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Noah Urrea
Los Angeles, 26 de março de 2020

Preto...

Era tudo preto. A roupa que vestia, o céu, as sensações que me rodeavam, os meus sentimentos e a minha alma. Tudo havia perdido o brilho e a cor, de um dia para o outro.

A minha vida parecia ao ponto de ruir, o sentimento de desespero e sensação de desistência que me comprimia o lado esquerdo do peito era devastador. Queria entregar-me ao silêncio, à exaustão, permitir que o meu corpo fosse levado para longe. Queria que a minha mente deixasse de pensar, que parasse de me relembrar das melhores memórias da minha vida. Queria partir sem nunca mais voltar ou olhar para trás.

Mas não podia.

Deitada na minha cama com apenas mais de um mês de vida, Chelsea dormia serena, numa noite fria. Eu também devia estar a dormir, no conforto da minha cama, entregue ao amor que me explodia no peito sempre que encarava a minha filha. Mas não era isso que acontecia...

Em vez disso, dava voltas e voltas no quarto, enquanto chorava e soluçava o mais silenciosamente possível. Não queria acordar a bebé, mas era nos seus braços que iria encontrar o melhor conforto para a minha dor. Não queria que os meus pais e os meus amigos viessem até mim – eu tinha perfeita noção de todos eles no piso de baixo também choravam, enquanto lamentavam toda a situação que EU teria que enfrentar – queria viver este momento sozinho, e foi por isso que justifiquei a minha vinda para o quarto, com a desculpa de precisar de deitar a Chelsea para que pelo menos ela pudesse descansar.

O dia parecia não terminar, e mesmo sentindo o cansaço acumular-se, nada me fazia adormecer. 25 de março de 2020 seria para sempre o pior dia da minha vida. Seria também o início de uma nova fase, na qual teria de enfrentar o mundo e assumir as minhas responsabilidades para com o pequeno ser que serenamente dormia.

25 de março, o dia em que a Maddy foi verdadeiramente embora das nossas vidas...

(...)

Los Angeles, 25 de março de 2022

Dois anos sem ela...

Era estranho recordar esse dia. Se por um lado era o pior dia da qual tinha memória, também era o dia que tinha beijado, amado e aproveitado ao lado da mulher com a qual pensei construir a minha vida.

Era um dia que por mais que eu quisesse manter igual a todos os outros, eu sabia que não seria possível. Talvez fosse por isso que não tinha dormido na mesma cama que Sina esta noite, porque me recordava que tinha recomeçado a minha vida, deixando para trás toda a minha história com Maddy.

E talvez fosse por isso também, que não falei com Sina. Nem antes de madrugar e sair de casa para apreciar o mais bonito por do sol, que só era possível ver na praia de Orange. Nem durante todo o horário de expediente, em que por mais que tenham sido as suas tentativas, eu arranjei sempre forma de me escapar. Nem quando Sina veio ter comigo, e me avisou que esta noite iria dormir no seu apartamento. A minha reação foi sempre a mesma, o silêncio. Este que me transportava e que no fundo me levava a culpar a recuperação que tinha permitido fazer na minha vida.

Novamente tinha vontade de desaparecer, submergir e não voltar, mas a pequena figura loira a descer as escadas pela mão de Adeline, fez-me lembrar da promessa que havia feito àquele pequeno ser.

- Sinha – a pequena disse com lágrimas nos olhos assim que encontrou conforto nos meus braços.

- A Sina está no quarto, amor – disse-lhe.

- Embola – respondeu de forma abafada enquanto as suas lágrimas molhavam a minha camisola.

Eu também tinha vontade de chorar, no entanto ia reprimir essas lágrimas até ao momento em que sozinho as pudesse libertar.

The Secretary - NOARTWhere stories live. Discover now