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  Sou despertada pela luz do sol, que transpassava as portas de vidro da minha sacada.

  O quarto está fresco, mas não frio, talvez seja porque a febre baixou, já que não sinto mais a dor de cabeça.

  Me esforço para levantar. Sinto meus braços mais fortes. Creio que tive uma grande melhora, desde ontem à noite. E por pensar em ontem à noite, lembro de Namjoon, que não está no quarto. Respiro aliviada, por Namjoon não ter feito nada.

Nada aconteceu.

Meu corpo está leve, porém forte, como há dois dias atrás. Vejo a cadeira de rodas do lado da cama. Enquanto forço meus braços na direção da mesma, ouço algo se quebrando lá em baixo, seguido por um "Ah, merda!". Sorrio por ter imaginado a cena, e por pensar em qual história terei que inventar novamente, para Namjoon parar de quebrar as coisas.

Desço as escadas, voltando ao meu semblante sério, tentando pensar se Namjoon realmente merece a minha confiança.

Chego na cozinha, vendo Namjoon ajoelhado, enquanto catava os cacos de porcelana branca.

_ Está tudo bem?_ pergunto, vendo suas mãos vermelhas.

Ele olha para mim com os olhos arregalados. Ele abaixa a cabeça constrangido.

_ D-desculpe, Soyun! Eu prometo que dessa vez eu pago!_ ele encara os cacos no chão, claramente envergonhado por eu ter chegado numa hora péssima.

_ Não fale nada...estou tentando inventar outra desculpa para você se sentir culpado..._ estendo a palma da mão, em sinal de espera. Ele devolve um olhar surpreso.

_ Inventar...? Desculpa...?_ ele me olha incrédulo.

_ Sim, igual quando você quebrou o primeiro vaso, seguido por outros...cinco. Com esse seis._ explico, quando ele põe as mãos na testa.

_ Era tudo invenção?!_ ele arregala os olhos, enquanto eu lanço um sorriso amplo.

_ O mais legal disso tudo, é que você acreditou._ falo, girando um pouco a cadeira da rodas.

_ Você me fez sentir como se eu fosse a pior pessoa do mundo!_ ele me encara, mas não bravo, nem triste, apenas surpreso.

_ Esse era quase o objetivo._ explico, gesticulando._ Na verdade, era para você ver que eu sou a pior pessoa do mundo, para sair correndo para o lugar de onde veio._ aprofundo, vendo ele sorrir baixo.

_ Aí, você resolveu me contar, e parar de me perseguir porque descobriu que eu sou um anjo._ ele deduz convencido, quando eu encaro seus olhos, franzindo o cenho.

_ O que?! Não!_ nego incrédula._ Você está bem longe disso... Ah, quer saber, limpe essa bagunça! Eu vou é ficar longe daqui._ ordeno, saindo da cozinha, enquanto ouço sua risada fraca, atrás de mim. Idiota.

Depois de comer uma tigela de cereal, deixando apenas um pouco de lado, começo a observar, Namjoon se sentou à mesa, mexendo em seu celular, enquanto eu o encarava com os olhos estreitados.

_ Está tentando ler minha mente?_ ele pergunta, erguendo os olhos para me ver.

_ Não preciso, sei que está me xingando internamente._ dou de ombros, vendo ele mostrar suas covinhas.

_ Você julga demais, Soyun! Você acha que todas as pessoas te odeiam._ ele larga o celular, apoiando seus cotovelos sobre a mesa.

_ Não me importo. Não posso lutar contra a realidade, apesar de querer muito chutar as bundas dessas pessoas._ gesticulo, voltando meu olhar para fora, na varanda.

Ficamos em silêncio, até Namjoon suspirar alto.

_ Estou pensando em comprar um de seus livros._ ele comenta, fazendo uma súbita felicidade florescer dentro de mim.

_ Quer que eu te indique um?_ pergunto, quando o mesmo sorri.

