03| 50 DIAS ANTES DA QUEDA (reescrito)

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#CaiuNoGolpe 🍎



O céu estava cinza.

Jimin observava a igrejinha, que estaria completamente vazia se não fosse a sua própria presença perto do altar ou do gato preto de rua parado à porta, com certa tristeza no rosto, imaginando o porquê de todas aquelas pessoas que pareciam tão fiéis e dedicadas oito dias atrás não voltarem à igreja nem um dia sequer depois da tão aparentemente satisfatória missa daquele domingo.

Antes mesmo que o sol começasse a iluminar o céu de Roma, naquele dia, Jimin já estava de pé, com seu rosário no pescoço, lenço no bolso e mãos à obra na pequena igreja do subúrbio. Havia levantado cedo, mesmo exausto não conseguira dormir e, depois de fazer suas preces matinais, bem como sua primeira refeição em sete dias, se direcionou, ansioso, até lá lugar para limpar o chão, os bancos de madeira e esperar pelos moradores da região. Viu-os chegando aos poucos e os recebeu com o seu mais sincero sorriso até que, exatamente às cinco da manhã, os sinos da Santíssima Casa soaram sete badaladas e a missa foi iniciada.

Ainda naquele dia, mais tarde e quando a igrejinha estava repleta de pessoas, o noviço avistou, parada ao lado de fora, a inconfundível figura do estranho homem de olhos acolhedores o encarando antes que, no meio de uma breve prece, ele desaparecesse e nunca mais fosse encontrado, nem mesmo pela rua, pelos seu buscar desmedido.

Respirando fundo ao ouvir os sinos da Santíssima Casa tocarem e o arrancarem da sua confusa melancolia, ajoelhou-se, quase que de forma mecânica, para iniciar outra prece naquela manhã, assim como fazia em todos os momentos em que aquelas sete barulhentas e tortuosas badaladas soavam por toda Roma.

Ao invés de orar, no entanto, Jimin apenas se colocou a encarar, em apatia, as flores brancas espalhadas aos pés do púlpito de madeira balançando com graciosidade, se deixando envolver pela brisa fresca que atenuava o eco do vazio ao invadir a igrejinha, sequer notando que havia de deixado sentar sobre os pés, ao passo que o som irritante dos sinos se confundia com o burburinho estridente dos seus pensamentos.

Era desolador encarar que aquela cidade tomava cada vez mais gosto pelas execuções e sessões de apedrejamento em praça pública, numa pura busca em satisfazer o seu desejo por maldade, e afastava-se com tanta facilidade do amor, do respeito e do cuidado de Deus, e que as pessoas gostavam de se ver presas ao vinho e à devassidão dos bordéis que faziam-se mais numerosos no subúrbio romano e manter a maior distância possível da pequena igreja.

Talvez a sua fé fosse, na verdade, um molde feito por homens falhos para vestirem-se de intolerância e preconceito quando assim desejassem, aquilo ao que recorreriam somente quando os cintos apertassem os seus estômagos.

Suspirou, sentindo o peso do rosário sobre o seu peito se atenuar ao que seus pulmões se desfizeram do ar que o mantinha atado à sua mente e desviou a atenção das flores, finalmente percebendo a ausência do som dos sinos, ao sentir algo se arrastar com gentileza e paciência pelas laterais dos seus quadris. Atraído pelo toque leve, o noviço encarou o gato preto, aquele que outrora estava parado à porta, pedindo por carícias ao fazer companhia ao garoto solitário naquele dia.

Depositando um carinho contido no topo da cabeça do felino, ouvindo-o ronronar ao manter os olhos fechados, Jimin observou o pequeno fio de corda que o rodeava frouxamente o pescoço, junto a um único guizo, antes que ele o encarasse e o brindasse com a imensidão vasta dos seus olhos escuros, cintilantes e reconfortantes.

A que ponto a sua sensação de solidão havia chegado para que até mesmo os olhos de um animal irracional fossem capazes de oferecê-lo conforto?

DESCONSTRUINDO O ÉDEN | yoonmin Where stories live. Discover now