Capítulo 8

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Como na corte nada permanecesse igual por muito tempo, uma semana mais tarde Mariana foi transferida para a ala de Ofélia. Se o príncipe pretendia a companhia de Mariana como o seu próximo capricho, o Rei, com as suas decisões ao minuto, trocou-lhe as voltas e Ofélia sentiu uma satisfação reprimida.

"Não tenho a certeza como sobrevivi aqui sem ti", disse Ofélia apertando as mãos de Mariana, depois de apenas um dia na companhia da amiga. Ofélia estava tão feliz pelo regresso da amiga como estava por ter sido capaz de sobreviver sem ela.

*

Certo dia de manhã, ao atravessar a cortina de pétalas de rosa vermelha e entrar no salão real ainda adormecido, Ofélia deparou-se com uma silhueta robusta e familiar curvada em concentração sobre o tabuleiro de xadrez. Os cabelos negros reluziram como flechas com vida sob a luz do amanhecer. Músculos esculpidos ao longo dos braços robustos eram evidenciados pela luz à medida que se contraiam para avançar uma das peças de xadrez.

"Check-mate", murmurou desinteressadamente uma voz familiar, profunda e grave. Ofélia estremeceu e susteve a respiração. Estacou tarde de mais o passo apreçado. O príncipe Tristan voltou a cabeça na sua direção. O coração de Ofélia soltou uma batida. O que fazia ele ali? Sempre que Ofélia conseguia esquecer a sua existência, pumba, lá estava ele. O olhar arregalado de Ofélia deslocou-se em perfeito choque para o nobre com quem o príncipe travava uma partida mesmo antes do sol nascer.

Sempre que Ofélia chegava ao salão nobre da ala Nascente mais cedo, encontrava cortesãos da ala do rei – a ala do rei era tão supervisionada pelos olhos ávidos do monarca que os cortesãos que lá trabalhavam vinham adiantar algumas das tarefas para a ala Nascente antes desta ser ocupada pelos consortes que a ela pertenciam. Era ali que, ainda antes da vida no castelo da Meia-Noite recomeçar, encontravam alguma liberdade para discutirem e prepararem as tarefas do dia sem serem escutados ou, mais importante, advertidos. Mas Ofélia nunca tinha visto o príncipe Tristan ali antes. Contudo uma possibilidade surgiu-lhe de imediato como a mais provável... falava-se que a ala Nordeste iria fechar novamente. Talvez O príncipe tivesse sido transferido para a ala do rei...

Ofélia baixou o olhar e fingiu não o conhecer. Sim. Ofélia fez precisamente isso. Fingiu que era uma manhã como todas as outras. Apesar de subitamente se ter tornado difícil respirar, Ofélia avançou, como todas a manhãs, até ao pergaminho afixado na parede sobre as secretárias com a lista de convidados que cada aspirante a aia deveria receber naquele dia. Encontrou o seu nome e a este seguia-se o nome de cinco duques. Ainda não tinha chegado nenhuma das aspirantes a aias, mas a única cuja presença Ofélia desejava, Mariana, estaria ausente naquela semana o que não ajudou a tranquilizar Ofélia naquele dia.

Ofélia suspirou, sentindo o automatismo do seu trabalho assumir o controlo. Sentou-se a ler as cartas de cada duque e os assuntos que os traziam ao castelo - pedidos de territórios, soldados recém-chegados que ofereciam os seus serviços, jovens que pretendiam casar na corte, e ainda um aldeão que perdera a família para a peste e pedia auxílio.

Ofélia suspirou, demorando-se naquela última carta. Eram cada vez mais frequentes aqueles pedidos... mas não havia nada que pudesse fazer. O rei não podia acolher toda a gente no castelo. Era impossível dar resposta a todos eles.

"Bom dia, Ofélia!", disse animada a aia Carolina - a aia simpática que lhe apresentou o castelo da Meia-Noite onde ela já trabalhava fazia três anos.

Ofélia confirmou, nas escassas vezes em que a vira - não foram muitas pois, tal como todas as aias, Carolina estava sempre aterafadíssima e desaparecida - que era divertida e simples como a julgara quando a conhecera. Mas não era infrequente Ofélia enganar-se nas primeiras impressões, sobretudo na corte, pelo que aquela tinha sido uma surpresa agradável. Carolina tinha, na verdade, maneiras tão simples e educadas que chegava mesmo a deixar Ofélia insegura na sua presença, pois pior do que sentir-se incompetente perante cortesãos maus, era sentir-se incompetente perante pessoas boas como a aia Carolina. Não a queria desiludir. Mas quanto mais pensava nisso mais difícil isso parecia tornar-se, pelo que tentou ignorar os pensamentos e focar-se nos pergaminhos por uma vez, mas não foi preciso.

Danças e Poções - CONCLUÍDADove le storie prendono vita. Scoprilo ora