Capítulo 5

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"Quando você olha demais dentro de um abismo, o abismo olha dentro de você."
Friedrich Nietzsche

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Não sei se dormi ou sonhei acordada, e não me lembro de fechar ou abrir os olhos, para ser sincera. Está escuro de qualquer forma e não me sinto exatamente descansada. É a sensação de acordar de noite depois de uma soneca da tarde. Meu corpo pesa como se fosse velho e doente, frágil demais para abrigar um coração acelerado o suficiente para fazer o mundo parecer... devagar.

Talvez devesse tomar um calmante para dormir melhor.

Que horas são? Sakura... será que ela já chegou no restaurante?

"O dia está acabando"

Sento-me na cama meio bamba, o corpo pesa de diferentes lados, coisas se movem por baixo da pele. É uma estranha consciência de tudo que acontece dentro de mim, cada órgão, osso e vaso, cada célula. Um turbilhão de informações e sensações diversas. Estranho. Seguro minha cabeça, ela tomba como se pesasse quilos a mais do que deveria e dói. Dói como se o inferno buscasse formas de abrir espaço em meu crânio, como garras que afundam nos sulcos de meu cérebro. Dói, dói dói dói dói.

Com um grito pavorosamente alto, finco as unhas em meu couro cabeludo, como se uma nova dor menos lancinante fosse capaz de sobrepujar a outra. As cobertas me engolem quando caio de volta em seu abraço. Chuto-as para longe, buscando ar por cada poro de meu corpo, chutando a parede e tudo que minhas pernas e pés encontram no caminho. Eu vou morrer, só pode ser isso. É AVC isso? Dói assim? Levei um tiro? Eu vou morrer, meu deus, que eu morra mesmo, só quero que isso acabe. Abro a boca novamente e forço minha voz com toda energia que me resta até esvaziar o ar de meus pulmões.

E então, antes que meus dentes rachem pela força que os cerro, com a força com que eles batem desesperados, tudo acaba tão rápido quanto começou e o silêncio ensurdecedor de uma noite estranhamente tranquila se torna meu único pavor. Foi rápido demais. O que está acontecendo? Tenho a testa colada na parede fria, pés descobertos, mas que suam apesar do ar gélido do quarto.

E não posso me mover.

Pois sinto uma respiração longa fazer cócegas em minha nuca. Ar frio, uma presença morta.

–Arisu? – Sequer consigo ouvir minha voz ao exalar seu nome. As lágrimas escorrem pelo meu rosto antes que me dê conta dos soluços incessantes que me fazem gaguejar ainda mais. Arisu não responde. Não é ela, não é ela, não é ela.

E eu sei que não é.

–Arisu. – Chamo de novo, na esperança de minha voz atravessar o pesadelo tenebroso que me engoliu. Espero que ela balance meu corpo até me trazer de volta. Qualquer coisa serve, qualquer coisa.

A respiração é alta, fria. O medo mantém meus olhos colados na parede, mas uma parte burra de mim tem vontade de ver a criatura. Ignora, ignora, ignora.

𝙍𝙀𝙌𝙐𝙄𝙀𝙈, 𝔒𝔨𝔨𝔬𝔱𝔰𝔲 𝔜𝔲𝔲𝔱𝔞Where stories live. Discover now