero minha jaqueta de volta, moça...-Ele diz simplesmente, exibindo o mesmo sorriso de antes.
Suspiro e sorrio suavemente, sem saber exatamente o que dizer.
-Nós vamos nos encontrar na praça, hoje à noite.-Dylan solta as palavras de forma rápida e decidida.-Seria legal se você fosse...
-É...Talvez eu aparece por lá.-Digo em meio a um suspiro um tanto desinteressado. Eu não costumava sair, muito menos com pessoas que eu mal conhecia.
-É...Aproveita e leva minha jaqueta!-Travis parecia um disco arranhado, usando o mesmo argumento com o mesmo sorriso irônico, sempre.
Solto uma risada nua e reviro os olhos, me afastando da mesa.
Após servir a mesa dos meus convidados ilustres, o dia se passou de forma calma e rápida. Já estava no fim da tarde quando decidi tirar o avental e terminar meus afazeres, o que eu não esperava era ainda ver Travis, sentado pacientemente, me observando atentamente. Caminho novamente até sua mesa e respiro algumas vezes antes de perguntar. -Mais alguma coisa?!-Uma pergunta um tanto tola, já que o mesmo não havia comido nada a tarde de toda.
-Estou esperando...-Ele sussurra, tirando o celular do bolso e mexendo no aparelho, sem me olhar.
-Perdão...Esperando?-Pergunto, incerta. O rapaz revira os olhos e solta o celular em cima da mesa, seguido de um suspiro relaxante.
-Você!-Ele afirma, completamente relaxado na cadeira. Arregalo meus olhos e posso sentir minhas bochechas esquentarem.
-Para você buscar a minha jaqueta...-Ele completa, sorrindo de forma irônica.
Suspiro um tanto alto. Será mesmo que ele não poderia deixar essa história um pouco de lado?!-Vou encontrar vocês na praça mais tarde, lembra?!
-Não parecia que você realmente iria então, queria apenas confirmar... Lembre-se de levar a minha jaqueta, garota!-Ele ordena de forma calma e como sempre, exibindo seu olhar singelo junto de seu sorriso irônico, enquanto se levanta e anda até a porta de saída, virando uma última vez para me lançar uma suave piscada de olho. Era estranho ele dizer aquilo, já que embora dissesse que iria, não tinha intenção real alguma de comparecer ao tal encontro.
Sorri involuntariamente, ao perceber a imagem de Travis me lançando uma piscada sedutora, atingir meus olhos de forma atraente.Olho ao redor e vejo que o lugar já estava praticamente vazio e então quando meus olhos cruzam pelo balcão de atendimento,posso ver minha mãe, fazendo um estranho sinal com as mãos, para que eu me aproximasse.
-O que foi?-Digo rapidamente, ao me aproximar do balcão de forma calma.
-Porquê não vai pra casa, fazer coisas da escola, descansar um pouco ou quem sabe marcar de sair com alguns amigos...?-Ela diz, de forma simples e insinuante.
-Mas tem coisas para fazer aqui ainda, mãe...
-Apenas...Pense mais em você, querida!Posso cuidar daqui...-Ela fala de forma sorridente e carinhosa, como sempre.
-Tudo bem...-Falo, retirando o avental de meu corpo, lentamente e logo, o jogando em cima do balcão.-Te vejo em casa!
Corro até o ponto de ônibus que ficava a poucos metros da lanchonete e logo estou a caminho de casa. Encosto minha testa na janela de vidro e começo a pensar no mais novo babaca da cidade. Será possível que ele iria me perseguir agora por uma simples jaqueta?!
Sinto meu celular vibrar no bolso do meu moletom preto e quando vejo, era mais uma notificação de publicação de minha nem tão querida irmã, Savannah. Abro a imagem no Instagram e vejo a bela moça loira, de sorriso esplêndido, na praça, cercada por amigos. Suspiro lentamente, era fácil para ela ser tão popular assim. Decido comentar algo na foto, mas assim que meus olhos lêem os comentários seguintes começam a lacrimejar, "como pode a Savannah ser tão linda e A tão estranha?kkk" aquele comentário era apenas um dos vários seguintes que me intitulavam o patinho feio da escola, a sombra de Savannah. Me sinto completamente destruída quando olho uma das respostas de Savannah, "Não sei...Mas é muito legal que você me ache incrível!" De alguma forma, pensava que merecia todos aqueles apelidos e palavras maldosas, embora só queria fugir de tudo aquilo. Deslizo meu dedo rapidamente pela tela lisa do meu celular e logo, acesso o Twitter com certa facilidade e então tenho a primeira vista, um twitte de alguém aleatória dedicado a Savannah "O que diferencia tanto você dá A?" Eu li de forma rápida e um tanto desajeitada, procurando rapidamente pela resposta de minha irmã. "Eu me enturmo mais, ela fica excluída. Eu saio mais, ela nem sai.Eu sei lidar melhor com as coisas, ela apenas surta.Eu sei dar bons conselhos, ela não.Eu sou franca quando quero, ela nem tanto.Eu sei dizer não, ela nem tanto.Ela evita sair por estar mal, eu saio para melhorar.Ela se isola de todos e eu ando com todo mundo e vivo saindo pra me divertir...Acho que é isso!" Meu coração acelera de forma estranha, eu queria chorar, aquilo tudo parecia pura humilhação, mas eu continuava a dizer para mim mesma que eram apenas conselhos indiretos de minha irmã perfeita. Talvez eu devesse mesmo sair, se fazia bem para Savannah também poderia fazer para mim.