_ Por favor._ ele concede, mexendo sua mão como o parceiro chama sua parceira, na hora de dançar a valsa.

Não demoro muito para pensar.

_ Tudo o que as estrelas poderiam te contar._ sorrio, quando cito o nome do meu livro preferido._ Meu primeiro livro, quando terminei a faculdade.

_ Ele deve ser muito importante para você._ ele comenta, concentrado em meu sorriso.

_ Dei meu corpo e alma nesse livro. Ele foi feito na minha primeira viagem sozinha, para a Inglaterra._ eu comento, lembrando dos passeios por Londres e Liverpool._ Os poemas são intensos, isso eu posso te garantir.

_ Shakespeare._ ele murmura, vendo eu assentir, sorrindo.

_"Todo mundo é capaz de dominar uma dor, menos quem a sente."_ cito, uma das frases que mais me toca, de um dos meus poetas preferidos.

_ Profundo._ ele comenta, me fazendo rir.

_ Gosta de literatura, Namjoon?_ pergunto, vendo ele dar de ombros.

_ Sim, e muito. Mas também gosto de ir a museus._ ele responde.

_ Uau, matemático amante de arte._ comento, lembrando de quando era pequena. Sorrio com os pensamentos de momentos antigos._ Eu já fui bailarina.

_ O que?!_ ele pergunta surpreso._ Sério mesmo?!

_ Seríssimo!_ respondo, lembrando dos passoas graciosos, que aprendi, mas que nunca mais vou repetí-los.

_ Nossa, Soyun! Você é uma caixinha de surpresas!_ ele continua surpreso.

_ Foi assim que eu comecei a amar poesia. Eu costumava levar meu irmão para o teatro._ observo, olhando para o céu._ Acho que preciso escrever um pouco. Me chame para o jantar, ok?

Ele assente, enquanto eu saio da mesa de jantar.

Deito na cama, apenas por deitar. Raciocinar é muito mais difícil do que sentir.

É estranha a sensação que estou sentindo, mas eu já a havia sentido antes. Será que julgo demais as pessoas, como Namjoon falou? Se sim, eu tenho meus motivos. Mais quais são?

Tento lembrar um pouco.

Eu estou presa em uma cadeira de rodas.

Eu não posso andar. Se posso, é uma chance em um milhão.

Tenho medo das pessoas me machucarem.

Não posso mais viajar.

É sempre uma dificuldade quando tento vestir uma calça.

Qualquer movimento errado pode resultar numa queda, que pode gerar uma complicação maior nos meus ossos.

Não tenho o carinho dos meus pais.

Não mantenho hábitos alimentícios saudáveis.

Não saio de casa com frequência.

Perdi o grande amor da minha vida.

Realmente, são ótimos motivos, e pensar neles só me dá dor de cabeça. Mas há algo que eu não havia percebido esse tempo inteiro. Todos esses motivos me envolvem. O eu está em todos as minhas preocupações.

O eu que me mantém afastada. O eu que me faz ser fria. O eu que não me dá uma chance. O eu que não quer ser machucada. O eu que perdeu tudo. O eu que julga. O eu que é julgada. O eu que desistiu da própria vida.

O eu que quer se matar.

Meus olhos percorrem o quarto quieto.

Por trás dessa capa de frieza e seriedade, há uma pessoa extremamente medrosa, que tem medo das pessoas. Que não quer dar outra chance à vida.

Será que estou culpando as pessoas pela minha vida inútil?

Eu sou a vilã da minha própria história?

Droga, Soyun, você precisa se distrair.

Abro a gaveta da minha cômoda, vendo a caixinha amarela. A cor da felicidade. O conteúdo dentro dessa caixa, com certeza tiraria a minha dor, mas não sei se traria a minha felicidade.

Do lado da caixinha, está meu headphone. O pego, e o encaixo em minhas orelhas. Relaxando, nem que seja por um momento, até Namjoon resolver bater na minha porta.

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