Capítulo 11

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Meus olhos continuam úmidos mesmo após o guarda se retirar. Enxugo as lágrimas com o moletom sujo de esgoto. Vamos à grande tábua de trabalho, em busca de informação.

A tensão aparenta ser tátil. Rostos estão pálidos. Alguns se apoiam em mesas enferrujadas para recuperar o ar que seguravam com o susto. No entanto, ninguém parece surpreso. Não sei se é impressão minha, mas a reação delas parece ser cotidiana, e o susto deve ter sido provocado pela "entrada triunfal" do sujeito.

Só de pensar que posso ser o próximo, sinto um arrepio.

Estávamos prestes a nos separar, visando não suspeitar que viemos juntos. No entanto, um rapaz de cerca de vinte anos nos chama.

— Vocês precisam ser marcados. — Seus olhos negros de ônix nos encaram, denunciando sua descendência de Mileth. — Dirijam-se à última sala do corredor antes que percebam que estão aqui sem etiqueta.

Seus braços exibem machucados recentes, resultado de pancadas ou chicotadas. Dreads curtos estão presos por um lenço roxo. Sua voz firme e segura comprova algo: ele é um sobrevivente dos pés à cabeça.

— Muito obrigado pelo aviso. — Alan responde rapidamente.

Meus dentes travam quando ouço a palavra "marcados". O jovem mantém uma expressão fria, quase imóvel. A vivência no limite da vida certamente mudou seu comportamento.

O local, de repente, volta aos seus barulhos cotidianos, com metais colidindo e chamas se alastrando. É assustador pensar em executar esse trabalho todos os dias, com o risco de ser puxado a qualquer momento para o inferno.

Seguimos diretamente para o grande corredor que termina em uma entrada dupla. Portas rangendo preenchem as paredes do caminho, revelando uma escuridão indescritível por suas frestas. Algumas placas indicam onde ficam as câmaras de tortura, experimentos e dissecação.

Ao chegarmos ao fim do trajeto, um cheiro ferroso e sujo escapa abaixo das portas duplas. Ao abri-la, percebemos um lugar deteriorado. Frascos de substâncias químicas rolam pelo chão. Lâminas penduradas em barras de suporte magnético despencam no chão empoeirado.

Um homem alto usa uma máscara de proteção a gás. Aparenta ser uma antiga enfermaria. Será que o menino nos indicou o caminho errado?

A figura vem em minha direção. Seus passos são silenciosos, quase inexistentes. Aperta meu punho com uma luva de látex suja. Não reajo.

— Vire-se. — Uma voz abafada sai da figura.

— Para quê? — Perguntar isso pode ter sido ousado demais? Sim, mas eu não estou nem ligando. Enquanto isso, já viro de costas.

Ele dobra meus braços com agilidade, imobilizando-me sobre o balcão. Finjo para mim mesmo que não sei o porquê deles agirem com tanta agressividade. Meu moletom é levantado, quase rasgando o tecido velho, deixando minhas costas à mostra.

Bruscamente, sinto um corte fulminante na minha costela. Meus olhos arregalam ao sentir o ardor da carne viva sendo dilacerada. A sensação é de que estão abrindo uma fenda em minha pele com uma faca de serra. Sem conseguir controlar, acabo soltando alguns gritos de angústia. Cada segundo parece eterno.

Aperto a quina da mesa, numa tentativa de descontar e aliviar a dor, mas a agonia é tanta que não consigo nem abrir os olhos para ver ao redor. É como se a minha carne estivesse sendo lentamente perfurada por algo pontiagudo – o que era o caso.

Começo a prestar um pouco mais de atenção nos movimentos do corte; parece que ele está escrevendo algo. As dores imediatas finalmente se dissipam, ele larga o meu moletom e me empurra para o outro lado da bancada. Minhas costas estão doloridas como se estivessem passando por horas e horas de tortura.

Finalmente, consigo abrir os olhos e vejo a expressão dos meus amigos. Noah está segurando nas mãos de Toli, que está aparentemente furioso com a situação. Yuli tapa sua boca, seus olhos estão arregalados, iguais aos de Alan.

Tento esboçar uma reação, mas apenas saem murmúrios. Parece que minha garganta se arranha a cada sílaba que eu solto. Meus olhos se enchem de água, o medo de encontrar algo escrito nas minhas costas me consome.

— É o seu etiquetamento, — fala a figura na minha frente, sua frieza é abominável. — Reconheça o seu número de gado naquele espelho.

Quando me viro para a parede envidraçada, o choque toma conta da minha mente. Na minha costela, pequenos cortes formam um desenho, pintado pelo sangue fervente na minha pele. Com a faca, ele rasgou grande parte da minha pele, quase dando para ver os meus ossos, e escreveu o número "456".

456.

Fui etiquetado como um animal.

Olho para mim mesmo no espelho. Meus olhos estão avermelhados, e meu rosto está encharcado com as lágrimas. Fui humilhado, tratado como lixo. Etiquetamento? Não sei o que eu pensava que era antes. Aqui sou apenas um número entre vários outros, que passam e desaparecem.

— Saia daqui! — Ele aponta para a porta, eu vou andando e olhando para trás. — O próximo será você, preto sujo.

Ele aponta para o Alan, que nem resiste. Ele me olha com um sorriso de canto de rosto. Meus olhos lacrimejam, mas o medo me faz disparar para fora da sala. Arrasto-me contra a parede, agachando no chão pútrido. Sangue ainda escorre por minha pele.

O cheiro que nunca consegui esquecer vai até o meu nariz de maneira aguçada. Meus olhos tremem enquanto tento olhar para minha nova cicatriz. Fico soluçando desesperadamente, tentando relembrar como era o meu corpo antes disso.

É possível ouvir gritos de agonia vindos de dentro da sala. Não são do Alan, provavelmente são do Noah. Minha visão começa a embaçar. O cheiro desconfortável fica cada vez mais perto. Quando percebo, o líquido sai do meu nariz e percorre até meus lábios. O gosto de ferro molhado persiste em minha língua.

Está acontecendo tudo de novo, e eu não tenho Host por perto. Meu sangue começa a correr cada vez mais rápido e fica cada vez mais tórrido. Quanto mais tempo passa, mais meus olhos ficam carregados.

Dói. Não é somente uma dor de ter toda sua pele ferozmente destruída. Eu me sinto como um corredor que quebra o pé na largada; me afogando num canto raso da praia; um rasgo enorme em um trabalho de escola antes mesmo de ser feito. É humilhante.

Começo a ouvir passos, delicados e leves, chegando perto de mim. Uma sombra se aproxima e, em alguns segundos, revela-se uma pessoa que não é possível saber se é ruiva ou se seu cabelo possui essa coloração devido à minha visão embaçada.

Ela se aproxima de mim enquanto tento abrir minha boca para falar algo, mas antes disso, ela a tapa com um dedo.

A Ascensão das Chamas EscarlatesWhere stories live. Discover now