Desço num ponto a menos de três metros de casa e corro para dentro do imóvel rapidamente e logo, vasculho cada parte do meu guarda roupa em busca de uma peça no mínimo descente para sair.
Depois de tirar todas as roupas que estavam no meu maldito armário, suspiro ao perceber que tudo que eu havia conseguido era um vestidinho preto não muito elegante e um daqueles sapatos de salto alto. Juntei meu look recém montado em cima de minha cama,perfeitamente arrumada e logo, andei em passos largos e apressados até o banheiro, com a intenção de tomar um rápido banho.
Os minutos se passaram rapidamente, enquanto os pensamentos ansiosos atingiam minha mente tal como a água morna que recaia do chuveiro, sobre minha cabeça. Desliguei o registro do chuveiro e me enrolei com a toalha branca felpuda correndo novamente para o quarto. Me olho no espelho e me preparo psicologicamente para me vestir. Encaro o look ligeiramente padrão, jogado em cima da cama e um suspiro desanimado se desloca para fora de minha boca. Eu não podia e nem iria mudar quem eu era para agradar os outros, não iria me vestir daquela forma e nem agir de tal jeito como Savannah. Se eu fosse sair, iria ser do meu jeito...Sorrio com meus rápidos pensamentos,no fundo, estava orgulhosa de pensar de tal forma.
Me visto rapidamente com uma simples regata negra, e uma calça jeans desbotada e não tão colada no corpo, me olho no espelho me sentindo bem por estar confortável daquela forma. Um sorriso alegre toma conta de meu rosto novamente. É incrível como simplesmente usar uma vestimenta com a qual se sente bem, lhe faz ter mais confiança sobre si mesma.Meu celular solta um rápido som agudo e meu olhar é guiado através dele, até o criado mudo emadeirado, ao lado de minha cama. Me esquivo para alcançar o celular e ver do que se tratava, era mais uma inútil foto de Savannah, o que parecia uma provocação constante de insegurança em mim.
Com o rápido pensamento em forma de ignorar o efeito que as fotos perfeitas de Savannah causavam em mim, resolvo tirar algumas fotos no espelho,já que estava me sentindo tão bem com a roupa que estava vestindo. Assim que abro a galeria, após tirar uma porção de fotos um tanto desajeitadas, me deparo com imagens minhas na forma real, o que me causa um surto de insegurança repentino. Tudo o que eu via naquelas fotos era um patinho feio, como todos diziam e aquilo me tornava o que mais odiava, uma das pessoas que julgavam outras por sua aparência. Apesar de sempre me sentir desajeitada e feia, tentava conduzir o pensamento de que não poderia me classificar nem me julgar e me comparar à outras pessoas, tais como minha irmã, mas dessa vez, parecia impossível.
As lágrimas começam a brotar em meus olhos e o rápido instinto de preservação, me faz enviar rapidamente algumas de minhas fotos para Zoe, com a esperança de que ela soubesse o que me dizer, como sempre. Assim que cliquei no botão enviar, a mensagem não demorou muito a ser visualizada "Onde pensa que vai toda plena assim, sua Deusa Grega?!" Era o pequeno texto que continha na mensagem de Zoe. "Você tem mesmo uma grande imaginação se vê uma Deusa no lugar de um patinho feio, Zoe." Digito rapidamente, sem pensar muito. "Como assim?!O que quer dizer com isso?!Ninguém veria um patinho feio nessa imagem, só pessoas que realmente não sabem apreciar uma incrível obra de arte, porque é isso que você é, Alice...Uma belíssima e esplêndida obra de arte, não deixe que ninguém te diga o contrário!". Talvez ela tivesse razão eu deveria parar de ter medo de quem eu sou. Guardo meu celular em uma pequena bolsa preta de couro e sigo meu destino rumo a saída da casa, enquanto percebo que o táxi que havia chamado ja estava em frente a casa. Eu havia escolhido ir de tal forma até a praça, porque seria mais rápido do que ir de ônibus e em menos de 30 minutos, lá estava eu, na praça, apenas observando todos à certa distância.
