13 - Eu quase fui preso mesmo inocente, outra vez

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Agora, se você nunca teve sua casa destruída por seres mitológicos, um aviso: a culpa será sua.

Bem, é um fato comprovado, não é? Adultos não acreditam em mais da metade do que dizem as crianças. Some isso ao fato da casa ter sido semi-destruída um dia depois de você chegar na casa e tcharam! Temos o culpado.

Não ajudou o fato de termos simplesmente aparecido atrás do policial que tomava nota das coisas que tinham sumido no processo. Pelo jeito, tinham se aproveitado da situação e roubado a casa. Obrigado, vida.

Assim que nos viu, os olhos do Sr. Sgarbi se estreitaram.

— Pode explicar o que aconteceu aqui, Miguel?

O policial virou os olhos verdes, frios e inquisidores para mim. Ele me mediu de cima para a baixo, como se estivesse avaliando meu potencial para explodir coisas. Engoli em seco. Sabia o que acontecia quando policiais parrudos erguiam o queixo daquele jeito ao me ver.

— Esse menino já importunou o senhor antes, Sr. Sgarbi?

Enquanto falava, ele deu dois passos em minha direção. Usei toda minha força de vontade (que não era muita, depois daquele dia) para não recuar. Esqueçam os monstros. Lidar com pessoas como ele era o verdadeiro perigo.

Olhei para o Sr. Sgarbi. Esperei ele falar "esse é o meu filho", ou, "adotamos o moleque ontem, tá tudo bem". Ele só cruzou os braços e ficou olhando. Me senti tão parte da família…

Engoli em seco. O policial ergueu a mão para pegar no meu ombro, quando uma mão empurrou a dele para longe.

— Acho melhor você não encostar no meu irmão — falou Sofia, os olhos vermelhos brilhando. — Ou vai perder a sua mão.

O policial arregalou os olhos. A mão dele foi até o cacetete.

— Pirralha, como você ousa…

O Sr. Sgarbi descruzou os olhos. A cor sumindo do seu rosto. Acho que ver a filha não negra se meter em encrencas com um policial não fazia parte do plano. Mas o cara ficou lá, sem reação. E o troféu de pai do ano vai para…

Tudo dentro de mim mandava eu ficar de boca aberta. Algo que aprendemos nas ruas: se algo distrair os tiras, corre. Aproveita para sumir e ficar na moita por uns dias. Ou semanas. Sofia tinha toda a atenção dos duzentos quilos que aquele cara devia pesar. Era minha chance de fugir para a floresta. Talvez encontrasse Thainara.

Mas ela era minha irmã. A primeira dentre tantos irmãos adotivos que tive que me aceitou. Ou o mais próximo disso que nosso relacionamento tinha se tornado. Afinal, não se passa por uma situação em que se é quase morto por seres mitológicos sem que se crie uma conexão.

Dei uns passos para trás e para o lado.

— Ih Sofia, esse gorducho não me pegaria nem se perdesse metade desse peso todo.

O policial bufou. Ele mexeu tanto a boca que parecia que seu bigode fazia uma hola. Agora era só Sofia ficar de boa que daria tudo certo.

Infelizmente, ficar de boa não era uma das qualidades da linha irmã.

Ela ajeitou os óculos e veio para o meu lado.

— Tem razão, Miguel. Ele ainda estaria acima do peso. Seria necessário muita dieta e exercícios.

Tá, você tem que dar um ponto para ela. Foi uma ótima tirada. Principalmente porque ela só disse a verdade, sem querer zoar o cara.

Mesmo não tendo a intenção de zoar o cara, o policial se sentiu zoado. Ele sacou o cacetete (é assim que se fala, ou é desembainhou o cacetete?). As coisas teriam ficado ruins. Senti algo dentro de mim reagindo ao meu medo e a raiva por estar sofrendo racismo dentro da mansão dos meus pais, com meu "pai" assistindo.

Miguel Oliveira e a Árvore de EldoradoWhere stories live. Discover now