Capítulo 94

1.4K 200 25
                                    

Gabriella

Balanço minha perna repetidamente, enquanto observo a paisagem mudando do lado de fora do taxi. Ao invés de prédios e trânsito, somente árvores e o silêncio. O que é um contraste quase cômico, comparado a tempestade que ronda minha mente sem descanso algum.

Vez ou outra, posso flagrar o motorista me olhando curioso pelo espelho e desvio a atenção, não acredito que ele esteja com alguma segunda intenção. Céus, não mesmo, mas desde que entrei no seu carro, não disse mais nenhuma palavra depois de informar o meu endereço de destino. Provavelmente, ele seja uma pessoa que goste de conversar durante o trajeto, confesso que eu também, mas hoje, excepcionalmente nesse dia, eu estou diferente. E isso deve ser estranho.

Minhas mãos estão sobre o meu colo, unidas como se eu estivesse em uma oração. Talvez eu até esteja, embora meus pensamentos não sejam nada agradáveis no momento, não quero perder a maldita razão.  Então, somente uma ação divina para me controlar de qualquer forma, porque a raiva que sinto inflamar meu corpo a cada segundo em que me aproximo, seria o suficiente para queimar uma cidade. 

Sinto a movimentação diminuir, até parar completamente. 

— Boa sorte. — diz sorrindo e enfia no bolso da camisa a nota que entreguei.

— Não entendi. — respondo confusa e seguro a porta aberta. 

— Isso que está acontecendo ai. — seu dedo aponta para a minha cabeça e seu sorriso aumenta mais um pouco — Espero que consiga resolver.

— Obrigada. — digo sinceramente e tento curvar os lábios, mas desisto na segunda tentativa. Acho que meu rosto se transformou em uma carranca para sempre.

Aonde você está? — envio a mensagem para Matteo e acho que quase não pisco, esperando sua resposta.

Sala da coordenação, querida. Final do corredor, passando pela esquerda da recepção. 

Atravesso a rua e inspiro fundo ao parar em frente a clinica. Essa hesitação dura apenas meio minuto, pois no próximo, estou marchando pesadamente em apenas uma direção.

— Você não pode entrar, moça. — uma mulher se inclina sobre o balcão e ignoro. Uma ova que não.

Se tocasse alguma música agora, como naqueles filmes de ação, quando o caos é precedido pelo andar em câmera lenta e decidido do ator, definitivamente, eu não estranharia. Meus passos parecem mortais nesse instante, igual ao deles. 

Avisto a placa na porta e fecho meu punho com força. Respiro profundamente outra vez e giro a maçaneta.

— Foguinho. — ouço sua voz, mas mesmo antes de vê-lo, observo a culpada por toda essa merda, encolhida perto da janela pequena, como um rato amedrontado.

— Matt. — cumprimento e coloco minha bolsa na cadeira, girando meu corpo até encontrá-lo. Sinto seu beijo na minha bochecha e viro o rosto até encostar a minha boca na dele. Fecho os olhos brevemente, quando percebo que a sua presença tem o poder de afastar qualquer peso do meu peito, transformando qualquer lado escuro em alguma luz. É incrível e assustador ao mesmo tempo.

— Obrigada. — sussurro e ele acena fracamente. Apertando meu pulso com gentileza, antes de me fitar com aquele oceano nos olhos. Aquele mar que parece me transportar para o céu, como um anjo, fazendo com que eu até esqueça do diabo no canto da sala.

— Qualquer coisa por você. — replica e sinto meu coração se esquentar. Como se fosse uma brasa que não se apaga, que apenas avança mais e mais a cada batida. 

— Eu te amo. — digo — Mas agora preciso que você espere lá fora.

— Não. — diz.

— Não deixe ninguém entrar, por favor. — peço e o empurro levemente.

— Mas eu queria ver, foguinho. — choraminga dramaticamente e seguro o riso. 

Matteo está todo imundo, com sangue seco nos dedos e parece até um dementador, com toda essa roupa preta e pesada, como se fosse roubar a felicidade ao nosso redor, só que isso não poderia estar mais longe da verdade, porque mesmo que ele aparenta ser o homem mais temido, com esse sorriso debochado e grande, ainda assim, tem o olhar mais doce que eu já vi na vida. Eu o amo enlouquecidamente.

— Você pode ouvir. — retruco baixo e ele bufa, fechando a porta a contra gosto e nos deixando sozinhas.

Endireito a postura e trago de volta o que vinha pulsando tão fortemente sob a minha pele. Não respiro fundo dessa vez, porque não preciso ficar calma. O que eu preciso, é me livrar dessa sensação quando a encaro. A vontade arrebatadora de afundar a sua cara na parede e assistir toda a agonia que me esmagava nas ultimas horas, se esvair conforme a vadia sangra. Gota por gota.

— Levanta desse chão. — ordeno e ela empalidece. A frieza com que minhas palavras a atingem, faz sua boca se entreabrir com a surpresa, mesmo que eu também esteja, não deixo isso transparecer, porque a única coisa que ela terá de mim, é essa máscara sem emoção e distante que acabei de vestir — Levanta, porra. — grito e assisto com prazer, o desespero com que fica em pé tão rápido e se senta, abaixando a cabeça como uma covarde, não sendo capaz nem de olhar nos meus olhos.

Mal me reconheço com toda essa atitude, mas minha mãe queria que eu fosse uma nova mulher, então estou apenas seguindo o seu conselho. Poderia ligar para a polícia e acabar com isso, mas qual seria a graça?
Ela tentou matar a pessoa que mais amo no mundo e por incrível que pareça essa ironia, agora entendo mais um pouco a vingança que Matteo sentia corroer seus ossos, quando foi atrás de mim no bar.

MATTEO  Uma noite * livro 2Onde histórias criam vida. Descubra agora