Capítulo 21 - A ligação

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Poderia ser uma feira movimentadíssima, aquelas conversas antes da aula começar ou uma discussão familiar. É apenas a casa da vocalista da insólito. Seis pessoas participam da conversa, cada um querendo falar mais alto que o outro.

- Ainda acho uma bobagem esse cara estar aqui. – O cacheado revira os olhos e cruza os braços.

- Nós precisamos colocar tudo nos eixos, Daniel. Ele sabe dos fantasmas. Demétrius fingiu ser você para ele se assustar.

-Definitivamente não era eu. Tenho coisas mais importantes para fazer do que assustar crianças.

- Tá chamando quem de criança? – Nicolas fica ofendido e se segura para não partir para cima do fantasma, porém o fuzila com o olhar.

- Vocês têm praticamente a mesma idade. – Bia tenta apartar aquela cena ridícula.

- Isso não está em questão. – Daniel se joga no sofá, irritado.

- Demétrius fez uma grande jogada. Sabemos que foi ele quem escreveu a carta, fez aquela balbúrdia na festa e, enfim, o Nicolas. – Félix apontou para o garoto.

- E aconteceu mais alguma coisa enquanto estivemos fora? – Era Martim quem perguntava abrindo a porta para o cachorro, que batia as patinhas querendo entrar.

- Isso é o mais esquisito. Não aconteceu nada. – Julie diz sentada numa mesa com as bochechas entre as mãos.

- Nem aparições pela escola, rua? – Félix questiona, ao mesmo tempo dá espaço para Martim passar com Jimmy, o que era desnecessário sendo ele intangível.

- Nada. – Nicolas completa, achando aquela situação toda uma loucura.

- Ele continua sem forças ou está sem cúmplices? – Bia tentava entender.

- Podem ser um ou outro. – Martim pontua jogando uma bola na boca de Jimmy, que balança o rabo com a presença do fantasma. Não eram só os humanos que sentiam falta dos garotos.

- Ou ele pode estar esperando algo. – Daniel estreita os olhos, concentrado.

- E o que faremos? – Julie pergunta

- É muito difícil se livrar de um fantasma obcecado. – Martim esfrega a barriga de Jimmy, que esperneia de alegria.

- Então, é isso. Estamos no escuro? – Bia fita cada um, na espera de uma resposta

- Parece que sim. – Félix termina, colocando as mãos na cintura.

Vivos e fantasmas se separaram, cada um com seus afazeres pessoais. Nicolas percebia o quão Daniel e Julie pareciam radiantes na companhia um do outro, mesmo que sua própria presença visivelmente incomodasse o fantasma.

...

Félix quer encontrar alguém, por isso se encaminha para fora da casa. Duas ruas depois, Martim surge ao seu lado.

- Estamos indo para onde?

- Vou falar com Alan, ele não sabe até agora o que aconteceu. – Félix dá um sorriso fechado para o amigo, indicando que quer ir sozinho. O baixista entende. Só quer checar se o amigo está bem. Na verdade, ele mesmo está querendo ver Bia. Some em instantes.

- Ah, olha só quem apareceu por aqui. – O garoto cruza os braços ao ver o fantasma no reflexo do espelho acima da sua escrivaninha.

- Desculpa. Eu fiquei preso num CD por um fantasma totalmente paranoico. – Alan está emburrado, no entanto, não demora para uma expressão debochada tomar conta do seu rosto.

- Isso é uma piada? Quem tem tanta má sorte duas vezes? – Eles então se abraçam, como se tivessem deixado de se ver por anos e não meses. Alan fala que Julie contou que eles haviam ido embora. Ele não acreditou na história, e assim passou os últimos meses pesquisando com outros espectros. Félix por sua vez, conta tudo que Demétrius havia feito para eles. Alan compreende, e na verdade, fala que poderia ajudar, afinal, encontrara alguém interessante.

- Você não vai acreditar no que eu descobri.

...

Poucos quarteirões de distância, Martim observa Bia toda empolgada ouvindo NX Zero e admirando sua coleção de tesouros capturados dos shows dos seus artistas favoritos. Planejava conseguir mais um artefato.

- Deixa eu adivinhar, você finalmente conseguiu ingressos pro show deles?

- Martim, pelo amor! – A garota tinha levado um susto, mas estava feliz pelo fantasma estar ali, sentia falta disso. – Bater na porta, lembra? E sim, eu consegui, dessa vez eu consigo alguma coisa, nem que precise entrar de fininho no camarim.

- Não tem nada que te impeça, né garota? – Ela balança a cabeça. – E você, realmente tá saindo com o Valtinho? Eu não posso te deixar quatro meses sozinha e você sai logo com aquele carinha.

- Ei, não julgue minhas escolhas. Ele é divertido.

- Você que pediu pra eu ficar de olho.

- Ah, mas o Valtinho é diferente. A gente tá tendo um lance legal, sabe. Eu não preciso mudar nada do que eu sou, ele gosta de mim assim. Tá certo que eu não curto filmes de terror. Isso não quer dizer que não seja legal estar com ele.

- Estou vendo essa felicidade aí no rosto. Se você está bem, é tudo que importa. Não vai me deixar na mão por causa dele, né?

- Olha, você pode continuar me ajudando na galeria, e alguns dias de folga.

- Rebaixado a escravo? Não acredito – Finge estar horrorizado, porém o sorrisão de sempre toma conta do ambiente.

...

Julie está louca para começar a ensaiar com os garotos, entende também que eles precisam de um momento deles. Entediada, ela até faz algumas atividades escolares enquanto ouve música na edícula. Brinca um pouco com Jimmy até que encontra, entre seus pertences, a carta que guardara. Tem uma curiosidade.

- Daniel! Danieeeel! DanDanDanDan. Danieeeeel. DANIIIIII. EL. DA.NI.EL – Chama o amigo entre cantoria e sarro. Sabia que pareceria uma maluca gritando, mas ela não tinha certeza da presença do amigo.

- Ei, ei, ei. E esse berreiro todo? O que aconteceu? Não sabia que sentiria tanta minha falta a ponto disso. – Sua expressão travessa está lá.

- Deixa de se achar. – Sorri para ele. O fantasma tinha sentido falta disso. - Daniel, tem uma coisa que eu queria saber.

- O que? – Ele põe a mão nos bolsos.

- Você não escreveu a carta. – Fala devagar, ele está intrigado - Só que a letra era a sua. As palavras, você as escreveu de alguma forma. – Curiosidade estampa seu rosto.

- Eu escrevi uma música naquele papel. Ele só embaralhou e colocou o que queria.

- E sobre o que era a música? – Eles se olham por um tempo, Daniel a encara penalizado. Está prestes a dizer algo.

O telefone toca. Daniel assente para que atenda, ela o faz. Julie leva um susto. Era ninguém mais, ninguém menos que o diretor de uma gravadora, havia visto a apresentação no Festival. Estava interessado em trabalhar com a garota. Queria marcar uma reunião com ela. Empolgada com o que o futuro lhe proporcionará, não deixa de imaginar o que vem pela frente.

UNSEENWhere stories live. Discover now