Capítulo 1

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Faz pouco menos de seis meses que toda Cortom virou de cabeça para baixo, e a cada segundo que se passava, mais eu preferiria que aquela bala tivesse acertado a minha cabeça. Naquele dia, além de minha família ter sido massacrada, a metrópole foi à ruína.

Crianças eram mortas, mulheres estupradas e conjuntos habitacionais simplesmente destruídos por todos os métodos imagináveis. Cortom era uma cidade-estado independente, até ser devastada pela Levihart, uma organização governamental transnacional.

As ruas foram invadidas por milhares de soldados armados, mísseis e tanques de guerra. Segundo eles, todos que fazem parte de "minorias" são pessoas impuras, destinadas a morrer pelos seus métodos desumanos.

Neste dia, a máfia resolveu ser a heroína e começou a abrigar os perseguidos.

A Fulehart sempre foi um grupo paramilitar "famoso" nas comunidades. Eles nos protegiam em troca do seu controle quase abusivo. Atualmente, nos tornamos a resistência contra o estado.

Meu irmão conseguiu salvar a mim e a Yuli naquele dia. Ele estava voltando do quartel da Fulehart, já que faz parte dela há um tempo. Porém, apesar de estar vivo, não consegui fugir daquele disparo.

A máfia me socorreu. Fui forçado a trabalhar para a facção, onde, desde então, treino para ser agente de reconhecimento. Trataram da ferida por semanas, no entanto, ainda não me sinto curado.

Mesmo que o tiro tenha sido há tanto tempo, ainda tenho a sensação de minha barriga estar perfurada. Foi um milagre não ter morrido.

Acho que agora você entendeu o porquê de eu preferir arrebentar o meu braço na infância.

Hoje é 15 de março. Ainda são 7:00, acordei cedo devido ao teste avaliativo. Esqueci completamente disso até ontem de madrugada, só relembrei quando vi Yuli se matando de estudar.

Um cheiro azedo relaxante paira pelo local. Estamos no outono e na estação lunar da aurora. Particularmente, a minha época preferida.

Alguns fios prateados atravessam o horizonte que cerca o teto, dando abertura para um grande relógio que sombreia parcialmente todo o salão. O som do ponteiro se movendo vagarosamente já se tornou comum.

A arquitetura daqui é antiga, porém tem um design de interiores refinado. Transparece a mistura de diversas tecnologias ao nosso alcance. A estrela de Fules está presente em todos os cantos, sendo a marca da facção, simbolizando o equilíbrio entre o caos e a ordem.

Estou no refeitório do quartel da Fulehart, mais conhecido como "Mixelis", sendo o local onde moro desde o golpe. Coloco no prato um pão com manteiga, junto a um copo de café com leite quente.

Vou até a mesa que sempre fico, no canto inferior direito, onde há outras três pessoas sentadas: Yuli, Toli e Noah. Algumas das poucas razões para eu continuar vivendo.

Utilizamos o uniforme padrão da Fulehart. Preto e prateado são cores predominantes. É formado por um kit de compressão projetado para nossos objetivos, formado por camisas, manguitos ou meias. Por razões de força maior, utilizo quase tudo.

Me recuso a parecer uma salsicha embalada a vácuo.

Ajeito minha jaqueta de manga curta quando sento na cadeira. Desgrudo um cacho molhado e cheio de creme da testa. Tomo um gole do café, o que queima minha língua. Faço uma careta quando ponho a bandeja na bancada.

Sento ao lado de Toli, no único lugar vago. Está fazendo um bico, enquanto apoiava seu queixo na prótese de braço. Os seus brilhantes olhos cor de avelã estão fixos num pão espatifado no chão. Seu cabelo loiro ondulado escorre sobre sua testa. Ele é como um dilúvio de areia dourada.

A Ascensão das Chamas EscarlatesOnde as histórias ganham vida. Descobre agora