Capítulo 16

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Os olhos perplexos e provavelmente assustados de Maya me iluminam. Depois que Alan explicou todos aqueles conceitos de MAO, tenho certeza de que ficou abstrato demais em como criar técnicas, tipo, nem sei fazer isso direito. Vou até a Maya enquanto guardo as minhas mãos nos bolsos, numa tentativa de não começar um abraço indesejado.

— E aí, entendeu? — Tenho quase certeza de que não.

— Entendi! — Adoro como ela quebra minhas expectativas. — Bom, considerando que, segundo vocês, eu tenho um controle de MAO adequado, eu posso criar uma técnica segundo os meus pensamentos e o que quero, né?

— Exato. — Aprendeu direitinho.

— Como que ativo isso aí?

— Primeiro, você contrai os músculos. Faz uma força em todo o seu corpo como se você quisesse fazer xixi, e depois pense como modelaria a matéria externa ou interna.

Estou falando isso, sendo que nem sei como criar uma técnica. Como ela disse, tudo tem uma primeira vez.

— Força para fazer xixi? Mas minha bexiga está vazia.

— É só uma metáfora. Traduzindo, é contrair os seus músculos, que involuntariamente você "fará xixi com o sangue" — Ok, isso ficou macabro.

— Ignora o que ele diz. — Yuli chega de supetão, já deve estar irritada da minha falta de conhecimento sobre o assunto.

Yuli é conhecida por ser um dos prodígios da Fulehart. Pela sua técnica absurda e de alto controle. Quase ninguém sabe exatamente como ela criou, muito menos em qual ramificação ela se encaixaria. Yuli apenas... a fez. Sem nenhum fundamento teórico da Crystal. Mas mesmo assim, ela faz questão de saber todos os mínimos detalhes para a criação de técnicas. É um hobby muito difícil para uma pessoa comum.

— Maya, eu vou te ensinar algo que aprendi na Fulehart. Será parte muito importante na nossa estratégia de fuga. Preste bem atenção. — Maya assente. — Você vai ignorar completamente essa coisa estranha de fazer xixi do Alex.

— Quem é esse? — Ela pergunta, me deixando um pouco ofendido.

— Ela não sabe seu nome? — Yuli ri de mim.

— Sabe, só prefere usar o apelido.

— Com isso, você percebe o quão irritante é citar seu nome.

— Poxa — resmungo.

— Você agora vai somente se concentrar e flexionar os músculos. Pense que isso tudo é como uma corrente d'água que você pode guiar e alterar a velocidade e potência dela.

— Prefiro trabalhar com a técnica do xixi. — Quando Maya termina a frase, dou a língua para Yuli, que me ignora.

— O conceito é quase o mesmo. No final das contas, seu sangue transportará por todo o seu corpo na maior velocidade que você consegue. Mas, quero que você foque isso nos seus olhos.

— Como você quer que eu faça isso?

— Finge que você está chorando.

— Beleza, sou craque em fazer isso.

Não sei se rio ou se choro por ela.

Logo quando Yuli para de falar, ela fecha os olhos e faz uma careta. Em alguns segundos, seu cabelo rubro começa a ter uma coloração cada vez mais presente. As suas mãos ficam repletas de vasos que podem estourar a qualquer momento. As unhas se afiam, como se uma lâmina estivesse sendo criada.

Depois de um instante, seus cabelos tomam um movimento suave. Ela parece um anjo — ou um vaga-lume. Passivamente, meus olhos fixam em Maya, porém, é mais do que um momento de lerdeza. Meus pés cravam no chão.

Ela fecha o punho, provavelmente para dissipar a dor, mas arranha o seu braço com suas unhas afiadas. Uns breves segundos de agonia me fazem arrepiar e fechar os olhos rapidamente. Seus dedos são manchados de sangue, tão vermelho quanto seus cabelos.

Lembro-me brevemente do que ela falou antes: "Sangue é uma coisa normal do corpo, não deve ser temido". Os seus braços são repletos de cicatrizes, cortes retos, como se uma faca rasgasse a sua pele todos os dias.

Será que alguém está a machucando?

Toda essa aura emitida por ela é mais do que apenas uma energia comum de MAO, é algo a mais, e Yuli sabe disso. Além de ser uma garota extremamente inteligente, é uma estrategista sem igual, e já deve ter pensado nessa técnica há dias atrás.

Uns 5 segundos após eu começar a ficar preocupado com Maya, ela cambaleia, quase caindo no chão, e começa a dissipar todo o ar pesado. A pressão que eu sentia também diminuiu.

— Você está bem? — Vou até ela e a seguro, para não cair de vez no chão. Ela me responde fazendo um "legal" com as mãos.

— Perfeito — Yuli fala com seus braços cruzados. — Exatamente como eu planejava. Estou muito orgulhosa de você, Maya.

Ambas abrem um sorriso. Eu sinceramente não estou entendendo nada.

— Estou tão perdido quanto uma criança no tiroteio. — Cutuco o braço de Yuli — Me explica, por favor.

— É uma técnica básica que formulei quando estava conversando com a Lanna. Enquanto estudávamos Wahutologia, vimos que tem algo no MAO que cria um efeito ilusório para destreinados.

Wahutologia é o que chamamos de estudo das ilusões. Lanna é especialista nisso, e usa como base para todas as suas técnicas e pesquisas. Ela é a líder do clube de Wahutologia da Fulehart, e por enquanto, ela e Yuli são as únicas integrantes.

— Explicando para leigos como vocês, é uma espécie de paralisação. Não vou explicar em detalhes para não explodir seu cérebro fraco, mas você utiliza basicamente o Taiwo nos seus olhos, deixando a pessoa que você olha com forte fadiga. É uma técnica básica, ou seja, não exigirá muito de você.

— QUE MASSA! — solto um grito empolgado. — Pelo menos vou ter alguma coisa semelhante a uma técnica.

— Mas não era só pensar que você manipulava as coisas? — Ela gesticula os braços de maneira engraçada — Acho que se você pensar em uma forma legal, você tem uma técnica boa. — Ela parece errada, mas está certa.

***

Depois de um intervalo onde conversei bastante com Maya, eu vou até Yuli perguntar o que está acontecendo com os outros dois. Ela está muito cansada, porque sempre se esforça para auxiliar os outros — ela faz isso muito mais para se sentir melhor do que para realmente ajudar os outros.

— Bom — O discurso vai começar. — O Bacee pelo que nós já sabemos, é uma pessoa estressada, e com certeza já sabe um pouco do que é MAO. É fraco inicialmente, mas tenho certeza de que tem potencial. Ele quer usar algo que tem conexão com ondas, não entendi muito bem.

— Pena que o chifre dele é maior do que sua inteligência.

— Pois é — Graças a Deus, nós dois temos a mesma linha de raciocínio quando é para xingar os outros — Fora ele, tem a Emanuela, a qual é muito misteriosa. Com certeza, ela quer se pagar de "diferente das outras garotas", só para querer chamar atenção. Menina perturbada. A praga não quis treinar conosco, ela é uma rebelde chata.

— Nunca fui com a cara dela.

— Pois é. A fofoca está boa, mas temos que ir para o resto do treino. Você também devia refazer o treinamento, até hoje não criou uma técnica que se preze.

— Verdade, vou pensar em...

Antes de eu terminar de falar, grande parte das pessoas corre até o canto mais próximo da parede e deita-se rapidamente. Olho para a porta e Noah está levantando uma estaca de gelo como um sinalizador. É o nosso sinal.

Os guardas voltaram.

A Ascensão das Chamas EscarlatesWhere stories live. Discover now