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O dia amanheceu um cinza tão fúnebre, que parecia antever o que estava para acontecer. A saúde de Jimmy estava cada vez pior. Decidi então, depois da Maureen muito implorar, ir procurar o padre do vilarejo para ver o menino. Estávamos tão desesperados que qualquer possibilidade era cogitada na esperança de salvar nosso Jimmy.

Nunca fomos muito católicos, mas o desespero de perder nosso único filho era muito mais forte. O padre Robert, logo chegou a nossa humilde casa. Assim que entrou disse sentir algo estranho na casa. Imaginei que algo estava errado. Mesmo sendo uma pessoa cética até então, comecei a rezar e pedir que Deus ajudasse meu pobre filho.

O padre foi andando pela casa quando parou na entrada do quarto. Ele estava com uma aparência de puro pavor. Disse que não conseguia entrar no quarto porque havia ali algo que impedia a presença dele. Ficou por alguns segundos olhando para Jimmy que dormia abraçado a Tom então virou e foi em direção à saída.

Eu nunca havia visto um padre com tanto medo. Obviamente me voltou a mente a ideia de que aquele gato era o causador de tanto sofrimento.

Despedi-me do padre e me dirigi diretamente à cama de Jimmy. Nesse momento tive certeza que aquele gato carregava algo de maligno com ele. Assim que o segurei, ele começou a se contorcer tentando me arranhar e morder. Até parecia saber o que eu pretendia fazer.

Mesmo com suas garras sendo cravadas em minha pele, não o soltei, pelo contrário, o segurei firme para que não fugisse e o carreguei para a clareira, local onde eu o havia encontrado. Quando chegamos à frente do deposito, Tom conseguiu atingir meu olho direito com suas garras. Instantaneamente senti uma dor excruciante enquanto um líquido quente escorria pelo meu rosto. Eu sabia que havia perdido um olho.

Mal conseguindo enxergar, peguei o machado que utilizava para cortar lenha, e desferi um potente golpe na cabeça de Tom. Ainda não sei como tive coragem para fazer isso, afinal eu gostava dele. Foi mesmo o ato de um pai desesperado que tentaria de tudo para que seu filho ficasse bem.

Peguei então o corpo decapitado do gato para dar-lhe um fim mais digno, porém não consegui encontrar sua cabeça. Não estava em local nenhum. Resignado acendi uma fogueira e queimei o corpo decepado daquele que havia sido o Tom.

Retornei para casa, e ao chegar, foi com imenso alivio que percebi que Jimmy estava em pé ao lado de Maureen conversando sobre algum assunto que não pude apreender. Ao chegar, dei um apertado abraço nele, e ao contemplar o rosto de Maureen pude ver que ela não entendia o que havia acontecido.

Ao ser perguntado por Jimmy sobre o Tom, dei um significativo olhar para Maureen e disse que ele havia fugido. Ela então compreendeu o porquê do sangue no meu rosto. Para Jimmy expliquei que havia me ferido ao cortar árvores algumas horas antes.

Nossa vida parecia estar voltando à normalidade. Jimmy se recuperara totalmente e já voltava a apresentar a mesma energia de outrora. Retomei meu oficio de lenhador e a paz parecia estar finalmente nos alcançando. Porém, como viria a perceber depois, meu sofrimento estava apenas começando.

Uma semana depois de todos esses acontecimentos aqui narrados, acordei no meio da noite com uns barulhos estranhos no teto da casa, parecia que havia algo andando no telhado. Levantei-me e quando sai de casa, senti um arrepio percorrer toda extensão do meu corpo ao ouvir uns miados agudos, típicos do Tom.

Procurei desesperadamente pela origem do ruído, mas nada encontrei. Tentei então afastar do pensamento tais ideias. Afinal, eu me certificara de ter dado cabo da existência daquele animal, a cegueira parcial que tive era um constante lembrete desse hediondo incidente.

Já me preparava para voltar para cama, quando um pequeno vulto passou correndo por mim em direção ao interior da casa. Privado como estava da visão em um dos olhos, não pude notar o que era, mas vi que parecia saber aonde iria, o quarto de Jimmy. Corri atrás dele, e com enorme assombro percebi que havia um gato todo queimado ao lado da cama do meu filho. Ou melhor, parecia ser um gato, pois o maldito não tinha cabeça!

Lembrei-me que quando o matei, não consegui encontrar a cabeça do desgraçado. Isso fez com que uma fúria que jamais imaginei possuir despertasse e me lancei para agarrar o maldito. Porém, minhas mãos não tocaram nada além do ar gelado da madrugada.

O gato, ou que sobrara dele, não estava mais lá. Comecei a duvidar que eu tivesse de fato o visto. Com tanto barulho, Jimmy acordou e me contou que havia sonhado com Tom. Aquilo me trouxe de volta à razão, e pedi a Jimmy que me prometesse que esqueceria aquele animal.

Os dias que se seguiram, continuaram com sua tranquilidade diurna, mas quando a noite chegava, minhas preocupações atingiam tal nível, que eu acabava ficando agressivo e nervoso até mesmo com minha família que eu tanto amava.

Desse modo, assim que a noite começava, criei o habito de ir dormir cedo na tentativa de evitar que eles vissem o quão despedaçado estava o meu estado de nervos. Toda a noite, eu acordava com os mesmos barulhos, e quando me levantava, podia notar que Tom estava andando pela casa, às vezes aparecia do jeito como eu o havia encontrado, magro e sem pelo, outras gordo e bem tratado, ou ainda andava pelos cômodos sem sua cabeça e todo queimado.

Eu era o único que parecia vê-lo.

Uma vez tentei mostrá-lo a Maureen. Claro que não disse a ela que eu o estava vendo, apenas a acordei uma noite e perguntei se ela via alguma coisa fora do normal. Ela me respondeu que não, mesmo estando Tom deitado a poucos centímetros de onde ela repousava a cabeça.

Como percebi que eu era o único que podia vê-lo, e que a saúde de Jimmy em nada tinha piorado, deixei a situação do jeito que estava. Até passei a apreciar a companhia do "novo" Tom. Confesso que às vezes me levantava somente para acariciar seu brilhante pelo negro.

Sim, amiga leitora que não abandonaste esta macabra narrativa, sei bem o que estas pensando. Na certa me toma por louco ou mentiroso por contar tal história.

Sinceramente, não sei qual dos dois é pior. De uma coisa estou certo: tal fato aconteceu. Com relação à loucura, não cabe a mim concordar ou discordar, mas apenas aceitar o julgamento que me dão.

Se sou louco, suspeito ter um grau elevadíssimo dessa doença afinal, agora mesmo estou a acariciar os macios pelos do meu querido Tom. Este que tem sido meu fiel companheiro nas longas noites dessa vida e, suspeito, me acompanhará mesmo depois que eu me for, não é, meu querido Tom?

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Aaah, fico muito feliz que tenha lido meu conto! 
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