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Sr. John se ajeitou confortavelmente na poltrona onde estava sentado e continuou.

— Assim que cheguei ao portão chamei pelo dono da casa. A primeira resposta que obtive foram latidos altos. Esperei por alguns minutos até que alguém aparecesse. Fiquei com medo de não aparecer ninguém. Não havia nenhuma outra casa por perto. E a noite já estava começando.

"Felizmente minha espera foi muito bem recompensada. Pude ver que uma mulher saía da casa e vinha na direção do portão. Peço-lhes, atenciosos amigos, que tenham paciência enquanto descrevo minha bela Carmilla. Sim, era esse o seu nome. E, peço também às damas aqui presentes que me desculpem se, por ventura, eu me exaltar em demasia. É que a emoção me inunda o peito sempre que me lembro dela. "

"Carmilla tinha estatura mediana, sendo um pouco mais baixa que eu. Tinha uma pele tão branca quanto um floco de neve e cabelos loiros tão lisos, que mais pareciam uma cascata dourada a cair-lhe pelas costas. Mas o que mais chamava a atenção era os seus olhos, azuis como o mais puro céu de primavera. Na mesma hora imaginei estar diante de um anjo, um ser celestial. "

"Ela então abriu o portão e me perguntou, com a voz mais suave que estes meus ouvidos já escutaram, o que eu desejava. Respondi que necessitava de repouso e alimento para mim e meu cavalo. Ela não disse mais nada, apenas pediu que esperasse um momento. Minutos depois, ela retornou ao lado de um rapaz que aparentava ser apenas pouco mais velho que eu. Ele olhou para mim e em seguida para o meu cavalo e comentou: "

— Desculpe a precaução viajante, mas nestes tempos é sempre bom ser cuidadoso.

— Sim, mas qual o motivo de tanto cuidado? Por acaso está ocorrendo algum conflito nestas terras?

— De certa forma sim. Mas não se preocupe, aqui terá comida e abrigo, não posso prometer conforto, mas pelo menos é um local seguro. Aliás, não me disse ainda o seu nome...

— Oh, me perdoe a falta de modos! Chamo-me John. — Respondi estendendo-lhe a mão.

— Muito prazer John! Entre e seja bem-vindo! Chamo-me Gustav, e essa é minha irmã Carmilla.

"Nesse momento, Gustav pegou as rédeas do meu cavalo e o conduziu ao pequeno estábulo que havia no fundo da propriedade. Durante esses poucos minutos, fiquei a admirar a beleza de Carmilla que, ao interceptar o meu olhar, corou ligeiramente e desviou o rosto para o chão, visivelmente constrangida. Foi quando seu irmão retornou. "

— Vamos John, fique à vontade e pode entrar! — Disse enquanto abria a porta me convidando a entrar em sua casa.

"Entrei e me deparei com uma pequena, mas confortável sala. Em seguida, Gustav me levou por um corredor que mostrava três portas. A primeira correspondia ao quarto de Carmilla, a segunda ao seu próprio e, era na terceira que eu passaria a noite. Então me deixou para que eu pudesse me preparar para o jantar que já estava sendo servido. "

"O jantar transcorreu normalmente. Ficamos a conversar sobre assuntos corriqueiros: o que eu pretendia fazer, de onde vinha e qual o meu destino. Porém, um incidente chamou nossa atenção. Por volta das oito horas da noite, quando o jantar já estava quase no fim, ouvimos um barulho vindo do estábulo. Gustav então se levantou e foi verificar a origem desse barulho. "

"Como viemos a descobrir depois, o que ocorrera era que o meu cavalo, por algum motivo desconhecido, havia ficado muito inquieto, e dessa forma, derrubou uma enorme lata de água que estava lá armazenada".

"Enquanto Gustav permanecia ausente, novamente me vi a sós com Carmilla. Pude notar que ela ficara apreensiva. Como se a minha presença, de alguma forma, a incomodasse. Quando ia pergunta-la o que se passava, ouvimos os latidos do cão labrador que estava na frente da casa."

"Quase ao mesmo tempo, escutamos o chamado de alguém que estava no portão. Como Gustav ainda não retornara, Carmilla me pediu que fosse com ela verificar quem estava a chamar a uma hora já tão avançada. "

"Ao chegar ao portão, vi que lá se encontrava um homem esperando ser atendido. Apesar da pouca luminosidade, a aparência do visitante me deixara, no mínimo, intrigado. Sua pele era muito clara, na verdade, pálido seria um termo mais apropriado. Parecia que seu corpo estava completamente isento de sangue. Obviamente, deduzi que isso se devia à pouca iluminação do local. Como poderia imaginar que aquele ser pálido e um tanto magro pudesse esconder algum perigo? Carmilla, no entanto, demonstrou reconhecer quem era. "

— Olá Aubrey! Por que está parado aqui fora? Já está acostumado a nos chamar do interior de casa mesmo, tal é sua familiaridade com nosso lar. Por acaso aconteceu algum problema?

— Problema? De forma alguma! Eu simplesmente não pud... quero dizer, não quis entrar — quando ouvi sua voz, um arrepio percorreu todo o meu corpo. Senti um misto de fascínio e medo, como se aquela voz aveludada escondesse uma frieza implacável.

— Ora, e por qual motivo não quis entrar? Deixe de cerimônia! Anda, vamos entrar! E como está pálido! Aubrey, você está doente?

— Eu estou bem, acredite. A verdade é que nunca me senti melhor! A propósito, obrigado por me convidar a entrar em sua casa.

— E desde quando você necessita de convite? E Manchee, pare de latir! Não sei o que deu nesse cachorro, nunca te estranhou antes! — Só então percebi que o labrador não parara de latir um minuto sequer.

— Também não sei o que aconteceu com ele... — disse Aubrey lançando um olhar fulminante em direção à Manchee, que silenciou instantaneamente.

— Bom você não vai entrar? É muito perigoso ficar aqui fora nesse horário.

— Agora não. Mais tarde talvez eu...

— Quem está aí? — Ouvi a voz de Gustav que vinha do fundo da casa. Carmilla e eu nos viramos para vê-lo e, nos poucos segundos que desviamos nossos rostos, Aubrey não estava mais lá. O estranho é que tudo ocorrera tão rapidamente que não dava tempo dele se esconder.

"Associei isso ao efeito da pouca iluminação. Certamente ele havia corrido em alguma direção. Não tinha como alguém simplesmente desaparecer. Isso seria impossível. "

"Assim pelo menos eu pensava. "

Tom e outras histórias de horrorWhere stories live. Discover now