Visita de Lembranças

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Se levantando mais uma vez para iniciar outro dia de trabalho, Rafaela se forçou a levantar da cama. Separou o uniforme, tomou seu café da manhã e só então se arrumou e se dirigiu ao Golden Rays. O trabalho no computador, verificando alguns dados de clientes, tomou bastante do seu tempo da manhã, mas quando ela parou para apenas recepcionar quem chegasse, e o movimento no hotel ficou mais tranquilo, ela começou a observar seus arredores.

O hall praticamente vazio, apenas com uma meia dúzia de pessoas que ainda usavam o espaço do restaurante. Involuntariamente o olhar dela se voltou ao mesmo lugar onde Bradley costumava sentar. Sua mente praticamente projetou uma miragem da figura dele, o jeito com que se sentava, o olhar perdido atravessando pela janela. Ela nunca soube porque ele parecia tão perdido. Aqui, ela se censurou, achando que estava curiosa demais por causa de um homem que mal conhecia. Pior ainda, pensou no número que ele tinha dado, se quisesse falar com ele, bastava simplesmente ligar. Não era coisa que Rafaela fazia, aliás, ela não tinha pra quem ligar além do irmão que morava no Brasil. Sozinha, atrás do balcão, ela suspirou fundo. Admitiu, com relutância, que sentia falta de Bradley puxando assunto com ela.

No momento, só restava continuar com seu trabalho, até que o expediente terminasse.

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Antes que voltasse à base e seu treinamento diário com a equipe começasse, Rooster conseguiu organizar o apartamento, mesmo sozinho e de forma mais lenta. Era quase como se ouvisse Phoenix o chamar de molenga, o que o fez rir sozinho no meio do apartamento. Abrir a caixa com o álbum de fotos repleto de momentos entre ele e seus pais encheu sua mente de lembranças. Era difícil ter memórias claras de Nick, ele era muito novo quando o pai faleceu, então, o que se completava em sua mente eram os relatos que ouviu da mãe e de tio Pete. De como ele era engraçado e descontraído, carinhoso e atencioso, e que estaria orgulhoso do homem que ele tinha se tornado.

Foi depois de se formar na academia que Bradley tinha decidido usar o bigode. Era a característica física mais marcante de seu pai em todas as fotos dele e era um jeito do filho honrar o pai e mantê-lo sempre por perto, tão evidente quanto as semelhanças físicas que eles já tinham.

Bradley pôs sua foto favorita no porta retrato, ao lado da TV, sua mãe o segurava no colo, sorrindo pra câmera, e seu pai tinha uma das mãos na cintura dela, trazendo sua pequena família para mais perto dele. Olhar para a foto trazia uma espécie de sentimento agridoce, tinha sido um momento feliz entre a família, mas agora só restava Bradley entre os três, sem a oportunidade de ter mais momentos felizes com os dois. Tinha que ser grato pelo tempo que tiveram juntos.

Sem muito o que fazer agora que estava tudo arrumado, Bradley deitou no sofá e tentou tirar um cochilo. Respirou fundo, e fechou os olhos. Prestou atenção ao seu redor e não ouviu um único som, apenas o da sua respiração. Era como um vazio infinito no meio do pequeno apartamento. Era intrigante, até uns dias atrás estava cheio das risadas e das vozes dos seus amigos, agora apenas pela presença dele. Sozinho, o que o fez se lembrar de outra pessoa que poderia se sentir sozinha no momento, Rafaela.

Talvez agora ficar pensando na recepcionista com quem tinha conversado poucas vezes estava se tornando uma mania estranha. O certo aqui era apenas deixar com que ela seguisse em frente, que os dois seguissem em frente. Mas se tinha uma coisa que Rooster tinha aprendido como piloto era seguir seus instintos. Isso poderia ser muito útil quando se estava no céu, mas também tinha certo valor quando se tratava de pessoas, e seu instinto dizia que Rafaela era uma pessoa que não tinha ninguém por perto, ninguém com quem contar ou ninguém com quem conversar. Claro, ele poderia estar redondamente enganado e ela acabar sendo só uma pessoa muito séria e profissional.

Seus compromissos com a Marinha o forçaram a deixar essas reflexões para lá, indo direto para os primeiros treinamentos dessa nova fase da Dagger Squad. Tinha sido um bom treino, com pontos a desenvolver a cada dia, porém um começo promissor. No entanto, conhecendo bem o melhor amigo, dava para Phoenix notar pelo olhar de Rooster que alguma coisa não estava tão certa assim, ela esperava que isso não tivesse a ver com o fato de ele ser o líder do grupo e a pressão de tal posição. 

-Nós vamos todos pro Hard Deck, você encontra a gente mais tarde lá? - Natasha convidou, mas seu amigo notou que o convite era mais uma ordem do que um pedido.

-Eu estava pensando em descansar um pouco, mas não vou ter opção, não é? - ele chegou a dar uma risada sem graça.

-Eu não quero te forçar a nada, mas dá pra ver que você precisa conversar - ela esclareceu - sabe que sempre pode contar comigo, não pode?

-Eu sei - ele assentiu - e você tem razão, aconteceu uma coisa... na verdade, aconteceram várias coisas e eu estou pensando sobre elas... tentando entender tudo.

-Vou adorar saber das novidades - ela deu um sorriso compreensivo - te vejo lá!

-Até lá! - Rooster acenou pra ela.

Então, um pouco depois, como prometido, ele estava no Hard Deck outra vez, o bar de Penny se tornando um velho refúgio de pilotos, e um lugar especial para o Dagger Squad, não deixava de ser o lugar onde todos se conheceram pela primeira vez.

Rooster encontrou Phoenix sentada em uma das mesas, longe da mesa de sinuca dessa vez, ele sabia que não fugiria da conversa.

-Então - ela uniu as mãos seriamente por cima da mesa - o que é que tá pegando?

-Nem um oi, ou como é que você tá? - ele reclamou um pouco.

-Faz uma hora e meia que a gente se viu pela última vez, e eu já sei que você não está muito bem - ela deixou um pouco o sarcasmo para falar mais sério agora.

-Tudo bem, fui pego por você - Rooster se rendeu aos comentários da amiga.

Ele deu um sorriso rápido, mas se preparou para abrir o coração.

Sutil InsistênciaWhere stories live. Discover now