Respiro fundo tomando coragem para me aproximar do grupo de adolescentes logo a minha frente. Caminho em passos vagarosos até os vários jovens que já estavam aglomerados em uma roda. Percebo o olhar surpreso de Savannah ao me encarar, quando finalmente estou próxima o bastante para poder analizar cada um dos ali presentes. Todos amigos íntimos de Savannah e populares da escola, tão diferentes de mim. Eu simplesmente não entedia porque havia sido convidada para algo do gênero.
-Que bom que veio, irmã!-A voz esganiçada de Savannah ecoou em meus ouvidos e então eu sorrio, um tanto tímida, à encarando.
-Olá...-Sussuro em voz quase inaudível, enquanto posso notar que todos me encararam, meio incertos. Seus rostos estampavam a pergunta mais óbvia "O que ela faz aqui?!". Suspiro, um tanto desconfortável por todos aqueles olhares me cercando. O único que parecia realmente feliz com minha presença, era Dylan, que sorria abertamente para mim. O sorriso dele me serviu como convite para ir até ele, que estava um tanto distante minha irmã.
-Você está muito bonita!-Ele diz de forma sorridente, transbordando simpatia.
-É...Ela está lindinha.-A voz de Savannah soou de forma segura, como sempre, enquanto se aproximava da gente. Havia algo diferente dessa vez e era algo impossível de não notar, pois dessa vez seu comentário estúpido não conseguiu me afetar e nem desestabilizar minha auto-estima. Sorri aliviada pelo fato de conseguir manter a confiança que Zoe me passou.
-Ela virou uma menina super poderosa agora?!-Disse a voz rouca, em um tom incrivelmente sarcástico. Me viro para encarar seu belo rosto, era Travis, como sempre, cheio de segurança e quente como o inferno.
-Qual é o seu nome mesmo?-Ele disse, um tanto charmoso.
-Alice!-Foi incrível a confiança que entonei quando pronunciei meu nome.
-Alice como à Alice do país das maravilhas?!-Travis fala de forma sedutora e descontraídamente sarcástica.
-É...Pode me chamar de Alice e de maravilhosa!-Digo, cheia de atitude. Não sabia de onde tinha surgido tanta confiança, talvez tenha sido pelo fato de perceber que Savannah estava se mordendo de inveja pois pelo menos uma vez na vida, as pessoas tinham mais interesse em mim do que na farsa de boa moça dela.
O tempo foi passando de forma tão rápida que nem percebi, já estava no auge da noite e por um incrível milagre, eu havia conseguido socializar e conversar livremente com algumas pessoas por lá.
-Está ficando frio...-Digo, enquanto envolvo meus braços em torno de meus ombros e logo posso ver um rápido movimento de Dylan tirando sua jaqueta para me entregar.
-Ela não precisa disso...Ela tem a minha jaqueta!-Travis diz, em seu tom sarcástico e provocativo habitual. Estava demorando para ele voltar no assunto da tão desejada jaqueta. Me perguntava que tanto apego ele tinha a esse bem material fútil. Reviro os olhos e percebo seu sorriso maroto se ampliar por seus lábios.
-Acho que já vou indo...-Comento para Dylan, que apenas concorda de forma compreensiva. Me levanto e passo por Travis, que entornava outra lata de cerveja. Caminho até o ponto de táxi mais próximo dali e aguardo pacientemente o próximo que estacionária ali, o que não demorou muito. Assim que o táxi chega,  deslizo para o banco de trás do automóvel e em pouco segundos estávamos à caminho de minha casa. Os minutos que duraram o pequeno percurso me fizeram pensar de forma alegre sobre como eu havia conseguido me controlar e socializar com outras pessoas. Saltei para fora do carro, após destinar algumas notas ao motorista e corri para dentro de casa, indo diretamente para o meu quarto. Os pensamentos orgulhosos pela forma que agi naquela noite, afetavam minha mente de forma positiva, enquanto eu vestia meu pijama lilás, um tanto frouxo, com algumas minúsculas florzinhas brancas desenhadas.
Ouço um estranho barulho se deslocando da janela de meu quarto e me viro rapidamente para ver do que se tratava. Meus olhos se arregalam ao perceber quem estava ali, parado.
-O que está fazendo aqui?-Sussurro, em meio ao susto por ver o rosto familiar de Travis, já dentro do meu quarto.
-Vim buscar a minha jaqueta, moça!-Ele diz de forma simples, como se fosse normal invadir uma casa à noite, atrás de uma estúpida jaqueta.

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